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Hereditário – As Revoluções Diárias!

Há muitas armadilhas em Hereditário

Hereditário (Hereditary) é um filme traiçoeiro. O seu ponto de partida não apresenta nada de novo, a narrativa é construída de maneira esquemática em direção a um clímax barulhento, no qual todos os conflitos são resolvidos, e a tensão é constantemente aumentada nos instantes em que sempre existe a promessa de um susto. Em suma, o primeiro longa do diretor Ari Aster é parecido com a maioria dos filmes de terror lançados anualmente. No entanto, há a impressão de que se trata de uma obra diferente, muito mais preocupada em dar ao espectador algo para pensar do que em fazê-lo saltar da cadeira.

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Existem alguns motivos para que isso aconteça. O primeiro deles está relacionado ao desenrolar da história. Ainda na metade inicial, há um acontecimento que muda a lógica narrativa e nos obriga a enxergar os acontecimentos de uma outra maneira. O segundo é a ausência de jumpscares. Embora o diretor insista em criar momentos nos quais o surgimento de algo aterrorizante na tela e o aumento da trilha sonora pareçam inevitáveis, ele nunca os leva a cabo, ficando sempre no campo da sugestão. O terceiro é um trabalho de composição imagética mais apurado do que nos exemplares recentes do gênero (apesar de esse cuidado resultar, por vezes, em momentos de preciosismo técnico).

Entretanto, ao longo do já mencionado clímax, Hereditário confirma ser o que era levemente perceptível desde o início: um filme ordinário. Nos dois primeiros atos, as atuações deliberadamente artificiais do elenco (os principais destaques negativos são as performances de Alex Wolff e Toni Collette, de XXX: Reativado e Tudo Que Quero) e o excesso de efeitos sonoros são, de certa maneira, compensados pelos aspectos apontados anteriormente. Até os instantes finais, o longa se equilibra entre acertos e erros e se sustenta no compromisso de que também fará escolhas diferentes quando chegar a hora de atar as pontas e preencher as lacunas.

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Mas ao notar que o terceiro ato é construído através de uma sucessão de eventos similares aos de muitos filmes atuais do gênero, a obra desaba completamente. A ambiguidade entre o que é sobrenatural e o que pode ser mera imaginação desemboca na maior das obviedades, a densidade psicológica – que se delineava como uma das maiores preocupações do roteiro de Aster – é substituída pelas convenções do gênero e qualquer reflexão sobre o luto ou conflitos familiares é abandonada por inteiro. Até a questão da hereditariedade, representada pela loucura, deixa de ter significado diante das opções derradeiras.

Mais do mesmo

No fim, Hereditário acaba sendo mais um dos muitos filmes de horror que negam as melhores características do gênero e que, numa ironia cruel, tentam ser diferentes ao mesmo tempo que recorrem aos piores clichés. Falta dramaturgia, originalidade e criatividade visual. Portanto, será, assim como Ao Cair da NoiteCorra!, Um Lugar Silencioso e outros, o novo longa que os facilmente impressionáveis chamarão de revolucionário e clássico moderno, o filme que mudará o gênero cujas particularidades poucos parecem compreender. Infelizmente, vivemos na época das revoluções diárias.

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