O ano de 2008 deve ter ficado na memória de muita gente, mas não pelo Cavaleiro das Trevas, de Christopher Nolan, com o inesquecível Coringa de Heath Ledger. Muito menos por Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal (que eu prefiro esquecer), mas pela pior crise econômica internacional desde 1922.
Nós, pobres mortais, que sabemos quase nada sobre Wall Street e economia, pudemos apenas nos segurar e torcer para que a fase passasse, sem saber as razões para tal desastre financeiro (lembre-se, estou falando de 2008 e não de 2015). Porém, que tal se alguém resolvesse explicar como tudo aconteceu usando Margot Robbie nua, em uma banheira de espuma? Se isso ainda não o convenceu a ver A Grande Aposta (The Big Short), saiba que o filme não é apenas isso e é muito bom.
De tempos em tempos, vemos o cinema americano juntar várias estrelas em um filme mais alternativo. É como se fizessem um crossover entre grandes nomes, alavancando um projeto mais ousado que todos querem participar, simplesmente por ser “cool”. O elenco do filme do diretor Adam Mckay, que também assina o roteiro com Charles Randolph (Amor & outras drogas), é de dar inveja: Christian Bale, Brad Pitt, Steve Carell e Ryan Gosling, além de convidados como Marisa Tomei, Selena Gomes e a já citada Arlequina, do vindouro Esquadrão Suicída. Diga-se de passagem, os astros maiores quase não contracenam entre si, mas suas aparições não são largadas ou apenas para ter o nome nos créditos. Todos fazem parte da trama e foram muito bem explorados em seus personagens.
Em termos narrativos, o filme segue a tendência dinâmica de outros sucessos atuais, como O Lobo de Wall Street, que Martin Scorsese dirigiu em 2013 . Baseado no livro The Big Short: Inside the Doomsday Machine, do consagrado Michael Lewis, autor de outras obras que também viraram filmes (O Homem que mudou o jogo, de 2011, e Um Sonho Possível, de 2009) e atual “queridinho” de Hollywood, a película fala sobre alguns homens visionários (grande parte deles baseados em pessoas reais e alguns com nomes trocados por opção) que percebem o que outros não perceberam: o colapso iminente do mercado imobiliário. Ainda tiveram a ousadia de apostar contra a orgulhosa economia americana.
O diretor também foi muito ousado em sua proposta. Entre o sarcástico e o cômico, quase anárquico, o filme não cria heróis nem vilões, mas mostra como o “sistema” é manipulado. Uma opção muito interessante, uma vez que já sabemos o resultado dessa aposta, tornando mais importantes – para o espectador – as consequências dessas decisões, e não se essas pessoas ganham ou perdem. No entanto, como em todo bom filme, isso serve apenas de pano de fundo para belíssimos personagens, que travam batalhas e sofrem por suas escolhas, rendendo atuações surpreendentes, como a de Steve Carell, em especial. Identificado pelos trabalhos em comédias, Carell confere credibilidade à toda a angústia que o papel precisava, mas ele esteve bem acompanhado, pois os outros grandes nomes também estiveram à altura.
O filme em si é uma aula sobre o turbilhão que constitui o mercado imobiliário e como ele entrou em colapso, usando de participações especiais e didática bastante simples, inclusive, para falar de um assunto tão complexo. Mckay utiliza muito bem um recurso do cinema o qual aprecio muito: a quebra da quarta parede. Trocando em miúdos, os personagens interagem com o público falando diretamente com a câmera. Quem acompanha o seriado House of Cards (série do Netflix, baseada em minissérie da BBC) já conhece bem.
Um pequeno porém é que o filme tem duração aproximada de 130 minutos, gerando tanta tensão intermitente que fica um pouco estressante, fazendo com que haja um certo torpor ao final, mas sem problemas. A gente sempre fica atordoado com uma boa estória.