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Ford Vs. Ferrari: Sem Pressa pra acabar!

James Mangold cria um memorável filme de Oscar em Ford Vs. Ferrari

Numa mistura de Tucker- Um Homem e Seu Sonho (1988) e do excelente Rush- Duelo de Rivais (2013), Ford Vs. Ferrari conta a história da construção do Ford GT40, numa tentativa da montadora Ford de derrotar a Ferrari nas famosas 24 horas de Le Mans, entre os anos de 1964 e 1966. A corrida automobilística de resistência, disputada anualmente na França, foi criada com o objetivo de aprimorar o desenvolvimento técnico da indústria de automóveis, criando carros mais velozes e resistentes.  No começo dos anos 60, a Ferrari era intocável nas pistas, produzindo carros vencedores com um custo humano enorme, ao ponto de  Enzo Ferrari ser conhecido no meio como “O Assassino”, pela quantidade de pilotos de corrida que morriam testando seus carros.

Crítica de Ford Vs. Ferrari

Querendo mudar o posicionamento de sua marca para um público mais jovem, Henry Ford II ofereceu comprar a Ferrari e, após meses de negociações, Enzo Ferrari decide fazer negócio com a Fiat e ainda começa uma inimizade com Henry Ford II. Em retaliação, a Ford decide construir um carro que vença a Ferrari em Le Mans, criando o embrião do famoso GT40. O que ocorre em seguida é uma das histórias mais famosas do mundo automobilístico,cujo projeto de adaptação para as telas de cinema rodou por Hollywood há anos, mas que pela complexidade da história seria muito difícil para contar e ainda ter lucro na produção.

Para criar um carro que poderia vencer as 24 Horas de Le Mans, a Ford contrata Carroll Shelby (Matt Damon, de Pequena Grande Vida), um texano que não só venceu a corrida como piloto anos antes, mas tem capacidade técnica para desenvolver um automóvel e entende de vendas. Ele é amigo de longa data do piloto de corrida e ex-veterano britânico Ken Miles (Christian Bale, de A Promessa), um piloto exemplar, mas uma pessoa extremamente difícil de lidar, que só se dá bem com sua esposa Mollie (Caitriona Balfe) e o filho (Noah Jupe).

Bale entrega um personagem visualmente muito próximo ao Miles da vida real, com um sotaque forte e maneirismos específicos. O talentosíssimo Tracy Letts ( de The Post – A Guerra Secreta) rouba a cena numa atuação memorável e que com certeza atrairá interesse para o Oscar. Jon Bernthal (de Corações de Ferro) interpreta Lee Iacocca, então vice-presidente da Ford, e Josh Lucas dá vida à um executivo da Ford.

Crítica de Ford Vs. Ferrari

Corporativismo Vs. Indivíduo

A corporação americana contra a europeia, os dois homens que podem criar a máquina que irá derrotar a Ferrari, uma relação de pai e filho e de dois amigos com diferentes visões de mundo. A premissa de Ford Vs. Ferrari tem elementos para criar um longa previsível, mas felizmente a obra revitaliza e reinventa vários clichês, entregando um filme comqualidade técnica altíssima.

Todos os relacionamentos do longa são bem construídos. Miles não é um homem que gosta de abrir mão de suas opiniões, enquanto Shelby valoriza tanto o dinheiro quanto a visão de fazer um carro especial. Os executivos da Ford tem seus próprios interesses e Henry é o rei que deve ser convencido e impressionando, fazendo todos correrem atrás de resultados. A construção dos personagens é delicada, aprendendo com filmes que abordam o lado corporativo “empolgante” de O Fundador (2016) ou A Rede Social (2010). Ao usar Carrol Shelby e Ken Miles como cernes da história, o Sr. Mangold evita cair na armadilha de criar um filme enaltecendo a indústria automobilística americana. Ao contrário, o cinicismo da empresa é aparente e funciona como uma potencial vilã da história, mas mesmo com esse ângulo o roteiro evita ser ingênuo ou político.

As cenas de corrida de Ford Vs. Ferrari lembram filmes antigos como Grand Prix (1966) e Le Mans (1971), em parte pela fotografia arrojada de Phedon Papamichael (Nomeado por um Oscar pelo seu trabalho em Nebraska) e pela primorosa edição de Michael McCusker (também nomeado a um Oscar pelo seu trabalho em Johnny e June).

Mas Ford Vs Ferrari é especial mesmo graças a direção de Mangold, que consegue multiplicar o resultado do orçamento de 97,6 milhões de dólares do filme em uma produção impressionante. Com suas mãos hábeis, ele consegue fazer um filme de época, com atores de primeira categoria e cenas com carros reais.  A produção contou com uma equipe completa de mecânicos para manter os carros antigos e cênicos rodando para a gravação, e recriaram a pista de Le Mans dos anos 60 filmando em 6 locações diferentes, o que só pode ter sido um pesadelo operacional e de edição.

A trilha sonora assinada por Marco Beltrami (que já trabalhou com o diretor três vezes) contrasta instrumentos e estilos da época nas cenas do dia-a-dia com uma empolgante trilha moderna nas cenas de corrida que, misturado ao excelente desenho de som do filme, ajudam muito na imersão do espectador.

Crítica de Ford Vs. Ferrari

Uma volta (quase) perfeita

Não há muitos pontos negativos nesta obra. Fazem falta mais cenas com Jon Bernthal, que mais uma vez é desperdiçado como personagem secundário e some na segunda metade do filme. Para desinteressados sobre automobilismo, a duração de duas horas e meia pode parecer longa, mas Mangold toma uma decisão acertada de não focar tanto em datas e lugares para contar a história, evitando um formato de documentário.

É uma pena somente que os acontecimentos sejam abordados conforme aconteceram, sem muita experimentação na narrativa. Optar por algo menos clássica talvez teria ajudado a dar o mesmo dinamismo nas cenas de personagem que estão presentes nas cenas de corrida. Ford Vs. Ferrari é um filme primorosamente realizado, tem um terceiro ato grandioso, espetacular e merecido, ancorado em personagens cujas motivações entendemos e simpatizamos.

Esse é um filme pra ver no IMAX, ou com a maior tela e o melhor som que for possível. As sequências de corrida fazem o coração bater forte e entregam uma experiência deliciosa e memorável para se ter no cinema. 

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