Edição comemorativa celebra uma década de Mondo Urbano
É sempre uma oportunidade bacana conhecer trabalhos antigos de artistas em atividade há tempos, não é? A Mino já havia nos feito um favor como esse quando lançou Escapo, de Paul Pope (Bom de Briga). A mesma editora republicou Mondo Urbano, de Mateus Santolouco, Rafael Albuquerque e Eduardo Medeiros, revisitando esta fase interessantíssima da carreira do trio.
Mondo Urbano 10 anos compila as histórias que os três sulistas produziram de forma independente. São contos interligados no melhor estilo Tarantino, mas com um ambientação muito particular e de fácil identificação para leitores de todas as idades. Com um evento principal servindo de vetor, o show do astro do rock Van Hudson, o grupo faz desfilar uma galeria de personagens bem reconhecíveis da vida real. Clichês, mas bem utilizados.
O misterioso sucesso repentino de Van Hudson, virtuose inimaginável na guitarra, gera histórias sobre a origem sobrenatural do instrumento e um pacto demoníaco em troca do sucesso. Um Robert Johnson de outra época e outro estilo musical, com fãs alucinados, groupies apaixonadas, traficantes e outros tipos orbitando à sua volta.
São segmentos que misturam experiências comuns, como ir a um show de rock com amigos, até casos envolvendo traficantes, mortes, demônios e alucinações, entre várias idas e vindas mais ou menos comuns. É como se o trio de desenhistas/roteiristas tivesse realizado tudo na vibe de uma jam session.
E é justamente esse caráter descompromissado que chama atenção e cativa em Mondo Urbano. Lembrando algo de Xampu, o álbum traz um sabor de nostalgia para leitores veteranos de shows e outras desventuras de antes ou depois desses eventos. A variedade de estilos de traço, assim como a natureza das histórias, quebra expectativas no momento certo e mantém o ritmo até o fim.
O prazer de ouvir aquele álbum daquela banda
A sintonia entre o trio é evidente. Muda o traço, mas também muda o estilo de narrativa visual. Algo que poderia, facilmente, comprometer a unidade do álbum. Juntar essas histórias na mesma edição ressalta o entrosamento entre eles, já que, em momento algum, essas trocas incomodam. Tudo parece, realmente, fazer parte do mesmo universo coeso.
É interessante perceber como o estilo – mais cartunesco – e a narrativa de Eduardo Medeiros se insere no conjunto. De uma certa forma, os personagens que são retratados em mais de um conto, com estilos diferentes, acabam ganhando uma camada a mais. Um recurso que, intencional ou não, ressalta um potencial da linguagem dos Quadrinhos.
A edição da Mino também traz extras interessantíssimos. São entrevistas que revelam os bastidores do processo criativo, estudos de personagens e muito do que os autores pensam e suas carreiras. É um material que valoriza o álbum, sem parecer que foi incluído apenas para dar volume.
Na avaliação final, Mondo Urbano 10 anos é uma HQ que não vai mudar a vida de ninguém e nem foi feita para isso. É um empreendimento cujo prazer da realização que Rafael Albuquerque, Mateus Santolouco e Eduardo Medeiros sentiram é evidente, o que é ótimo para quem lê. É como um show daquela velha banda, onde você não terá novidades, mas termina satisfeito.
No fim das contas, parece difícil não gostar. Porém, dependendo da sua idade e da sua experiência curtindo bandas de rock, tem bem mais chances de curtir.