Em Quadrinhos: História Moderna de uma Arte Global temos uma das melhores abordagens já feitas sobre o tema
Existem alguns fatores que tornam o desenvolvimento dos quadrinhos como forma de arte algo sui generis. Talvez o principal deles seja justamente a luta para ser reconhecidos como tal. É muito difícil estabelecer linhas históricas definidas quando se trata de HQ. Mas algumas existem e elas se tornam mais claras conforme avançamos no tempo. Entenda-se também: conforme a luta por essa legitimação ganha força com nomes de peso da arte. É a partir dessa premissa que surge o magnífico trabalho de pesquisa de Alexander Danner e Dan Mazur em Quadrinhos: História Moderna de uma Arte Global.
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Aliás, se o amigo leitor tem qualquer interesse no estudo da história das Histórias em Quadrinhos, podemos afirmar que este seja um trabalho quintessencial e, mais importante, ainda bastante atual, visto que sua conclusão aborda quadrinhos publicados ainda recentemente. Ou seja, é também um estudo de caso sobre a atualidade da arte. Mas vamos por partes. Afinal, se dissemos que essa obra se diferencia por estabelecer um ponto de partida claro, qual seria?
No primeiro capítulo, os autores se dedicam a fazer um breve apanhado histórico para delimitar quem vai ficar para trás nessa história. E já ali ficam deuses da aurora da arte: Raymond, Toth, Wood, etc. Pois, embora sejam alguns dos maiores artistas que caminharam sobre a Terra, eles pertencem a um período ainda um tanto imaturo das HQ´s (desconsiderando exceções como a EC Comics). Sendo assim, o critério de corte para o início da investigação histórica são os trabalhos de Robert Crumb, que, segundo os autores, iniciou uma explosão das HQ´s num circuito underground, longe dos grilhões das grandes editoras e, principalmente, dos super-heróis.
Mas, ao contrário de alguns editores e comentaristas de quadrinhos, os autores da obra não estão dispostos a fazer qualquer tipo de juízo ideológico ou de valor. Determinar o início da sua obra a partir dos esforços de Crumb tem dois objetivos principais: primeiro, a obra tem que começar de algum lugar. Segundo, existe a evidente intenção de exaltar trabalhos e autores menos conhecidos de circuitos alternativos e underground, pois o mainstream já tem atenção mais que o bastante. Em Quadrinhos, é o momento de exaltar os esquecidos, porém, igualmente importantes para a arte.
Parece muito – e é mesmo!
A partir disso, os autores atacam em quatro dimensões: três geográficas, abordando as três grandes escolas de HQ´s do mundo – para quem começou recentemente nos quadrinhos, os EUA, Japão e Europa; e uma temporal, estabelecendo uma linha do tempo “quase” linear. Dizemos “quase” porque, conforme surgem autores e tópicos de interesse, os autores podem ir e voltar no tempo conforme necessário. Mas, no geral, o livro é extremamente organizado e abrangente. O trabalho gráfico é precioso: imagens bem definidas de obras esquecidas – até mesmo algumas que esse colunista considerava perdidas – pipocam entre as páginas, ilustrando coerentemente as breves análises que os autores oferecem das HQ´s observadas.
De fato, esse é outro mérito do livro: os autores não se limitam a pontuar historicamente obras, publicações e autores, mas também pincelam breves parágrafos analisando estilos e cruzando referências, dando um panorama claro e oferecendo uma ideia ao leitor de como muitas dessas HQ´s são, visto que algumas obras citadas são de difícil acesso – para não dizer quase impossível. De toda forma, há um esforço para exaltar as qualidades experimentais e inovadoras de muitos quadrinhos, estabelecendo um critério bastante claro de análise e pesquisa. Mais do que simplesmente um catálogo ou um “catadão” de referências históricas, Quadrinhos tem uma missão específica e um escopo de investigação bem delimitado.
Como dissemos anteriormente, a abrangência surpreende. Os autores são capazes de concentrar uma quantidade imensa de informação sobre um número enorme de autores e artistas, sem perder clareza de investigação. São poucos os exemplos citados pelos autores que ganham atenção exclusiva. De fato, somente um autor dá nome para um capítulo exclusivamente seu: Osamu Tezuka. Mas, convenhamos… Está tudo bem nisso. De toda forma, muitos autores ganham a devida atenção e são exaltados, assim como as pioneiras e inovadoras publicações que os lançaram, como a Suivre e a Garo. Portanto, se você quer imergir ainda mais nos estudos sobre histórias em quadrinhos e não sabe por onde começar, Quadrinhos: História Moderna de uma Arte Global talvez seja a melhor sugestão possível. Abrangente, acessível e até fica bem na estante.
Mas deixamos um alerta: cuidado ao fazer isso. Porque, quando você descobrir tudo que tem ali dentro, vai querer para você. E algo me diz que sua conta bancária não vai condizer com seus desejos…