O pioneirismo de Mortal Kombat nos anos 90
1992: O ano que os jogos de luta foram modificados para sempre, com o surgimento de… Street Fighter 2: Champion Edition! Finalmente, jogar com os mestres do SF2! Quem não queria usar o Sagat, depois de ser derrotado tantas vezes por ele no Street Fighter 1?! Quase ninguém, já que pouquíssimas pessoas jogaram SF1 antes do advento da emulação (só vi uma máquina de SF1, em um fliperama no Japão). Mas esse é um ano realmente especial! Pois havia também o lançamento… de Fatal Fury 2, da SNK! Uau! Quem esperava um segundo capítulo na saga de Terry Bogard?! Poucas pessoas. Ou ainda Art of Fighting! Caracas! A SNK descaradamente imitando Street Fighter (ainda mais do que antes), com seus próprios clones do Ryu e Ken (que já eram clones um do outro), Ryo e Robert? Melhor, só se fosse bom!
O que é que isso tudo tem a ver com o título desse artigo? Tá bom, tá bom, chega de enrolar. Segundo conta a lenda, inspirados pelo excelente O Grande Dragão Branco*, filme de 1988, estrelado por Jean-Claude Van Damme, dois caras, Ed Boon e John Tobias, decidiram fazer um jogo baseado no filme. A ideia era utilizar o mesmo sistema gráfico de Pit Fighter, da Atari, em que atores eram digitalizados e suas imagens transformadas em sprites. Porém, devido a incompatibilidade de agenda do ator, o roteiro foi alterado e ganhou o nome de… MORTAL KOMBAT! (inserir mentalmente Techno Syndrome, a música techno que todo mundo acha que é o tema do jogo, mas na verdade, saiu dois anos depois, em 1994).
*Você sabia que existem três sequências de O Grande Dragão Branco? Lançados direto para o mercado de home vídeo, as produções não contam com JCVD no elenco. Ele foi substituído por Daniel Bernhardt. E o que isso tem a ver com MK? Pois saiba que havia uma série, em 1998, chamada Mortal Kombat Conquest, que contava a história do Kung Lao original, vencedor do primeiro Mortal Kombat e ancestral do atual Kung Lao. Quem era o ator que interpretava o protagonista? Paolo Montalbán. Porém, o segundo personagem da série, Siro, era vivido por…Daniel Bernhardt! Há! Te peguei! A série era bizarra e deveria se passar muito séculos atrás, só que tinha Scorpion, Sub-Zero, até o Noob Saibot. Você pode até argumentar que o Sub-Zero da série fosse um ancestral do atual, porém Scorpion é um cara, não um grupo, família ou uma classe de personagem. Enfim, a série durou uma única temporada e terminou num baita cliffhanger, com Shao Khan matando todos os personagens!
Mas, voltando ao jogo, a equipe do MK1 era menor do que a minha família (não estou incluindo tios e primos, porque eles não gostam de mim). Você acha que a Acclaim investiria uma baita grana para contratar o JCVD, num jogo que eles nem tinham certeza se daria certo?! Isso é conversa para Goro dormir. O que Boon e Tobias conseguiram foi chamar uns artistas marciais desconhecidos, como Ho Sung Pak e os irmão Daniel e Carlos Pecina. Cada um fez uns dois ou três personagens, exceto a Sonya, que foi interpretada pela grande dama do cinema de artes marciais americano Cynthia Rothrock. Ah, e o Goro era feito em stop-motion.
O primeiro Mortal Kombat foi inovador em diversos aspectos. Primeiro, os gráficos. As produtoras japonesas não curtem muito digitalizar pessoas, pois era um processo complicado e caro. Então, MK foi pioneiro em usar esse gráfico. Além disso, claro, um botão para defender. Todos defendiam a lá SF, segurando para trás. Com o advento do botão de defesa, MK eliminou o cross-up, aquela voadora que passa por cima do inimigo e o pega pelas costas. Algo mais ? Ah, claro! Ficar massacrando o botão de soco e ficar dando porrada! Não? Para baixo e soco alto para dar um gancho, que manda o cara voando para o outro lado da tela e causa um baita dano? Não? Do que você está falando?!
Fatalitites. Matar o oponente. Imagino que as pessoas da Geração Z (nascidos a partir do meio dos anos 90) não entendam o que isso significou em 1992. Pouquíssimos jogos tinham violência explícita e, cara, arrancar a cabeça de um inimigo com um gráfico digitalizado foi o assunto do ano. Hoje, os fatalities do primeiro MK parecem simples, se você comparar com outros jogos, como God of War e a forma como Kratos mata os deuses. Enfim, os fatalities de MK não fizeram história somente por serem pioneiros Enquanto estavam nos arcades, não tinha problema pois, teoricamente, crianças não podiam jogar fliperamas (lá fora, claro). O problema foi quando os jogos foram lançados para consoles domésticos.
Consoles domésticos e muitos fatalities
Se o ano é 1992/1993, você sabe quais eram esses consoles, certo? Super Nintendo e Mega Drive. Foi quando a Acclaim decidiu lançar um port para ambos. A Nintendo falou “Sem violência! Nosso videogame é um moço de família!”. Já a Sega disse “O Mega Drive também!”. Mas, quando a Nintendo virou de costas, acrescentou “Mas ele gosta de uma violência, viu?” A versão do SNES, tinha um gráfico melhor, mas não saía sangue. Os fatalities foram banalizados. Sem cabeças voando ou explodindo.
A versão para MD também foi censurada. Isso até você colocar um código numa tela estranha, que aparecia logo quando o jogo era ligado. Isso gerou uma GIGANTESCA controvérsia, que levou diversos políticos americanos a afirmare que videogames, não apenas o MK, eram responsáveis pelo aumento da violência . Você já ouviu isso, porque é a desculpa mais banal que existe. Mas foi graças a esses jogos que hoje temos o ESRB (Entertainment Software Rating Board), que são aquelas letras que informam a classificação indicativa.
Hoje, quase 27 anos depois de sua criação, o Mortal Kombat deixou de ser uma franquia revolucionária para tornar-se uma das grandes séries de jogos do mundo. Isso não é uma downgrade, é só que há um limite do quanto você consegue revolucionar sem perder a personalidade ou até mesmo o publico, e, seja dita a verdade, ninguém espera que MK bote fogo no mundo novamente. Apenas queremos botar fogo em nossos inimigos. Isso não é pedir muito, imagino.