Vício Inerente no Formiga Na Cabine!
Por mais estranho que pareça ambientar uma trama típica dos filmes noir na colorida Califórnia da década de 1970, Thomas Pynchon fez exatamente isso em seu livro de 2009, Vício Inerente (Inherent Vice). O responsável por levar essa mistura inusitada às telas foi Paul Thomas Anderson, assinando inclusive o roteiro da adaptação homônima, o que gerou uma expectativa considerável, afinal, se Pynchon é cultuado no mundo das letras, Anderson não fica muito atrás quando o assunto é cinema, com uma carreira artisticamente impecável.
O filme segue Larry “Doc” Sportello, um detetive particular que vive à beira-mar, consumindo drogas entre um caso e outro. Interpretado por Joaquin Phoenix, “Doc” não poderia estar mais distante da tradição da literatura policial de Hammet ou Chandler, tanto pelo seu jeito e visual largado, como também pelo consumo desenfreado de maconha não fazer muito pelas capacidades dedutivas de qualquer pessoa. Seguindo a cartilha noir, já anunciada no início do filme com a narração característica, uma ex-namorada (Katherine Waterston) em apuros reaparece pedindo ajuda, alegando que estão tentando coopta-la em um plano contra seu amante milionário.
A partir desse evento, são intercaladas situações entre o estranho e o bizarro, apresentando personagens idem, mas sempre fiéis ao tipo de universo detetivesco que o filme homenageia de uma forma ou de outra. Falando apenas sobre o que é visto na tela, sem ter lido o livro e assumindo que a sacada é opor a temática ao estilo e época , o alvo da ironia parece ser justamente a geração Flower Power, insinuando um tom desiludido e pessimista de um autor que viu tudo de perto – Thomas Pynchon nasceu em 1937 – e atesta que o sonho deu errado em algum lugar, mas nem o distanciamento histórico traz uma resposta objetiva sobre isso.
Um texto como esse, ainda mais nas mãos de Paul Thomas Anderson, é uma oportunidade de ouro para qualquer ator, e como sempre, todo o elenco se sai bem desfilando neste submundo surtado. Desde o protagonista de Joaquin Phoenix, até as participações menores de Josh Brolin e Reese Whiterspoon entre outros, a galeria de personagens é bastante convincente, graças também aos diálogos que nunca parecem deslocados ou desnecessários, desenvolvendo uma trama rocambolesca – proposital – durante os longos planos que o diretor costuma utilizar, e convidam o espectador a prestar atenção nos detalhes da ótima direção de arte e na fotografia de Robert Elswit (O Abutre), colaborador habitual de Anderson, que capricha nos contrastes, destacando o colorido gritante da época.
Vício Inerente é uma obra estranha, em um sentido positivo. A excelência visual está presente em cada um dos seus 150 minutos e mantém seu ritmo do início ao fim, sem falsas promessas. Não é fácil definir a sensação depois que ele termina, dando aquela vontade de conversar sobre ele para, enfim, elaborar um julgamento mais preciso. É algo descartável o que você procura? Passe longe!
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