Em Sono Mortal, a repetição estraga o terror
A certa altura de Sono Mortal (Dead Awake)*, uma médica experiente responsabiliza uma pessoa em pleno processo de sofrimento e luto pela morte de outra. Esta é uma das cenas que servem para ilustrar umas das características mais marcantes em roteiros ruins: quando personagens tomam atitudes absurdas e contraditórias apenas porque servem aos propósitos da história (e, às vezes, nem a isso).
*(Não confundir com O Sono da Morte, filme de 2016)
O autor da cena improvável é Jeffrey Reddick, criador e corroteirista dos filmes da franquia Premonição (Final Destination), que assina sozinho o roteiro. É claro que não se pode exigir total verossimilhança em uma obra de terror sobrenatural, como é o caso aqui. Porém, é inevitável notar como soluções preguiçosas e mal elaboradas prejudicam um filme cujo argumento era bastante promissor.
Kate (Jocelin Donahue) sofre de um distúrbio conhecido como paralisia do sono, uma condição na qual a pessoa, após despertar, não consegue se mover ou falar por algum tempo. O problema é que, durante suas crises, Kate acredita que uma entidade maligna está tentando matá-la. Ela sofre mais ainda com a descrença da família, que inclui sua irmã gêmea Beth (interpretada pela mesma atriz) e o namorado Evan (Jesse Bradford).
A ideia de se ver sendo atacado por uma criatura sobrenatural enquanto se está paralisado e de olhos abertos, sem qualquer chance de fuga ou defesa, é realmente assustador. O problema em Sono Mortal é que essa premissa animadora em pouco tempo se mostra mal aproveitada. E não só por causa do roteiro.
Repetições e reciclagens
A falta de personalidade é uma das características que mais enfraquecem o filme. Incapaz de criar uma história realmente interessante e que vá além das manifestações sobrenaturais pontuais, a narrativa se limita a enfileirar clichês. Algumas vezes, com conexões muito frouxas. Há as pessoas afetadas pelo fenômeno, há todos os outros que não acreditam nelas, há a busca por uma forma de destruir ou afastar a maldição e há, claro, o sujeito esquisito e sombrio que parece saber como combater o mal.
Neste último caso, temos a reciclagem (no mal sentido) da mesma figura que funcionou de forma tão divertida na franquia Premonição e que foi interpretado pelo ator Tony Todd (mais conhecido por Candyman). É o cara misterioso que aparece com a resposta para o que está acontecendo e sabe como fazer parar de acontecer. Aqui, temos o Dr. Hassam (Jesse Borrego) que cumpre essa função de maneira tão insossa que sua caricatura, que poderia funcionar justamente por ser caricato, soa apenas constrangedora.
Sem qualquer substância que dê estofo para a trama, Sono Mortal se apoia no que teria de mais interessante e assustador, e por isso acaba caindo em uma repetição enfadonha da manifestação sobrenatural, quase como um dispositivo cíclico. Se nas primeiras vezes esse efeito provoca medo, nas demais isso se dilui pela falta de inventividade, pela ausência de novas situações. Mesmo a de melhor potencial inovador, uma cena em uma banheira, é totalmente desperdiçada pela falta de clímax e por uma direção ruim, assinada por Phillip Guzman.
Além disso, assim como todo o filme, o mal em si não tem qualquer personalidade. Não há uma explicação para sua existência, um propósito para sua perseguição às vítimas. A única justificativa que o roteiro apresenta é tão imprecisa que se torna risível.
O sono é um fator ancestral de nossos medos inconscientes. No cinema de horror, poucos aproveitaram tão bem isso como Wes Craven e seu Freddy Krueger, de A Hora do Pesadelo (A Nightmare on Elm Street). Assim, Sono Mortal desperdiça esse bom ponto de partida para um filme de terror e que tinha tantas possibilidades de exploração. No fim, se resume a um roteiro precário nas mãos de uma direção sem consistência. O resultado é uma experiência morna, para não dizer monótona.