Filme de Oz Perkins, Maria e João: O Conto das Bruxas é lento, arrepiante e bem-feito
Seguindo a linha de nomes como Panos Cosmatos (de Mandy), Robert Eggers ( de A Bruxa) e Ari Aster (de Midsommar), Oz Perkins usa simbologia, aura de filme independente e um orçamento de 5 milhões de dólares para adaptar o conto dos irmãos Grimm com um arco feminista ancorado no terror em Maria e João: O Conto das Bruxas (Gretel & Hansel).
Já na sua estréia de direção, com The Blackcoat’s Daughter, Perkins (filho do ator Anthony Perkins) mostrava desinteresse em cortes rápidos e jumpscares. Ele tem um talento para criar “mood”, filmes que tem um “clima”, que transmitem um sentimento, um desconforto. Essa sensação é difícil de construir e depende de muitos fatores, desde uma premissa interessante até worldbuilding (criação de mundo), permitindo que o espectador se projete para dentro do filme, entendendo as regras do universo criado e as consequências que as ações podem ter dentro dele. Quanto mais real parecer o mundo, mais facilmente o público pode ter empatia pelas personagens e sentir as situações.
Quando a sua mãe os expulsa de casa sob ameaça de os esquartejar, Maria (Sophia Lilllis) e João (Samuel Leakey) precisam enfrentar a floresta e o mundo cruel. Maria tem apenas dezesseis anos e está cansada de dividir tudo com seu irmão de oito, mas se encontra forçada a cuidar sozinha dele. Sua visão do mundo já cínica e realista: não se recebe nada a troco de nada. Ela está impedida de crescer e se tornar mulher, o peso da responsabilidade a impedindo de fazer qualquer coisa além de sobreviver.
Uma nova versão do conto
Com fome e assustados, os irmãos protagonistas encontram uma cornucópia de comida em uma estranha casa na floresta, habitada por Holda (Alice Krige), uma senhora que a princípio parece amistosa. Eles comem bem e recebem uma cama quentinha. Mas de onde vem tanta comida e por que parece ela parece nunca estragar? Sophia Lilllis recebe pouco material com o qual pode trabalhar. Sempre assustada e preocupada, ela não tem muito espaço para entregar uma atuação complexa. Maria é promovida a personagem principal de Maria e João: O Conto das Bruxas e o filme conta a sua trajetória de amadurecimento para chegar à vida adulta, abraçando o seu potencial e o seu destino, com todos os benefícios e malefícios que isso pode oferecer. Ela é uma jovem que questiona seu mundo e tem alguns estranhos comportamentos. Confia na sua intuição, mas a segurança que Holda oferece é difícil de resistir.
Alice Krige faz um excelente trabalho como a bruxa Holda, entregando uma personagem concomitantemente ameaçadora e maternal. A medida que Maria se envolve com ela e descobre mais sobre si mesma, o conto de fadas muda de rumo, investigando as origens históricas da figura da bruxa e a sua relação com o ocultismo. Repleto de simbologia, a mágica no longa é uma mistura de paganismo, ocultismo e contos de fada. Não se discute se a mágica é maligna por natureza ou algo que pode ser acessado com as habilidades corretas, dando espaço para diferentes interpretações em relação ao arco da personagem principal.
Filmado com aspecto de 1:55, as imagens centralizadas e simétricas ficam exuberantes com a excelente cinematografia de Galo Olivares, permitindo um banquete visual que acrescenta muito à produção. O baixo orçamento atrapalha bastante, comprometendo pelo menos quatro cenas com computação gráfica, que parecem realizadas há dez anos atrás. Mas, felizmente, efeitos não são o cerne da obra. Outro obstáculo é a censura baixa, deixando algumas cenas um pouco sanitizadas, embora não hesite em abordar temas perturbadores.
A presença de diversas narrações dão a impressão que o filme teve correções na pós-produção para aumentar a duração, e que algumas falas foram acrescentadas para dar clareza, e são entregues com as personagens viradas de costas ou fora da tela. Apesar de ter menos de uma hora e meia de duração, Maria e João: O Conto das Bruxas, parece ser um filme longo. Seu maior defeito é originado de uma falha no roteiro em entregar ações, algo para as personagens fazerem enquanto estão realizando as suas tarefas diárias ou tendo pesadelos.
Apostando no terror, no suspense e na ansiedade de que algo horrível pode acontecer, Maria e João: O Conto das Bruxas é um filme de muita cobertura para pouco recheio, criando uma obra que tem potencial de ser apreciada sem ser objetivamente memorável. A atmosfera de tensão e terror cria uma experiência arrepiante, desde que se tenha a boa vontade de se entregar ao seu ritmo. Com seu desenrolar lento, o longa não é para todo mundo. Mas por ser um filme com três personagens em uma cabana na floresta, ele entrega um terror poderoso e bem realizado. Por ter 90 minutos, não deveria ser tão entediante. Por outro lado, provavelmente será o melhor filme com crianças sob o efeito de cogumelos psicotrópicos do ano.