O quinto volume de Tom Strong não tem seu criador
É evidente que quem já vinha comprando os encadernados de Tom Strong não deixará de comprar o volume em questão por motivos óbvios, além de só faltar um após esse para fechar a série. Independente disso, o que vale é comentar o valor conceitual e artístico de cada um desses recortes do personagem, o que inclusive já observei em um dos anteriores. Pois bem, antes de mais nada, espero que você já tenha lido as resenhas que publicamos do segundo e terceiro volumes*. Se já leu, sacou que estamos falando de algo muito legal (na minha opinião, pelo menos), cuja premissa simples é valorizada demais pelo talento incontestável de Alan Moore.
*(Me sinto na obrigação de justificar a ausência de textos dos outros volumes. Ao longo dos lançamentos, a editora nos mandou apenas esses e o material recebido exige resenha…)
Talvez alguém já tivesse imaginado que, sem o barbudo na escrita, o potencial disso tudo ficar sem graça seria grande. Bem, o quarto encadernado já encerrou a coletânea com duas histórias de Peter Hogan e uma participação especial de Geoff Johns. Dizer que foi ruim seria um exagero, mas cabe raciocinar aqui sobre o andamento. Se em Invasão, o já citado terceiro volume, percebemos um certo cansaço de Moore, que dá um recuperada no arco seguinte Como Surgiu Tom Stone, imagine os cinco números seguintes apenas com roteiristas convidados. É exatamente isso que torna A Terrível Vida Real de Tom Strong tão sem brilho.
Não desmerecendo os outros escritores, mas eles pegaram uma tarefa inglória. Não há o que desenvolver em Tom Strong ou seus coadjuvantes, o que pede uma dose enorme de imaginação para colocá-los em situações minimamente interessantes dentro de narrativas curtas. Alan Moore vinha se saindo bem nisso, claro, pois era sua própria criação e ele não tinha a obrigação de igualar seu trabalho ao de ninguém. Já aqui, a comparação é inevitável.
As histórias
Começando com Mark Schultz e Pasqual Ferry, criando uma situação em que todos os veículos voadores criados pelo homem foram impedidos de voar, sem qualquer indício da causa. A família Strong precisará lidar com os Senhores do Céu para descobrir o motivo e restaurar a ordem. Ideia interessante, mas finalizada sem muita inspiração. Para quem não imagina Tom Strong sem o traço de Chris Sprouse, Pasqual Ferry tem um estilo que se ajusta bem ao personagem.
O também britânico Steve Aylett, escritor de ficção científica satírica, assina a próxima história, ilustrada por Shawn McManus. Com uma pegada que lembra Neil Gaiman, o caso a ser resolvido é o poder inusitado de uma garçonete, que, ao dormir, despacha pessoas para os mundos criados em seus sonhos. De um desses mundos, uma de suas criações chega à nossa realidade e pede a ajuda de Tom Strong para resolver o problema. É interessante por tentar adicionar camadas à personalidade do nosso herói científico, mas o personagem não precisa disso. A arte de McManus combina com esse tipo de história e sua narrativa é bem resolvida.
A estrela Brian K. Vaughan (de Os Leões de Bagdá e The Private Eye) marca presença com um pequeno conto sobre o mordomo robô dos Strong, Pneuman. A mudança de foco e a proposta são atrativas, quando o autômato começa a questionar se realmente cuida bem de seu mestre. O dilema é aquele velho conhecido dos fãs de ficção científica, quando uma inteligência artificial começa a aplicar lógica pura em situações humanas. Apesar disso, a arte de Peter Snejbjerg é o ponto fraco, pois não capricha nas expressões faciais e a diagramação de suas páginas parece básica demais, comprometendo o conjunto.
Fechando a edição com a história em duas partes que dá nome ao nosso encadernado, dois nomes de peso. O roteiro de Ed Brubaker traz uma ideia manjadíssima, mesmo para o ano de 2004, quando a HQ foi originalmente publicada. Mostrar o personagem vivendo em um contexto ordinário, como um operário assalariado, infeliz e sedentário, com vislumbres de outra realidade mais heroica e gloriosa? Dependendo da sua idade ou do quanto já consumiu quadrinhos na vida, é impossível não lembrar de uma história de premissa IGUAL no Quarteto Fantástico de John Byrne, quando o Doutor Destino confinou o grupo em uma simulação. Adivinhe se o responsável pelo problema de Tom também não é um vilão rancoroso…
Por outro lado, o outro grande nome ao lado de Brubaker é o genial Duncan Fegredo (de Kid Eternidade), aqui com um traço mais tradicional e adequado ao teor de aventura, mas trabalhando o contraste entre as duas realidades com estilos diferentes. Como sempre esperamos de um desenhista deste porte, ótimas composições e uma narrativa dinâmica compensam um pouco a mesmice do roteiro. Ainda bem!
O volume A Terrível Vida Real de Tom Strong engloba as edições 26 a 30 da sequência original. Aguardamos o sexto, que será a última coletânea do personagem, encerrando com um crossover entre ele e Promethea, escrito pelo próprio Alan Moore. Isso já nos anima, mas existe outro detalhe que pode interessar aos fãs de ficção científica e fantasia em geral. Os números 31 e 32 tem roteiro de ninguém menos que Michael Moorcock…