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Nick Fury e Comando Selvagem – Bastardos Inglórios da Marvel!

O que Nick Fury tem a ver com Tarantino?

Qual obra de Quentin Tarantino é a sua preferida? De qualquer forma, você deve concordar que Bastardos Inglórios (Inglorious Basterds, 2009) é uma bela realização. A premissa, um grupo de proscritos agindo à margem durante a Segunda Guerra, tem tradição no cinema, remetendo imediatamente a Os Canhões de Navarone (1961) ou Os 12 Condenados (1967). Ainda assim, uma grande inspiração para o filme foi uma HQ da Marvel pouco conhecida do público brasileiro: Sgt. Fury e seu Comando Selvagem (Sgt. Fury and his Howling Commandos), que apresentou aos leitores ninguém menos que Nick Fury.

Nick Fury e Comando Selvagem - Bastardos Inglórios da Marvel

Nick Fury à frente do melhor grupo de ataque que a Segunda Guerra já viu!

Evidente que o cineasta fez uma homenagem mais explícita a outros bastardos. Em 1978, Quel Maledetto Treno Blindato, de Enzo G. Castellari, mostrou um grupo renegado envolvido em uma missão suicida contra os nazistas. Na época, foi batizado como The Inglorious Bastards nos EUA – com a grafia correta, ao contrário do filme de 2009. A reverência à produção é tanta que Bo Svenson, protagonista do longa italiano, tem uma pequena participação, além de citações que só os muito versados em detalhes de produção percebem. Ainda assim, Tarantino afirmou a influência da criação de Stan Lee e Jack Kirby nesta declaração à MTV.

Sobre essa relação entre o grupo cascudo liderado por Brad Pitt e a turma barra-pesada de Nick Fury nas HQ’s, uma observação precisa ser feita. O Comando Selvagem já deu as caras no cinema em Capitão América: O Primeiro Vingador. Como o Universo Marvel das telonas não adapta o Fury original, mas sua releitura da linha Ultimate*, popularizada em Os Supremos com a fachada de Samuel L. Jackson, o grupo apareceu ali liderado pelo próprio Capitão. Aliás, evidente que essa não é a primeira vez que alguém toca no assunto, apontando as referências e comentando as ironias, conforme conferimos neste texto do Radar HQ.

*(Se você não lê os quadrinhos da Marvel há um tempo razoável, deve estar perdido agora. Mais à frente, as coisas ficam mais claras)

Não só, o clima que a Marvel Studios criou para os filmes dos personagens da casa inviabiliza qualquer coisa minimamente parecida com a HQ que Lee e Kirby trouxeram ao mundo em 1963. Logo, deixemos de lado essa versão “família”, com breves aparições nas intragáveis séries Agents of SHIELD e Agent Carter. Vamos à equipe que tocava o terror de verdade na Segunda Guerra, temidos não apenas pelas forças do Eixo, mas até nas fileiras Aliadas.

Segundo Lee, tudo começou com uma aposta…

Os quadrinhos de guerra já tinham tradição antes da década de 1960, com alguns ótimos títulos publicados pela EC Comics, entre outros.  Quando o assunto é a grande indústria dos comics, os produtos que realmente mandam são os super-heróis, porém, em 1959, um certo desenhista chamado Joe Kubert chamava atenção em um título da DC, apresentando Sgt. Rock aos leitores.

Criação de Robert Kanigher e Kubert, que ainda trabalharia muito com o personagem, Rock liderava a Companhia Moleza (Easy Company) e estreou oficialmente em junho daquele ano, em Our Army At War #83, depois de algumas aparições de personagens protótipos. É difícil ignorar o sucesso desse título na concorrência, mais o prestígio de Joe Kubert, como estímulo à criação do Comando Selvagem. Se a DC tinha um grande artista à frente de uma revista com aquela temática, por que não tentar? Afinal, eles também tinham um super desenhista que, por acaso, tinhas as iniciais J e K!

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Sgt. Rock, um personagem que será sempre associado a Joe Kubert!

Em todo caso, a história que Stan Lee conta sobre essa criação tem um pouco mais de firulas. Como todo mundo sabe, em 1961, a estreia do Quarteto Fantástico mudou as HQ’s de super-heróis para sempre e o estabelecimento do universo Marvel foi sucesso atrás de sucesso. Em 1963, a parceria com Jack Kirby já tinha gerado um padrão de qualidade reconhecível, o que fez com que Lee topasse uma aposta curiosa com o patrão Martin Goodman.

Vai de cada um acreditar nessa história. Confiante no trabalho que realizava com Kirby, Stan Lee apostou que seriam capazes de fazer com que uma revista com título ruim vendesse bem. Fantastic Four, Spider Man, Doctor Strange e outros eram nomes curtos, fáceis de lembrar e uma regra da casa. Subvertendo isso e inspirado por uma divisão real do Exército norte-americano, Screaming Eagles, Lee chegou em Howling Commandos.

Já impõe respeito.  A palavra “Commandos” é uma versão anglicizada de “Kommandos”, que designa operativos de forças especiais e altamente especializadas na Alemanha, Holanda e África do Sul. Em nosso bom português, “comando” também não significa apenas todo um grupo de elite, servindo também para designar cada soldado individualmente.

Seria estranho mesmo um grupo chamado de “Comandos Uivantes”. Logo, “Comando Selvagem” não é uma opção ruim para o nosso idioma, mesmo hoje lembrando (de leve, felizmente) o Comando Maluco, de Dedé Santana. Voltando à escolha do título original, não bastando as duas palavras longas, ainda foi acrescentado o nome do líder. Um desavisado poderia achar que se tratava de uma banda de rock.

Naquele momento, a ausência de super-heróis era uma dificuldade a mais para o gibi emplacar, claro. Assim, Sgt. Fury and His Howling Commandos #1 saiu em maio de 1963, durou mais que as expectativas e completou 167 edições em 1981. No Brasil, o Comando Selvagem foi virtualmente ignorado nessa fase clássica, lembrado apenas quando havia flashbacks da Segunda Guerra. Outras formações mais modernas existiram? Claro, já que reciclar é preciso, mas fiquemos apenas com o grupo original que inspirou Bastardos Inglórios.

Baguncinha na Europa

A nova série parecia sob medida para Jack Kirby. Duas décadas antes, ele havia criado Boy Commandos ao lado de Joe Simon. A revista da DC misturava guerra com temática de gangue juvenil, aproveitando sua vivência das turmas de garotos das quais fez parte. Depois disso, foi convocado para os campos de batalha europeus. O Comando Selvagem era uma espécie de consequência natural de uma vida como essa.

Além disso, o sargento casca-grossa Nick Fury, sempre fumando charuto e com um xingamento pronto para os subordinados, apesar de ser capaz de tudo por eles e vice-versa, carregava muito do próprio artista. Assim, o número de estreia apresentou uma insólita formação multiétnica, bastante à frente de seu tempo, é bom dizer.

Nick Fury e Comando Selvagem - Bastardos Inglórios da Marvel

Treinamento pesado para os Selvagens!

Além do Sargento Nicholas Fury, os leitores conheceram o Cabo Timothy Aloysius Cadwallader “Dum Dum” Dugan. Ex-artista de circo e segundo na liderança. Preferia a guerra, os gritos e o mau-humor do superior direto do que a vida doméstica com a esposa. Pelo que ele dizia, Fury era um santo perto dela.

Os soldados que seguiam a dupla eram:

Isadore “Izzy” Cohen: Em um grupo como esse, não poderia faltar um soldado judeu. Especializado em mecânica, Cohen era o elemento que ajudava a equipe a se lembrar do perigo que a Alemanha representava.

Gabriel “Gabe” Jones: Músico de Jazz e sempre tocando sua corneta durante os ataques. Na época, era bem incomum um personagem negro em posição de destaque, o que gerou um erro na impressão da HQ de estreia. O colorista Stan Goldberg havia feito certo, mas a gráfica achou que fosse um engano. Repetiram nele a cor usada nos personagens brancos.

Dino Manelli: Os galãs são um clichê de caserna. Se o Recruta Zero tinha o Killer (que no Brasil ganhou um nome mais adocicado: Quindim!!!), o Comando Selvagem  tinha Dino Manelli, um ex-ator inspirado em ninguém menos que Dean Martin.

Robert “Rebel” Ralston: Esse rapaz estava ali para cumprir mais uma cota de clichê. No caso, a do caipira, já que Ralston era natural de Kentucky.

Jonathan “Junior” Juniper: O caçula do grupo não tinha muito o que fazer ali. Os criadores logo perceberam isso e deram um jeito de se livrar do garoto e trazer novos membros, como veremos mais à frente.

Sediado na Inglaterra, o grupo causava bastante em todas as missões, respondendo apenas ao Capitão “Happy Sam” Sawyer. Este vivia passando um pano nas explosões de Fury. Se a Companhia Moleza do Sgt. Rock tinha uma pegada mais dramática, as aventuras do Comando Selvagem ignoravam tudo isso pela diversão. Mesmo sem super-heróis, suas histórias caprichavam na licença poética, suspensão de descrença e narrativa puramente escapista, sem muito compromisso com a realidade.

Em sua primeira aventura, os Selvagens (Howlers) são apresentados ao leitor durante um treino de infiltração bastante rigoroso, utilizando munição real! O nome da história já indica a periculosidade da missão e não deve nada a qualquer filme B italiano: Seven Against The Nazis! Até o próprio Hitler deu o ar da graça nesta estreia.

A missão era salvar um líder da Resistência Francesa em poder dos nazistas, antes que eles o torturassem para revelar a data do Dia D. Invadir a França ocupada? Fácil, pois esses caras derrubavam aviões com granadas, no meio de fogo pesado e enquanto saltavam de paraquedas, entre outras façanhas. As últimas páginas de cada edição traziam informações sobre armamentos e indumentária de cada país, também com desenhos de Kirby.

Como em Indiana Jones, os nazistas estavam ali como escada para as proezas mirabolantes do grupo, com Kirby refinando cada vez mais sua capacidade de envolver o leitor na ação. Mas, com a Marvel formando aos poucos seu universo compartilhado, como ficavam essas histórias ambientadas no passado? Lembrando que o Capitão América, criação de Kirby e Joe Simon, ainda não havia retornado do esquecimento que o fim da Segunda Guerra trouxe aos heróis patrióticos.

Sgt. Fury And His Howling Commandos #3 foi lançado em setembro de 1963, pois era uma publicação bimestral**. A curiosidade desta edição é que foi ela quem deixou claro para os leitores que Nick Fury e seu grupo viviam no mesmo mundo que Homem-Aranha e cia. Um certo Reed Richards faz uma participação como major da OSS. Os verborrágicos recordatórios de Stan Lee deixaram de lado toda sutileza e explicaram aos desavisados que aquele era o futuro líder do Quarteto Fantástico. Bela deixa, não? Então façamos agora um pequeno desvio das aventuras do Comando Selvagem.

**(Como a distribuição era controlada pela concorrência, havia uma limitação de revistas  que a Marvel podia publicar por mês. A estratégia de alternar títulos bimestrais era uma solução para colocar mais personagens em circulação.)

O nome é Fury, Nick Fury!

Pois bem, o Nick Fury “moderno”, de tapa-olho e agente da CIA, apareceu em Fantastic Four #21, em dezembro de 1963. Em agosto de 1965, Strange Tales #135 trouxe a versão definitiva do personagem, como o super espião agente da SHIELD. Aliás, outros colegas de batalha também foram cooptados à agência, mas isso não vem ao caso agora. Passadas duas décadas do fim da guerra, era preciso explicar a juventude mantida. A gambiarra foi um soro chamado Fórmula Infinito e ficou tudo certo.

Nick Fury e Comando Selvagem - Bastardos Inglórios da Marvel

A versão “moderna” de Nick Fury, como agente da SHIELD!

Graças à onda de espionagem deflagrada por James Bond, Fury ganhou mais um título, publicado simultaneamente com suas histórias de guerra, e brilhou graças a um jovem artista chamado Jim Steranko. Mas isso é outra história e quem nos interessa é o Sargento Nick Fury. Antes de voltarmos ao nosso foco, uma observação abaixo para quem ainda se confunde com o personagem clássico e aquele com a cara de Samuel L. Jackson.

Em 2000, com o intuito de atrair novos leitores, a linha Ultimate trouxe uma versão alternativa do Universo Marvel, com origens modernizadas em séries publicadas em paralelo com a continuidade clássica. A versão Ultimate de Nick Fury, mais palatável ao leitor recém-chegado, não carregava décadas de eventos difíceis de explicar. Justamente por isso, é o modelo que a Marvel adotou no cinema.

Pronto!

Guerra é guerra!

O #4 da revista do Comando Selvagem trouxe uma história chamada Lord Ha-Ha’s Last Laugh!, onde uma reviravolta pegou os leitores de surpresa. A proposta mais descontraída do gibi já havia ficado clara, porém, aquela era uma série de guerra. Logo, era preciso que alguém morresse para que os leitores comprassem o perigo que os heróis corriam. “Junior” Juniper foi o escolhido.

Somente Fury e seus homens dariam conta de entrar em Berlim(!) para resgatar um único homem. O filho de Lorde Hawley, supostamente raptado e obrigado a fazer propaganda radiofônica a favor do Reich sob o pseudônimo de Lorde Ha-Ha. Na verdade, ele não tinha nada de vítima e morreu tentando entregar seus salvadores. No meio da inevitável troca de tiros perto do final, Juniper acaba atingido e sai de cena gravemente ferido, com seus companheiros certos de que era a última vez que o viam. E foi mesmo.

Na melhor tradição melancólica da Marvel na época, Fury engata um romance com Pamela Hawley, irmã do Lorde Ha-Ha. Ao voltar da missão, prefere mentir dizendo a ela que ele morreu como herói. Mesmo com essa carga dramática, a edição mantinha o tom de humor característico, com Dum-Dum e os outros tirando sarro do sargento por ele se arrumar para um encontro, como se fossem garotos na pré-adolescência.

Mas a série não descambou para o dramalhão. O número seguinte extrapolou na licença poética da macheza ao apresentar o Barão Strucker. O malvado, que se tornaria recorrente do Universo Marvel, desafia Fury para um combate homem a homem. O sargento, puto com a ousadia, contraria ordens e vai sozinho ao encontro da tropa nazista. Perde a luta graças a uma trapaça e é devolvido vivo e desmoralizado. Claro que o final tem Fury recuperando seu apetite e dando o troco bem dado em Strucker.

Kirby sai, Lee fica e o Universo Marvel cresce

Cada vez mais requisitado em títulos de maior destaque, Jack Kirby foi substituído no #8 por seu arte-finalista na série, Dick Ayers. A revista não perdeu o pique, ainda contando com Stan Lee nos roteiros e Ayers seguindo o estilo ao qual já estava acostumado. A mesma edição trouxe outro substituto, mas dentro da história. O inglês Percival “Pinky” Pinkerton ficou com a vaga de “Junior” Juniper e o grupo ganhava em diversidade.

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A estreia de “Pinky” Pinkerton, já no traço de Dick Ayers!

Carregando no estereótipo britânico, Pinkerton era um almofadinha delicado nos trejeitos, sempre com seu guarda-chuva, contrastando com os brucutus do Comando. Claro que, apesar do vestuário e acessórios, ele era um combatente e tanto, mais ou menos como Colin Firth em Kingsman. Sua primeira missão com os Selvagens tinha como objetivo invadir novamente a Alemanha e raptar um cientista. O tal era o Barão Zemo, depois aproveitado como inimigo do Capitão América. Mantendo o tom, a invenção do vilão era o Raio da Morte.

Em julho de 1964, quando revista foi lançada, a restrição na distribuição já não existia e Sgt. Fury And His Howling Commandos tornou-se mensal. A série ia bem, obrigado. Naquele mesmo ano, em março, o Capitão América foi revivido pelos Vingadores em Avengers #4, criando todo o contexto de seu desaparecimento no fim da Segunda Guerra e ressurreição depois de quase duas décadas congelado. Com a origem do Capitão indissociável da luta contra os nazistas, não demoraria muito para que uma continuidade retroativa criasse laços entre ele e Nick Fury.

Enquanto isso não acontecia, Fury e seu bando seguiam a vida. Já que fidelidade histórica nunca foi a ordem do dia, como o filme de Castellari ou Bastardos Inglórios, Hitler aparecia de vez em quando para divertir os leitores. Por isso, na edição #9, foi posto em prática um plano pouco ambicioso: apenas capturar o próprio Führer! Aproveitando de leve um detalhe conhecido da vida real, o grupo acaba enganado por um dublê no fim da história.

Capitão América, Bucky e Jack Kirby!

Ainda em 1964, o #13 foi lançado em dezembro. Capitão América e seu parceiro Bucky tiveram seu inevitável encontro com o Comando Selvagem na Segunda Guerra, dando início a uma das amizades mais duradouras do Universo Marvel. O evento foi tão especial que o Rei Kirby desenhou a edição. Claro que, para um evento deste porte, era preciso que houvesse uma ameaça considerável.

Nada menos que uma invasão à Inglaterra pelos alemães junta os heróis, em uma aventura que sedimentou o grande respeito mútuo entre o cético e enciumado Fury e o Capitão.  Com Kirby já bem mais à vontade, houve até espaço para o uso de fotomontagem, recurso que ele começava a empregar com sucesso. Estabelecida a relação entre a Sentinela da Liberdade e o Comando, Dick Ayers retomaria a arte na edição seguinte.

A origem do tapa-olho, mais um membro novo e a despedida de Stan Lee

Colocar um Fury caolho no presente era uma boa estratégia, já que os leitores ficaram curiosos sobre como ele teria ficado assim. A edição #27, de fevereiro de 1966, não apenas trouxe essa informação, ferimento por estilhaço de granada, como também a participação de outro nazista famoso da vida real: Hermann Goering! Além disso, é aqui que encontramos mais uma semelhança com o filme de Tarantino.

Lembra do alemão louco, Hugo Stiglitz, que abandonou sua pátria e juntou-se aos Bastardos Inglórios? Antes dele, Eric Koenig, cansado de servir a líderes que não respeitava, deixou de lado o nazismo e a Alemanha para ajudar a causa Aliada, depois incorporado oficialmente ao Comando Selvagem. Ah, Fury poderia ter salvo seu olho se tratado a tempo, mas o sacrificou para não se ausentar da batalha.

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Eric Koenig querendo mostrar serviço!

Com Stan Lee cada vez mais concentrado na expansão dos super-heróis para outras mídias, foi substituído por Roy Thomas no #29, em abril daquele ano. Em sua passagem pelo título, Thomas criou mais um momento que deve ter marcado a memória de Tarantino. Em agosto de 1966, a edição #33 termina com os Selvagens prisioneiros dos nazistas na Grécia, mas sem seu líder.

É a deixa para que o número seguinte faça um interlúdio com a origem do grupo, fechando o arco no #35, onde Hitler em pessoa pretende comandar e transmitir a execução deles em Berlim. Isso dentro de um… cinema. O ditador encurralado em um cinema lembrou alguma coisa?

Nick Fury coloca o seu na reta em mais uma missão suicida, auxiliado por Eric Koenig e outro sargento durão escalado de última hora, Bull McGiveney, e seu cabo. Ele já havia dado as caras na série como rival de Fury. Koenig é finalmente integrado ao grupo, no lugar de Dino Manelli, ferido em combate. Teria sido um tanto previsível matar mais um membro para justificar uma substituição, não?

Mudança de tom

Gary Friedrich atuou como co-roteirista entre as edições #42 e #44, assumindo função sozinho na #45, em agosto de 1967. Neste momento, a aura do herói durão norte-americano, que ri dos inimigos em uma guerra maniqueísta já perdera sua força. A fase de Friedrich, Ayers e John Severin como arte-finalista foi marcada por um viés anti-belicista, pois o Vietnã era um problema da vida real difícil de ignorar.

Aliás, os Selvagens também lutaram em fronts asiáticos. Além da revista mensal, Fury e sua turma tiveram sete publicações anuais entre 1965 e 71. Sgt. Fury and his Howling Commandos Special King Size Annual misturou histórias inéditas e antigas, trazendo entre elas as missões especiais dos Selvagens na Coreia e no próprio Vietnã.

A partir do #80 (1970), a publicação mensal alternou histórias novas e republicações. Chegando ao #120, ficou apenas nas republicações. O motivo para isso foram os pedidos constantes dos leitores por mais histórias e falta de pessoal para produzi-las. Curiosamente, as edições que trouxeram material repetido também venderam bem, provando que o grupo tinha uma base de fãs muito fiel.

Os rapazes de Tarantino e o DNA Selvagem!

A fase de Friedrich merece um olhar mais detalhado, mas não é esse o foco. Muito menos as reutilizações da marca Comando Selvagem ou seus personagens individualmente. O objetivo aqui, além de fazer justiça a um trabalho pouco comentado dos primórdios da Marvel, é indicar a relação entre Bastardos Inglórios e Sgt. Fury and his Howling Commandos, dentro da fase clássica.

Nick Fury e Comando Selvagem - Bastardos Inglórios da Marvel

Bastardos Inglórios, uma homenagem ao Comando Selvagem.

Ainda há um último comentário, ressaltando aquele tipo de ironia que costuma desagradar os fãs de quadrinhos. Apesar das diferenças, a criação de Tarantino tem mais da essência do verdadeiro Comando Selvagem do que sua adaptação oficial apresentada em Capitão América: O Primeiro Vingador. Se me permitem tentar explicar o porquê disso, o primeiro caso é a realização de um admirador confesso a fim de honrar esse trabalho icônico entre vários outros. O segundo é só parte de um lote de produtos cuja preocupação é não ofender ninguém.

Esse tipo de polidez é, provavelmente, a coisa que menos tem a ver com o Sargento Nicholas J. Fury em toda a maldita face da Terra.

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