Três livros, três maneiras de se chegar ao medo
Num tempo em que a internet coloca online e de graça literatura de qualidade, chega a ser honroso o trabalho feito em Terríveis Mestres pela Editora Novo Século ao juntar Sir Arthur Conan Doyle, Edgar Allan Poe e H.P. Lovecraft.
Terríveis Mestres foi lançada em 2020 pela Editora Novo Século e contabilizando os três livros, somam-se 636 páginas.
Sem sinopse específica, cada uma das obras aqui contidas entregam os seguintes contos:
Sir Arthur Conan Doyle
O Caso de Lady Sannox
A Nova Catacumba
O Funil de Couro
O Terror da Fenda de Blue John
O Horror das Alturas
Edgar Allan Poe
A Queda da Casa de Usher
A Máscara da Morte Vermelha
O Gato Preto
Pequena Conversa com a Múmia
A Verdade Sobre o Caso do Senhor Valdemar
O Barril de Amotillado
O Corvo
H.P. Lovecraft
Os Ratos na Parede
A Cor Que Caiu do Céu
O Chamado de Cthullhu
O Horror de Dunwich
Nas Montanhas da Loucura
A Sombra de Innsmouth
Antes de começar, deixo clara uma coisa: Este pobre colaborador não vai sequer se supervalorizar a ousar fazer uma crítica sobre narrativa, tendência literária e estrutura textual de Doyle, Poe e Lovecraft. Estes são glorificados pela história e não me cabe pisar (e profanar) em terreno tão pantanoso quanto sagrado. Me resta então, fazer um apanhado da Box da Novo Século sobre seu formato e escolhas que compõe o livro. Lembre que falarei destes pontos. O resto é ponto pacífico: Os três autores merecem ser conhecidos qualquer que seja o livro que estejam.
Talvez tenha passado despercebido aos olhos do leitor que ao escrever os conhecidíssimos e ilustres autores, nas três vezes até aqui, eu tenha usado uma ordem específica. Doyle, Poe e Lovecraft. Isto não é acidental, eu arriscaria que talvez seja até necessário, para explicar de maneira subtextual, o crescendo ideal na ordem de leitura. Uma sugestão, talvez, me arrisco assim dizer. Talvez eu esteja dimensionando algo tão pequeno, mas acredito que seja de fundamental importância tal fato. Explico: Os três autores trabalham em escalas de tensões diferentes. Enquanto Doyle busca trabalhar um suspense mais pé-no-chão com desenvolvimento e conteúdo narrativo expansivo, Poe tensiona ao dar um horror mais simples e direto – porém sem demérito algum nisto, importante frisar – sobre o gótico misterioso. Já Lovecraft entrega uma catarse ao desespero ao falar do horror cósmico, em escala apoteótica, porém sobre uma camada intimista que permeia a loucura.
Essa divisão auxiliará o leitor a perceber que a Editora Novo Século teve o cuidado de escalonar o formato do terror/suspense a ser apresentado ao leitor. É salutar que haja um mínimo de crescendo na leitura para que não cause estranhamentos ao leitor. E se falo sobre isto, estou longe de pensar no leitor aprofundado nos gêneros, e sim no novato que ainda esteja iniciando o processo de conhecimento dos três autores.
Curto e básico, porém com essencialidades
Honestamente, Terríveis Mestres parece não querer se engrandecer, apresentando um formato competente e simples. Há algo de errado nisso? Não necessariamente. Com um pôster e um suplemento proficiente e interessante escrito pelo escritor Oscar Nestarez, é inegável a estrutura para iniciantes que existe aqui, apesar de que contos como Nas Montanhas da Loucura e A Sombra de Innsmouth são de difícil absorção para qualquer um que não esteja acostumado com o cunho complexo de Lovecraft. Sim, é possível, que em tempos onde reviravoltas são tão clichês, ver um certo tom datado nos plot twists sequenciais de Arthur Conan Doyle em cada um dos seus seis contos (O maior problema de Doyle aqui é, simplesmente, Doyle). E dentro disto, perceber como Poe soava simplista em alguns momentos. O fato é que todos os autores têm lá seus defeitos e isso é plenamente normal e aceitável, desde que isso não interfira nem no contexto de época em que os contos foram escritos, tampouco sejam aquém na qualidade. E, nisto, o Box se sai bem: Prova que para todo o tom antiquado de mais de um século da maioria dos contos ali expostos, há o cheiro da grandiosa ancestralidade literária.
E é aí, no fim das contas, que a Editora Novo Século agradavelmente se arrisca. Nas qualidades inegáveis dos três autores, em seus defeitos, mas acima de tudo, em suas importâncias históricas dentro da literatura. O ramo editorial ainda comporta o mais do mesmo, ainda que a internet ofereça o mesmo gratuitamente e sem uma qualidade razoável. E assim há a vantagem da editora num cabo de guerra cada vez mais desigual, porém, com forças para prosseguir a luta. Conforme já dito no meu texto opinativo sobre Crepúsculo, há preços que devem ser pagos com prazer.
Isto posto, Terríveis Mestres é competente e não se preocupa em se apresentar como Box definitivo, como outras obras ao se superestimarem em demasia. A Editora Novo Século acaba sendo mais realista nas entrelinhas do que se imagina ao colocar a possibilidade de leitores de primeira viagem a conhecerem parte das fundações narrativas que influenciam o contemporâneo até hoje. Se não surpreende pela maioria dos textos ali colocados, vale a experiência, o didatismo e os sustos misturados com mistérios e loucuras.