Antes de Conan, Solomon Kane!
Robert E. Howard é bastante conhecido como criador de Conan, mas o bárbaro nasceu depois de outro herói de ação saído daquela mente fértil. Solomon Kane foi criado em fins da década de 1920, como um puritano inglês na virada entre os séculos XVI e XVII, auto-investido (aparentemente) em uma missão solitária de combater o mal em todas as suas formas, o que envolve tanto ameaças verdadeiramente sobrenaturais quanto a simples crueldade humana pura.
Muito antes de amarras comerciais, que não deixam vários personagens exagerarem nas punições aos vilões – ou mesmo exibirem algo de seu lado negro – Kane mostrava que ele próprio não tinha nenhum problema com isso, apesar do puritanismo e da crença de estar em uma missão divina. Não que houvesse alguma forma de relativizar os atos dos seus antagonistas, que caprichavam na vilania, mas mesmo sem a proposta de um aprofundamento psicológico maior em detrimento da aventura, a figura do nosso herói se torna muito interessante por essa contradição simples e pelo mistério sobre sua origem. Em matéria de violência, Solomon Kane não devia nada a nenhum adversário seu.
O puritano foi apresentado ao mundo através da publicação pulp Weird Tales, em 1928, com o conto Red Shadows. Na década de 1970, enquanto Conan já fazia sucesso na Marvel, Kane também chegava aos quadrinhos pela mesma editora, na revista Monsters Unleashed e posteriormente em Savage Sword of Conan, eventualmente dividindo a edição com outras criações de Howard, como a guerreira Sonja. Por aqui, a editora Abril chegou a publicar histórias do personagem em A Espada Selvagem de Conan, na década seguinte, com a questionável decisão de “abrasileirar” seu primeiro nome, chamando-o de Salomão Kane.
Preenchendo oportunamente mais uma lacuna editorial brasileira, a Generale, selo da Editora Évora, lançou Solomon Kane: A Saga Completa, reunindo tudo que Robert E. Howard fez com o personagem. São os nove contos, mais um apêndice com a correspondência do pai do escritor para H. P. Lovecraft, logo após o suicídio de seu filho, uma resenha e ficha técnica da adaptação para o cinema de 2009 e o poema The Return of Sir Richard Greenville, também escrito por Howard, na língua original e traduzido.
Muito do apelo das narrativas de Solomon Kane reside em suas descrições de ambientes mais exóticos e desconhecidos, na época em que foram lançados. O próprio tradutor, Alexandre Callari, observa no prefácio que a contextualização é importante, já que certas situações se tornaram clichês apenas graças a trabalhos como esses, há mais de oitenta anos. Tendo isso em mente, o fã do gênero não tem como deixar de apreciar e embarcar na história.
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Sobre os contos da edição
Abrindo o volume, em Sombras Vermelhas o personagem se envolve em uma cruzada de vingança que começa na Europa, chegando até a África mística anos depois, motivado pela caçada a um único homem. Aqui é apresentado o feiticeiro N’Longa, coadjuvante que reaparece posteriormente, criando um conflito interessante para o cristão, que considera maligna toda magia. Introduzindo o puritano já durante sua jornada, toda a persona de Kane é delineada neste primeiro conto, mostrando que é uma suposição muito razoável que seu nome tenha sido escolhido com base em duas figuras bíblicas: Rei Salomão (King Solomon), famoso pela sabedoria e pela associação à função de juiz, e Cain, o primeiro assassino, que – em inglês – tem o mesmo som de Kane.
Os contos seguintes mostram as andanças do puritano na Europa e sua volta à Africa. Em um ou outro caso, ele é apenas uma testemunha do poder de forças que não consegue compreender, sem uma participação muito ativa no caso, mas a agressividade e fúria com que se envolve em outros acaba compensando isso. Organizadas neste volume pela sua ordem de publicação, a história que encerra a coletânea, A Chama Azul da Vingança, publicada em sua versão original apenas em 1964, é a mais dinâmica e dá a impressão de assistirmos a um filme de aventura de época. Curiosamente, é a mais simples em termos de conceito, mas a melhor acabada em termos de ritmo, fechando muito bem o ciclo. Fica a vontade de continuar acompanhando esse contraditório, misterioso e violento anti-herói, imaginando por quais outros lugares do mundo ele poderia passar.
Com Solomon Kane: A Saga Completa, a Generale complementa a publicação anterior de Conan, o Bárbaro. Os fãs e admiradores brasileiros do gênero “Espada & Feitiçaria” tem agora mais um trabalho de peso nas prateleiras. Você não conhecia o personagem e ficou com vontade de ver o longa-metragem de 2009? Compre o livro e leia os contos primeiro!
P.S.: Confira abaixo o fan film de Solomon Kane, adaptado do poema The Return of Sir Richard Greenville (acesse também o texto original), que, apesar da cara de especial infantil, vale pela curiosidade: