Os Trapalhões estão no gibi!
Redundante falar que Os Trapalhões estão na memória afetiva de milhões de brasileiros, já que até entrevistamos o responsável por O Cinema dos Trapalhões, Rafael Spaca, em um Formiga na Tela. Além do êxito nas telas, pequenas e grandes, o quarteto liderado por Renato Aragão também foi bem sucedido na Nona Arte. Exatamente por isso, Spaca complementou seu trabalho anterior com As HQs dos Trapalhões, livro publicado pela Estronho.
A trajetória dos Trapalhões nos quadrinhos cobre um período fértil do mercado nacional. Entre o fim da década de 1970 e o desenrolar da seguinte, não era incomum que uma revista de HQ vendesse centenas de milhares de exemplares. Entre grandes sucessos gringos, como Marvel e DC nas mãos da Abril naquele momento, trabalhos nacionais também atingiam um patamar invejável de circulação. As versões em papel e tinta de Didi, Dedé, Mussum e Zacarias são exemplos deste momento especial.
As HQs dos Trapalhões tem uma estrutura semelhante ao livro que se ocupa do grupo no cinema. Desta vez, ao invés do formato de entrevistas das pessoas diretamente ligadas ao assunto, são depoimentos individuais que compõem a edição. Contando com um prefácio de ninguém menos que Dedé Santana, as histórias contadas nos revelam a visão de cada um e informam o leitor sobre como o quarteto chegou a essa mídia. A proposta inicial pouco atrativa, procurando emular o formato televisivo, foi abandonada a partir do envolvimento do famoso Ely Barbosa e sua equipe.
A liberdade temática de roteiristas e desenhistas, sem a obrigação de imitar a TV, torna a revista um sucesso. Isso dentro de um contexto sem quaisquer amarras do politicamente correto, o que muitas das pessoas ouvidas fazem questão de ressaltar. A virada seguinte, quando o humor escrachado que caracterizou a fase da editora Bloch é descartado, é esclarecida para o leitor.
A fase Trapalhões-mirins e o resto
A mudança para a então toda-poderosa Abril levou a uma reestruturação geral de tom e visual, padronizado e restringindo traços de estilo individual dos artistas. Retratados como crianças, Os Trapalhões das HQ’s se tornaram uma variação da marca que poderia estampar qualquer produto infantil. Mantendo o sucesso de vendas quando era comum que outras figuras televisivas ganhassem um gibi próprio. O próprio responsável, César Sandoval, explica a transição e o estouro desta fase.
A publicação da Abril duraria até 1994, ano do falecimento de Mussum. Poucas pessoas devem lembrar/saber de iniciativas posteriores de quadrinhos envolvendo o personagem de Renato Aragão e esse momento menos glorioso também é descrito por quem fez parte dele.
Formato questionável e falta de revisão
Se a iniciativa de juntar o maior número de pessoas que fizeram parte desta história editorial é louvável, a maneira de apresentar essas informações acaba dificultando um pouco a leitura. Ainda que os materiais do acervo dos artistas, que incluem até uma HQ inédita entre esboços e outras imagens, sejam um colírio e chame atenção de qualquer pessoa que folheie As HQs dos Trapalhões, o formato escolhido sabota as boas intenções.
O livro não deixa de ser um bom material de pesquisa, mas, se for este o objetivo, é um tanto difícil localizar-se. Mesmo em termos de uma leitura descontraída, os relatos em série de profissionais que trabalharam juntos acabam repetindo os mesmos detalhes para o leitor, o que torna o conjunto repetitivo, caso ele decida ler muito mais que um depoimento por vez. Infelizmente, a revisão também ficou devendo. A impressão é que não houve cuidado ou simples verificação no texto de algumas pessoas, deixando passar até informação errada.
São falhas graves que prejudicam muito a avaliação final de As HQs dos Trapalhões. Mesmo assim, é uma obra que interessa a qualquer fanático por quadrinhos pelo seu caráter histórico. Se esse também for alguém que teve o prazer de comprar esses gibis na banca do seu bairro, melhor ainda.