Não dá outra. O Oscar adora um drama de época – baseado em fatos – com protagonista sofredor, que coloca todos os holofotes da mídia em cima do ator que o interpreta. O Jogo da Imitação (The Imitation Game) segue bem essa fórmula, com outro ingrediente especial para abocanhar prêmios: Segunda Guerra Mundial. Isso não é necessariamente um demérito, mas sentir, de longe, o cheiro desta estratégia já indica que vai faltar ousadia, e como esse é meio que um artigo raro no cinemão atual, já parece indicar uma obra um tanto descartável.
Confirmando as suspeitas, o filme é mesmo um pretenso papa-Oscar, mas se você puder deixar isso de lado, não vai se arrepender. Existem duas coisas que valem muito a pena aqui, sendo a primeira a história real que inspirou o filme. Alan Turing foi o matemático responsável por decifrar o funcionamento da máquina Enigma, que codificava as mensagens alemãs durante a Segunda Guerra e tornava inútil a interceptação das mesmas pelos Aliados. Turing não só possibilitou a derrota Nazista, como suas pesquisas possibilitaram a criação dos computadores, mas sofreu por ser homossexual em uma Inglaterra que proibia esse comportamento.
O segundo ponto a favor é o ator que interpreta Alan Turing. Benedict Cumberbatch tem um desempenho notável com esse personagem que não foge do clichê “gênio-antipático-antissocial”, e ainda começa o filme em uma situação que faz lembrar seu papel mais famoso e responsável pela sua popularidade, Sherlock Holmes, do seriado da BBC. Além disso, é inevitável lembrar de Uma Mente Brilhante, com Russel Crowe. Apesar destes detalhes, ao longo da narrativa a atuação de Cumberbatch se sobressai a ponto de fazer o público esquecer de tudo isso, deixando na tela apenas o seu Alan Turing muito bem construído, com um sofrimento realmente palpável e convincente, formando a verdadeira força por trás do filme. O restante do elenco apenas faz sua parte, dando suporte ao protagonista, sem nenhuma menção especial aos desempenhos de Charles Dance, Keira Knightley, Matthew Goode ou Mark Strong.
É complicado apoiar um filme em um evento histórico de conhecimento geral, portanto, uma opção inteligente do roteiro de Graham Moore, adaptado do livro de Andrew Hodges, é ambientar-se em três linhas temporais. A infância e o pós-guerra são mostrados aos poucos enquanto o evento principal se desenrola, o que contribui bastante para evitar o cansaço do espectador, que percebe facilmente que o que realmente importa ali é o protagonista. Evidentemente, também existe uma mensagem clara sobre tolerância e respeito, com direito – infelizmente – até a uma frase edificante dita mais de uma vez, uma mania bem pouco sutil que Hollywood poderia abrir mão de vez.
O diretor norueguês Morten Tyldum, tentando uma carreira mais comercial, pode ter feito um filme de fórmulas fáceis com a mira voltada para alguns prêmios, mas mesmo assim entregou um produto final competente, o que já está de bom tamanho. Foi beneficiado pelo material e pelo seu ator principal? Claro que sim, mas discutir como teria sido em outras condições é completamente inútil e coisa de crítico ou espectador chato. Que tal esperar pelo próximo filme do cara? Mais um roteiro adaptado e desta vez a fonte é um pouquinho mais complicada de transpor para outra mídia, mas também tem a ver com tecnologia e criptografia… Reconhecimento de Padrões, de William Gibson!
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