Está confirmado agora que o bom moço e outrora galã de Hollywood, Matthew McConaughey, e o vocalista da banda de rock 30 Seconds to Mars, Jared Leto, merecem os elogios que estão recebendo. Até Raul Gil tiraria o chapéu. Leto já foi até premiado com o Globo de Ouro deste ano por sua atuação e McConaughey ainda aguarda sua sorte (ou interesse da Academia) na premiação do Oscar de melhor ator principal. Pelo visto, deve entrar com força nesta concorrência.
McConaughey é um caso à parte. Fez uma reviravolta em sua carreira. De comédias românticas e aventuras duvidosas (Sahara é qualquer nota!) para os recentes personagens complexos e perturbados que interpreta em Killer Joe e na ótima série da HBO, em exibição atualmente, True Detective. Seu aspecto físico impressiona em Clube de Compras Dallas, para quem o conhece das produções anteriores, porém, mais do que isso, o ator tem convencido nestes últimos papéis. Aqui não é diferente. Ele emagreceu uns 30 quilos e provou mais uma vez sua dedicação e vontade de ser levado a sério. Jared Leto não fica atrás. Seu personagem transexual convence tanto quanto McConaughey. Ambos fazem um contraste tão interessante no filme, o anti-herói homofóbico junto a um transexual sensível, que o espectador se sente confortável com a relação entre eles.
Após a rasgação de seda feita ao elenco, vamos à história que é baseada em fatos verídicos. Um drama que, apesar de pequeninos alívios cômicos, não deixa de ser uma longa e dolorosa caminhada até o desfecho já esperado. Isso não é ruim, pois a proposta é esta mesma.
A época é a década de 80. A AIDS começa a despontar como algo avassalador. Até então, o vírus afetava homossexuais e usuários de drogas injetáveis em escala maior. Os heterossexuais, que seguiam suas vidas com menos preocupações neste sentido, deixavam a prevenção do vírus para segundo plano. Ron Woodroof (McConaughey) é eletricista de profissão e cowboy nas horas vagas. Típico texano com aquele sotaque característico de interior dos EUA. Vivendo “la vida loca” com prostitutas e drogas, torna-se, em pouco tempo, um novo HIV positivo. Tem dificuldade para aceitar no início, por não fazer parte do foco da doença até então, porém logo percebe que o caso é sério.
Quem se lembra desta década, sabe a vida curta de quem contraía o vírus pela falta de opções terapêuticas. O AZT, aprovado pelo FDA, mais atrapalhava do que ajudava. Sem ter os resultados que gostaria, Woodroof tem acesso a terapias paralelas com efeitos muito melhores, mas não aprovadas pelo FDA. Descobre um caminho para conseguir estas drogas e cria um Clube de Compras, que nada mais é do que um fornecedor destes coquetéis não aprovados ou regulamentados para os doentes, inclusive para si mesmo, e compra a briga com o segmento farmacêutico e os órgãos que liberam os medicamentos.
Primeiro comentário a ser feito. Diferentemente de Trapaça, recentemente divulgado aqui, elogiado por críticos e forte concorrente ao Oscar, o elenco que impressiona em Clube de Compras Dallas não é um dos únicos atrativos do filme, pois há equilíbrio entre performances e produção. O todo é consistente, diferente de Trapaça onde o elenco segura muito mais a barra.
Mesmo com ambiente anos 80 impecável, belas atuações, câmera de mão em quase 100% do filme (o que dá uma cara informal bacana e até mais modesta à produção) e outras conquistas técnicas, você provavelmente se importará mais com as mensagens sociais aplicadas pelo diretor. Acompanhará na tela, não pela primeira vez, parcerias indevidas entre médicos, hospitais e laboratórios farmacêuticos, as consequências disso e o poder daqueles que regulamentam os medicamentos no mercado, através de interesses que os convêm.
A questão é que se este pano de fundo, já visto por você anteriormente, estiver em contexto interessante e não apelativo, ótimo. E isso acontece. É sim do tipo filme-denúncia, mas com conteúdo reflexivo sem cair no melodrama comum tão tentador no cinema.
É necessário abrir espaço para o diretor também, o franco-canadense Jean-Marc Vallée. Seus temas nunca são triviais e seus personagens sempre complexos. Em CRAZY de 2005, uma família cristã lida com um filho homossexual e em Café de Flore de 2011, uma mãe tenta aprender a lidar com a Síndrome de Down de seu filho. Há sempre o compromisso do diretor em não simplificar personagens, ou histórias, e fazer o público refletir e discutir posteriormente.
Um detalhe importante é a trilha sonora sempre bem escolhida por Vallée. Se o rock psicodélico/progressivo ele já havia utilizado bem em seus filmes anteriores, em Clube de Compras Dallas a trilha é mais variada, mas está tão enérgica e viva quanto em seus outros trabalhos.
Segue o trailer legendado para quem quiser se familiarizar com a ideia antes de ver o filme completo:
Recomendo sim, não cansa e vale como denúncia sem sentimentalismo gratuito ou exagerado. E é claro, funciona pelo diretor que costuma acertar e pelo elenco que também irá te impressionar e marcar a sua experiência na telona…