Pelé: O Nascimento de Uma Lenda segue uma fórmula desagradável
Não é novidade que ídolos esportivos geram boas premissas. No entanto, é preciso saber contá-las. O filme Pelé: O Nascimento de Uma Lenda (Pelé: Birth of a Legend – sim, é um filme gringo…) é muito mais uma história da Carochinha do que uma biografia. Algo que deve ser visto com olhar lúdico, preparado para encarar um conto de fadas do futebol. Uma gata borralheira com a bola nos pés.
Ele conta a história de “Dico”, o jovem Edson Arantes do Nascimento, filho de seu “Dondinho” e dona Celeste, desde a infância pobre em Bauru e sua trajetória até se tornar “o” Pelé, craque da copa de 58. É uma trajetória melodramática, com direito a morte e sacrifício no melhor estilo novelão mexicano. Vou tentar evitar a referência ao episódio clássico do Chaves. 😉
Todo o enredo gira em torno da eterna dúvida da aceitação de quem somos e o que nos faz ser quem somos. Claro que Dico só se tornará Pelé quando abraçar suas raízes e essa força “mágica” brasileira chamada de “ginga”. A malemolência que teríamos herdado dos negros escravos, segundo o filme.
Os irmãos Jeffrey e Michael Zimbalist, diretores e roteiristas, já haviam trabalhado com temas brasileiros (o documentário Favela Rising, de 2005, e a série da ESPN dedicada a ídolos do futebol, 30 for 30, onde abordaram Garrincha). Tentaram imprimir suas visões na cinebiografia do Rei do Futebol, juntamente com o fotógrafo Mathew Libatique (de Mãe!, Cisne Negro e Noé), criando uma espécie de balé futebolístico, conseguindo aqui uma bela representação do esporte, de uma maneira acrobática e teatral.
Acontece que a beleza está apenas aí. O filme traz um protagonista vacilante, vivido em duas fase pelos atores Leonardo Lima Carvalho (10 anos) e Kevin de Paula (dos 13 aos 17), e quase sempre melancólico. O nomes que mais se destacam na película são os de Vincent D’Onofrio (Nascido para Matar) como Vicente Feola, técnico da seleção de 58, e o de Seu Jorge como o pai de Dico. Existem participações de diversos atores brasileiros, como o onipresente Milton Gonçalves e o jovem Felipe Simas. Rodrigo Santoro, também produtor, e o próprio Pelé fazem pequenas aparições que mal se notam.
O idioma inglês é universal… #sqn
Apesar de um elenco competente, eles acabam se comprometendo, obviamente, naquilo que aflige a esmagadora maioria dos filmes biográficos produzidos na terra do Tio Sam: o idioma. Pelé: O Nascimento de Uma Lenda é um filme sobre brasileiros, com um elenco quase todo brasileiro e falado em INGLÊS. Foi uma aposta que não deu certo.
Com diálogos ruins (mal escritos mesmo) e atuações sofríveis, principalmente durante a fase infantil do craque, o filme é bastante prejudicado quando os personagens precisam se expressar através da fala. Mesmo D’Onófrio parece deslocado, em um misto de incomodado e sem vontade quando atua com brasileiros. Nem de longe lembra o ótimo trabalho como Wilson Fisk na série Demolidor.
Sem muita preocupação histórica e com uma carga bem grande de estereótipos e clichês, o filme apela para a boa e velha fórmula da redenção para levar uma história batida até seu final sem surpresas, mas também sem sustos. A insistência na tal da “ginga” beira o ridículo quando começam a compará-la com um poder mágico que pode ser perigoso caso mal utilizado.Em certos momentos o filme fica tão desconectado da realidade que eles encenam o “Desafio do Manequim” em plena partida de futebol!!
O filme não é tão ruim, já que chega a ser divertido. Não é o caso de ser crítico demais, pois ele próprio não se leva a sério, mas poderia ter arriscado mais em um aprofundamento dentro da psiquê dos personagens, só para se afastar um pouco do melodrama. No fim, ficou um misto de animê (Lembram-se de Os Supercampeões?), comercial da Nike e telefilme mexicano.
Vale a experiência para os fãs de futebol, mas os fãs de cinema vão discordar do Chaves (ok, eu não consegui me segurar…)