Mártires (Martyrs), co produção entre França e Canadá, foi escrito e dirigido por Pascal Laugier em 2008. Desde seu lançamento, o filme tem alcançado – e agradado – o público fã de terror, graças ao boca a boca da internet, que populariza algumas obras que nem chegam a passar em nossos cinemas. Tal sucesso, principalmente em um nicho como esse, não passa despercebido pela grande indústria, dando origem aqui a mais um exemplar de remake norte-americano inútil. Se você viu o original, sabe que estamos falando de algo bastante contundente, conceitual e visualmente, muito distante do que se encontra aos montes hoje em dia em Hollywood. Essa consciência traz mais desgosto a quem se dispuser a encarar esta refilmagem.
Lançado no circuito dos festivais gringos do ano passado, o novo Martyrs – mantendo o título original por aqui – tem como protagonistas Lucie e Anna, cujos nomes das atrizes não faz a menor diferença citar, já que são rostos que, no máximo, você viu fazendo pequenas participações em alguma série de TV, assim como o resto do elenco. As duas cresceram em um orfanato, com Lucie chegando depois de fugir de um misterioso cativeiro, encontrado limpo após a indicação da menina. Dez anos depois, com Anna ainda questionando a capacidade mental da melhor amiga, Lucie diz ter encontrado os responsáveis pela sua tortura e procura vingança, colocando as duas em uma situação complicada.
Muito bem! Quem já viu o filme de Pascal Laugier já sabe o resto, mais ou menos. Os diretores Kevin e Michael Goetz, com apenas um longa antes deste remake, afirmaram que foi um choque saber da existência deste projeto, dizendo-se fãs do original, porém perceberam que haveria algo a mais a partir de uma pequena mudança na história, então acharam que poderiam fazê-lo trazendo um novo olhar. Ah, também disseram que ao ler o roteiro de Mark L. Smith – surpreendentemente, co roteirista do premiado O Regresso – perceberam não se tratar de uma versão atenuada para um público maior… Não acredite neles! Pura conversa pré-fabricada de assessoria.
A direção é absolutamente insossa no sentido de criar algum clima ou suspense, sem qualquer inventividade no uso da fotografia ou da trilha sonora, genérica, diga-se de passagem. Com boa vontade, até seria possível citar que a montagem consegue criar um contraste bacana dos exteriores ensolarados com outro ambiente sombrio, mas, no meio de tudo, acaba parecendo que isso foi totalmente ao acaso. Em uma história de violência e tortura como essa, a dupla de diretores não foi capaz de perturbar o espectador, como se espera de um filme de terror. Entre os dois caminhos possíveis no caso, gráfico ou sugerido, fica a impressão de que ninguém parou para pensar o que seria melhor e acabam não entregando sequer uma tentativa válida. Sobre as atuações, nem compensa comentar e isso não é culpa do elenco, que deve ter se tocado que não valia pena esforçar-se muito por esse roteiro, lotado de inconsistências.
O texto de Mark L. Smith tenta deixar algumas coisas em dúvida para quem não conhece o filme original, mas se atrapalha terrivelmente, atribuindo características a Lucie que são descartadas assim que a “surpresa” já se perdeu. Existem conveniências estúpidas, como alguém que considerávamos morto estar vivo, mas justamente essa pessoa não foi enterrada junto com seu grupo, além daquelas forçadas no comportamento de quem poderia correr e chamar a polícia, mas prefere procurar uma arma e virar o Charles Bronson. Nem importa que nada mostrado anteriormente justifique esse comportamento. Felizmente, enxugaram um pouco a duração, com oitenta e seis minutos, o que o deixa com cerca de dez minutos a menos que o original.
Considerações que revelassem muito da história foram evitadas, como sempre fazemos por aqui, respeitando quem tiver alguma curiosidade em conferir essa produção capenga. Em todo caso, entre as pessoas que podem ler esta crítica estão os que já viram o Martyrs de 2008 e aqueles que ainda não tiveram o prazer. Para os primeiros, a curiosidade mata, eu sei, mas já vamos com o espírito preparado e esperando uma bomba de proporções apocalípticas. Mesmo assim, é bom esperar um final beócio com sutileza zero. Para o segundo grupo, talvez ele melhore um pouco (bem pouco) com o desconhecimento do original, mas trará spoilers que vão estragar a experiência de quem quiser conferir depois o filme de Laugier. Não faça isso com você mesmo e deixe a refilmagem para depois, se não puder evitar. Caso seja possível domar a curiosidade, melhor esquecer essa nova versão.
Isso é o que há para falar do novo Martyrs, o que não deve ser muita surpresa para os fãs mais antenados do gênero. Para não dizerem que não elogiei nada, sua única virtude está em sua ideia central… Oi? Não é exatamente um mérito próprio, já que é remake? É verdade…
Ah, citei sua curta duração! Serve?