Jogada de Mestre (Kidnapping Mr. Heineken, Holanda, Bélgica e Reino Unido) não pode ser chamado de filme surpreendente. O longa de Daniel Alfredson, diretor da versão sueca para a TV da trilogia Millenium e de outras obras pouco expressivas (Daniel é mais conhecido por ser irmão de Tomas, do memorável Deixe ela entrar e do soberbo O Espião que Sabia Demais), reúne elementos clássicos nos dramas criminais “baseados em uma história real”. Estão presentes o crime como peça central e sua justificativa social, os contrastes psicológicos entre os personagens e até um típico, embora tênue, didatismo moral.
Apesar das limitações,não deixa de ser um filme envolvente e interessante. O grande mérito está, sobretudo, no elenco, cujas atuações convincentes se sobrepõem a eventuais furos no roteiro e carregam com eficiência a dramaticidade que o filme exige. A obra retrata a história real do sequestro de Alfred ‘Freddy’ Heineken e de seu motorista, em Amsterdan, Holanda, em 1983. O crime dominou as manchetes dos jornais da Europa à época e repercutiu em todo mundo pelo valor do resgate pago. É a segunda adaptação cinematográfica do caso em quatro anos: em 2011, o holandês Maarten Treurniet lançou The Heineken Kidnapping, que ficou mais conhecido pela marca da cerveja que carregava do que pelo público que alcançou.
Na tela, após terem um empréstimo negado pelo banco, e talvez para darem um sentido para a própria vida, os endividados amigos Willem (Sam Worthington), Cor (Jim Sturgess) Cat (Ryan Kwantan), Martin (Thomas Cocquerel) e Frans (Mark Van Eewanen), resolvem engrenar em um arriscado plano de sequestrar o magnata cervejeiro Freddy Heineken (Anthony Hopkins), homem mais rico da Holanda, herdeiro da famosa cerveja que leva seu nome. Apesar da evidente elasticidade moral e ética dos protagonistas, Daniel Alfredson tomou cuidado em ressaltar a sincera amizade existente entre eles e o amor que sentem pelas famílias, sem, contudo, transformá-los em heróis. O fator humano está presente em todo momento, mas não a ponto de torcermos por qualquer um dos personagens.
Alfredson colocou Hopkins como coadjuvante de atores ainda iniciantes na carreira e na fama, mas o bom desempenho de todos em cena é o grande trunfo deste filme. O acurado planejamento do crime, a complexa relação de afeto e distanciamento entre sequestradores e sequestrado, a pressão psicológica de um perigo que cresce a cada dia e da solução que demora a chegar, as consequências pessoais do crime são impulsionadas, não pela carga dramática de cada cena, mas pela dedicação do elenco sobre elas. Curiosamente, Hopkins é que o menos brilha nesse esquema, dando espaço para os pares mais jovens.
O roteiro de William Brookfield se baseia no livro de Peter R. de Vries, que também participa da roteirização. A obra de Vries foi escrita a partir de depoimentos dos sequestradores, o que justifica a abordagem intimista da adaptação. Como resultado, conversas e relações pessoais são mais bem trabalhadas que as defeituosas cenas de ação na primeira metade do filme, além do o mal justificado motivo para um crime desse porte contra o homem mais poderoso do país – essa explicação mais sólida deve ser completada por mera interpretação espectador.
Jogada de Mestre não é um filme memorável, mas um drama inteligente e um thriller envolvente. Se não for possível ler o livro, vale uma pesquisada sobre os acontecimentos posteriores aos fatos relatados no filme. Ao final do longa, o rápido epílogo dá uma deixa do que poderia ser uma boa sequencia. Entre ficção e realidade, é mais um exemplo de que a vida real pode até ser mais rocambolesca, em comparação com os mais imaginativos filmes de suspense.