Os erros do filme O Espaço Entre Nós
O espaço sideral sempre intrigou os seres humanos. As galáxias, os planetas e a possibilidade de vida em outros lugares além da Terra são assuntos que nos fascinam há muito tempo. Porém, nos dias de hoje, devido aos avanços tecnológicos e os discursos alarmantes sobre a necessidade de colonizar outros planetas, talvez o espaço sideral nunca tenha sido tão discutido como atualmente. Hollywood, sempre querendo se manter relevante e buscando incessantemente novos temas, vem tentando se manter atualizada acerca da questão. No entanto, seguindo o rastro recente de obras irregulares sobre o assunto, como Perdido em Marte, acabou por lançar este fraquíssimo filme O Espaço Entre Nós (The Space Between Us).
Escrito por Allan Loeb (o roteirista do péssimo Beleza Oculta), a partir de um argumento que ele mesmo concebeu ao lado de Stewart Schill e Richard Barton Lewis, o roteiro conta a história do jovem Gardner Elliot (Asa Butterfield). Depois de uma expedição à Marte não sair de acordo com o planejado, a mãe do garoto, ainda grávida dele, dá à luz ao bebê em pleno planeta vermelho, porém, acaba falecendo durante o parto. Como a vinda à Terra pode trazer perigos à sua saúde, o jovem vive os primeiros 16 anos de sua vida no local em que nasceu. No entanto, conversando pela internet com uma garota (Britt Robertson) e à procura do pai, ele anseia pelo dia em que conhecerá o nosso planeta.
Com um texto que desrespeita constantemente a sua lógica interna narrativa, a produção está repleta dos chamados furos de roteiro. É comum que em obras dessa natureza haja um número considerável de deslizes narrativos, porém, estes costumam ficar mais escondidos, revelando-se apenas em uma eventual revisão. Mas em O Espaço Entre Nós, eles são gritantes. Já começando com um ponto de partida completamente inverossímil (é impossível acreditar que a gravidez da mãe do protagonista não seria detectada pelos médicos da NASA), o longa comete os mesmos erros de lógica em outros momentos, como a falta de uma justificativa aceitável para a vinda de Gardner à Terra e a relação que o protagonista mantém de Marte com a garota (ninguém o estava vigiando?).
Porém, os problemas do roteiro não se restringem apenas a esses erros apontados. Quando conhecemos o jovem, ele tem um conhecimento profundo de ciência, história e outros assuntos. Além disso, fala mais de uma língua (há uma cena que ele assiste a Asas do Desejo em alemão – aliás, o diretor até tenta fazer um paralelo entre o seu filme e o de Wim Wenders, mas o resultado é risível). Mas, quando chega à Terra, ele começa a agir como um idiota completo, ficando surpreso com tudo que passa em sua frente (é difícil acreditar que, nos seus estudos avançados, ele nunca tenha visto a figura de um cavalo ou aprendido que chove no nosso Mundo). Depois disso, quando a trama precisa, ele volta a ser esperto. Assim, fica claro que não há nenhum motivo real para essa mudança de atitude, senão a necessidade que o roteirista tinha de dar seguimento ao seu texto.
Desrespeitando também a verossimilhança nas ações de outros personagens, Allan Loeb continua a mudar as coisas a seu bel-prazer. Por exemplo: por que o personagem interpretado por Gary Oldman some durante 16 anos e só volta num momento crucial da narrativa? O roteirista responde a essa pergunta, mas a solução oferecida por ele é previsível e completamente desnecessária. Um outro elemento descartável é a informação de que a astronauta interpretada por Carla Gugino não pode ter filhos. Claramente expositivo, esse momento não precisava existir para que entendêssemos que ela e o protagonista compartilhavam uma relação maternal.
A direção equivocada de Peter Chelsom
No entanto, se o texto de Allan Loeb não contribui em nada para o envolvimento emocional do espectador com a história, a direção inteiramente genérica de Peter Chelsom acaba por afundá-lo de vez. Não tendo nenhum bom trabalho em sua longa carreira, o cineasta não tem a mínima noção de como filmar cenas de ação, cômicas ou dramáticas. No primeiro desses casos, percebam como no momento em que vemos o personagem de Gary Oldman pilotando uma nave no começo do filme, o fato de o diretor e o montador terem deixado claro ainda no meio da cena que aquilo era uma simulação tira todo o impacto que o instante poderia ter.
No que diz respeito às cenas cômicas, o momento em que o protagonista tenta entrar num ônibus é um bom exemplo da falta de destreza técnica do diretor. Investindo em um jump-cut desnecessário e mantendo a câmera muito distante da ação, o diretor acaba anulando qualquer possibilidade do espectador rir da cena. Por fim, em relação aos instantes dramáticos, veja como na conversa que os personagens de Oldman e Gugino têm sobre os erros do passado, em vez de terminar a cena cortando para um plano que mostrasse a reação comovida da atriz, ele a mantém de costas e o telefone celular dela toca imediatamente, o que quebra todo o impacto dramático do momento.
Com um visual genérico e atuações pouco inspiradas do talentoso elenco, o filme O Espaço Entre Nós será irrelevante tanto para os adultos quanto para os adolescentes. Com sérios problemas de roteiro e direção, acabou ficando no meio do caminho, não conversando nem com um público e nem com o outro. Ao final, fica apenas a constatação de que Marte ainda não teve um filme que fizesse jus à sua magnificência natural.