Mesmo com boas intenções, A Melhor Escolha é esquecível
Observando a obra de Richard Linklater (Jovens, Loucos e Mais Rebeldes), percebemos que há características comuns em suas obras mais pessoais. São filmes de amadurecimento, onde, a partir de uma situação ou uma viagem, os protagonistas se redescobrem de alguma forma, mudando sua visão sobre o mundo, a vida e os rumos que tomaram. A Melhor Escolha (Last Flag Flying) se encaixa nesse quesito por seus temas. O problema é que sua mensagem se torna um pouco confusa, fazendo desta uma obra descartável na carreira do diretor. Mesmo que não seja exatamente um filme ruim.
O longa se passa em 2003, acompanhando Sal Nealon (Bryan Cranston, o eterno Walter White), um veterano do Vietnã, dono de um bar em uma cidade no interior dos Estados Unidos. Um dia ele é visitado por Larry “Doc” Sheperd (Steve Carell, de A Guerra dos Sexos), companheiro de batalhão durante a guerra. O motivo da visita é que o filho de Doc foi lutar no Afeganistão e morreu. Cabe ao veterano reconhecer o corpo e dar o último adeus ao filho. Para isso, ele pede a companhia dos seus dois amigos do pelotão. Além de Sal, ele convida Mueller (Laurence Fishburne, de John Wick 2), que era o mais inconsequente do grupo, mas tornou-se padre. Durante a viagem, os amigos vão lembrar-se dos tempos de guerra, desde situações absurdas a perdas de pessoas queridas.
Escrito por Linklater e Darryl Ponicsan – baseado no livro do último –, o roteiro se mostra o ponto mais frágil do longa. Em alguns momentos, percebemos a sensibilidade e acidez dos diálogos típicos de Linklater, principalmente nos momentos nostálgicos. Porém, quando ele foca na critica política sobre o tratamento dado aos soldados quando retornam das guerras, o discurso fica esquisito por parecer não saber o que atacar. O sentimento de companheirismo entre os soldados e patriotismo são evidenciados, assim como a crítica aos superiores, principalmente os políticos que declaram essas guerras por motivos financeiros. Isso deixa o longa confuso em sua intenção.
Além desse problema de comunicação, o roteiro é problemático pela repetição das situações. O três amigos seguem arquétipos básicos: Cranston, o louco; Fishburne, o religioso; Carell, o bonzinho. A coisa se resume em uma coleção de momentos em que o louco provoca o religioso, que – em algum momento – estoura, já que na juventude era o pior de todos. Então, o bonzinho relembra momentos que mostram que ele não é tão bom assim e a coisa segue. Essa é a dinâmica das situações. Mesmo com alguns diálogos engraçados e tocantes, isso compromete o ritmo em vários momentos, além de atrapalhar a química dos atores.
Três bons elementos que poderiam render muito mais
Não há dúvidas que o trio que segura o filme é muito talentoso, mas, além da repetição, não há muito desenvolvimento nos personagens por conta dos tipos em que estão presos. Mas eles se esforçam. Bryan Cranston parece à vontade e consegue criar um personagem muito cínico, até por conta da sua voz cavernosa, que sempre tem uma resposta para tudo, sendo a maioria dada pelo impulso. No entanto, a falta de desenvolvimento o torna caricato, às vezes. Laurence Fishburne idem, que até convence como uma pessoa que se redescobriu por conta da religião, mas com várias cenas em que explode, a piada perde a graça na terceira vez e lá se foi a consistência do personagem. Já Steve Carrel interpreta o tipo introspectivo que parece que é sua especialidade quando o assunto é drama. Faz bem, mas só repete o que já vimos em outros de seus dramas.
O pior é que o filme precisa da química entre os três para conseguir andar, mas eles parecem frios durante a boa parte do filme. A coisa começa a se soltar só no final do terceiro ato, mas a culpa não chega a ser do elenco, já que, além do trio comprovadamente talentoso, Linklater sempre foi um ótimo diretor de atores.
Já que o diretor foi citado, visualmente, é mais um trabalho seguro da sua carreira. Linklater nunca foi conhecido pelo cuidado estético de seus longas, com movimentos de câmera elaborados ou um cuidado enorme na composição de quadros. É um diretor que justifica a expressão “menos é mais”. Opta por um enquadramento que funciona, além de usar bem o espaço e investir em uma paleta de cores que evidencia o tom melancólico. Resumindo, é um cineasta que depende muito da qualidade do roteiro. Aqui, com um texto problemático (atrapalhado por Darryl Ponicsan, talvez?), não pôde fazer muito.
A Melhor Escolha soa como uma grande chance desperdiçada. Um diretor com o talento de Richard Linklater, um tema forte e interessante e três ótimos atores. Ninguém poderia prever que o resultado seria um filme que se esquece poucos minutos depois, mesmo que não seja necessariamente ruim. A melhor palavra é: frustrante.