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Cinema mudo – Na ausência do som, cada detalhe é um espetáculo!

O Cinema mudo pode ser uma viagem à verdadeira essência fílmica

Todo amante da Sétima Arte tem algum filme antigo no coração, daqueles que datam do tempo do Cinema Mudo. As produções dos primórdios deste ofício serviram de base para tudo o que você conhece hoje através de suas experiências em uma sala de projeção. Sejam filmes artísticos  ou superproduções caça-níqueis, não há preconceito quando o assunto é beber em fontes centenárias. Duvida? Confira a montagem do canal Moon Film, com citações inesperadas de clássicos mudos em obras muito modernas. Em uma época em que os orçamentos e a tecnologia eram limitadíssimos, a criatividade era peça central para impressionar o espectador que ainda desconhecia o poder do áudio, exceto por parcas trilhas sonoras, muitas executadas durante a sessão.

Artigo Cinema mudo

A partir da esquerda, O Encouraçado Potemkin, O Gabinete do Dr. Caligari, Nosferatu e Metropolis. Clássicos absolutos do Cinema mudo!

Nas primeiras três décadas do cinema, alguns filmes se tornaram marcos históricos. Muitas vezes, por preconceito generalizado, o grande-público atual talvez nunca venha a assistir (ou apreciar) ao menos um filme mudo na vida, ressabiados com o ritmo e limitação de recursos. Nomes como Charles Chaplin e seu Carlitos são referências distantes e, geralmente, as únicas desse período. Mesmo alguns fãs do cinema como arte, além do entretenimento, não tiveram a chance de se deslumbrar com obras-primas da época, como O Encouraçado Potemkin (Sergei Eisenstein, 1925), O Gabinete do Dr. Caligari, (Robert Wiene, 1920), Nosferatu (Friedrich Murnau, 1922) ou Metropolis (Fritz Lang, 1927), citando alguns poucos exemplos.

No cinema primitivo, o filme era muito mais que entretenimento. Foi nessa época que a produção se consolidou como arte ao utilizar a criação artística para reforçar as ferramentas de posicionamento político e social.  Se em O Encouraçado Potemkin os enquadramentos de rostos e olhares dos personagens (e a ocultação destes, quando necessário) foram fundamentais para mostrar o aspecto humano da opressão na Rússia do começo do século 20, e da sangrenta revolta resultante, em O Gabinete do Dr. Caligari e Nosferatu, a fotografia, figurinos e cenários são a principal arma para a atmosfera de pesadelo no público, que se encolhia de terror na plateia, algo que poucos diretores conseguem hoje em dia. Já em Metropolis, o grandiosismo é a estratégia usada pelo gênio Fritz Lang para intimidar seu espectador e fazer uma audaciosa crítica social sobre os caminhos que o mundo moderno tomava no decorrer do novo século. Tudo isso, claro, sustentado por trabalhos primorosos dos elencos.

Além da fama

Não é apenas nos grandes clássicos que você pode encontrar os melhores exemplos da magia do cinema mudo. Muitos filmes não tão conhecidos são experiências muito interessantes para se acompanhar o processo de amadurecimento do cinema e como a mente criativa de um diretor pode trabalhar sem recursos que hoje são básicos e disponíveis em qualquer telefone celular.

No início, as produções ainda se apegavam a uma lógica teatral, com câmeras e cenários fixos. Exceção à época, O Roubo do Grande Trem (Edwin S. Porter, 1903) é um marco, sendo o primeiro a utilizar movimentos de câmera, duplos de corpos, composição de imagens externas e internas e, até mesmo, efeitos em cores, quase trinta anos antes do Technicolor. Essa produção é famosa, contudo, pela épica cena final, do bandido atirando contra a plateia pouco acostumada com esse tipo de interação. O filme foi lançado apenas um ano depois de A Viagem à Lua (Georges Méliès, 1902), obra que abriu de vez as portas da magia para o cinema, produção comentada em nosso vídeo sobre Filmes Centenários.

Os efeitos especiais também são o pilar em O Solar Enfeitiçado (Segundo de Chomón, 1907), produção francesa de um diretor espanhol que mistura terror e comédia para contar a história de três pessoas – dois homens e uma mulher – que pedem abrigo em uma casa desconhecida após se perderem em uma noite de tempestade. No local, as mais bizarras coisas acontecem, mas nada é capaz de assustar o grupo, que parece se divertir com a situação, até serem expulsos pelo fantasma que domina o local. O diretor preenche todos os (poucos) minutos da produção usando e abusando dos recursos técnicos disponíveis na época para entreter visualmente o espectador.

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O Homem Que Ri

Performance de atores e estética são a arma de muitos diretores para fazerem um filme se fixar na cabeça de público. Mesmo não sendo um filme de terror, mas um melodrama romântico, é difícil não se apavorar com O Homem que Ri (Paul Leni, 1928), produção norte-americana sob forte influência do expressionismo alemão. O filme relata a história de um homem que, quando criança, teve o rosto desfigurado por ordem de um rei cruel e fica condenado a ter um sorriso estampado no rosto para sempre. A obra não tem efeitos especiais. Todo o peso está nas costas do impressionante trabalho do brilhante ator Conrad Veidt (presente em O Gabinete do Dr. Caligari), figurando entre as melhores de todo período silencioso do cinema. A maquiagem perfeita e o talento de Veidt fazem desta obra uma das mais impactantes e influentes da história. Qualquer semelhança com outro personagem bem conhecido da molecada atual não é mera coincidência.

Roteiros fantásticos também ousaram para a época e criaram tendências seguidas até hoje, quase cem anos depois. Em O Golem – Como Veio ao Mundo (Carl Boese, Paul Wegener, 1920), os diretores usaram a estética expressionista alemã (ela de novo) para criar as bases dos filmes populares de monstro que persistem até hoje. A adaptação do mito judaico, sobre o monstro de barro que ganha vida para obedecer às ordens de seu criador, ganhou popularidade com a fotografia primorosa do alemão Karl Freund, mais tarde naturalizado norte-americano, e atuação de Paul Wegener, que também dirige o longa, no papel título.

Ainda na seara dos roteiros inspiradores, o terror As Mãos de Orlac (Robert Wiene, 1924) novamente usa o talento de Conrad Veidt para narrar a trama do talentoso pianista Orlac, que perde as mãos em um acidente de trem. Um procedimento médico lhe reimplanta as mãos, mas logo ele descobre que os novos membros pertencem a um assassino recentemente executado. Quando descobre, ele acredita ter também a predisposição para assassinar.  O filme é uma aula de interpretação, que constrói um suspense angustiante.

Por fim, entre tantos filmes assustadores na época, o perturbador Häxan – A Feitiçaria Através dos Tempos (Benjamin Christensen, 1922) merece destaque especial. Na produção sueco-dinamarquesa, o diretor e roteirista se baseou em estudos do Malleus Maleficarum, um guia alemão do século XV para inquisidores da Igreja Católica. Häxan é um estudo de como a superstição e a incompreensão levaram à histeria da caça às bruxas. O filme foi feito como um documentário, porém contêm sequências dramatizadas dignas dos melhores filmes de horror, com figurinos e maquiagens horripilantes, além de situações capazes de fazer até os mais resistentes perderem o sono.  Repare na excelente recriação histórica, que resultou o mais caro filme mudo já feito na Escandinávia até então. Apesar de ganhar aclamação na Dinamarca e Suécia, o filme foi banido nos Estados Unidos e pesadamente censurado em outros países para o que foi considerado, na época, representações exageradas de tortura, nudez, e perversão sexual.

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Häxan – A Feitiçaria Através dos Tempos

Novos olhares

Ao mergulhar no interessante universo do Cinema mudo, é inevitável uma nova impressão sobre o Cinema moderno. O peso do olhar em uma interpretação, como a simples presença de atores pode transmitir toda a mensagem emotiva necessária para a trama. Como cenários. iluminação e objetos de cena podem ser determinantes para sua experiência cinematográfica. Como o terror pode ser muito mais perturbador, o drama mais intenso e a comédia mais pura e inocente.

O YouTube tem diversas obras do cinema mudo, visto que quase todas já caíram em domínio público. Todas as obras citadas aqui estão na plataforma. Aproveite para conhecer outras obras magníficas e crie você mesmo a sua interpretação. Garanto que não vai se arrepender.

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