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Robert Aldrich – O Homem dos Mil Cinemas!

Obra do americano Robert Aldrich é muito mais que o clássico O Que Terá Acontecido a Baby Jane?

Comemorar a arte e seus mestres é preciso, ainda mais em tempos sombrios. A turma cinéfila transformou 2018 no ano de Ingmar Bergman, já que o cineasta sueco chegaria aos 100 anos se estivesse vivo. Mas outro homem de cinema também comemoraria seu centenário. O último dia 9 de agosto seria de festa para Robert Aldrich e motivos para amá-lo vão além do retrato da decadência que ele construiu em O Que Terá Acontecido com Baby Jane?, filme estrelado por Bette Davis e Joan Crawford.

Robert Aldrich

Aldrich dirige as atrizes Joan Crawford e Bette Davis

Por falar nele, graças ao sucesso da primeira temporada da série Feud, que aborda a clássica rivalidade das duas protagonistas, que muita gente foi em busca da produção de 1962 sobre a guerra vivida entre as irmãs Jane e Blanche Hudson. O encanto e a diversão que o filme provoca é fruto da união de duas grandes atrizes com a mão precisa da direção de Aldrich. Mas não foi só neste trabalho que ele provou ser um diretor sem medo da ousadia e da mudança. Depois de estrear na função comandando alguns episódios de séries de TV, o americano nascido em Cranston, no estado de Rhode Island, encarou seu primeiro desafio nas telonas em 1953, com Big Leaguer, um drama leve sobre uma equipe amadora de beisebol comandada por Edward G. Robinson.

O filme foi mal nas bilheterias, mas o destino reservava um ano movimentado para Aldrich. Em 1954, ele lançou não um, mas três filmes. Se quantidade nem sempre rima com qualidade, aqui temos um trio que vai num crescente. O primeiro a ser lançado naquele que seria um dos mais produtivos tempos do diretor, Pânico em Singapura, é um exemplar bastante divertido de espionagem. O Último Bravo, mesmo forçando a barra ao colocar Burt Lancaster e Jean Peters interpretando apaches, quebra um padrão ao colocar os ameríndios como protagonistas da trama e inova visualmente com ângulos poucos usuais nos faroestes do período. Mas o verdadeiro novo olhar sobre o oeste se daria no filme seguinte.

Vera Cruz é uma faca em forma de filme. Isso porque faz um corte preciso na linha repleta de produções conservadoras da época para inserir mais violência e uma dupla de protagonistas que comanda o filme em pé de igualdade. Nem dois mocinhos, nem dois bandidos. Há momentos de heroísmo e também de culpa tanto para Benjamin Trane (Gary Cooper) quanto para Joe Erin (Burt Lancaster). Uma década depois os tempos seriam outros para o gênero por influência da crueza cênica dos spaghetti westerns e a uma plateia ávida por mais cowboys suados e sujos do que chapéus sem um resquício de poeira. É provável que um jovem Sam Peckinpah estivesse entre os que vibraram com o filme para, anos depois, criar o western crepuscular Meu ódio Será Sua Herança. 

Robert Aldrich

A Morte Num Beijo (1955)

O beijo inspirador

Se 1954 foi de pouco sono e muito trabalho para Robert Aldrich, 1955 foi o estopim para o sucesso fora do território americano. Vera Cruz agradou e deixou cinéfilos atentos ao próximo lançamentos do diretor, que fez jus a espera. A Morte Num Beijo tem sua importância não apenas para o filme noir, mas para o cinema como um todo naquela metade dos anos 50. Se era algo novo para as telas que conheciam bem as sombras e os becos escuros, imagine para uma garotada francesa descobrindo a paixão pela Sétima Arte. Tantos jovens cineastas bebem sem pausa na Nouvelle Vague e esquecem da fonte poderosa que é o cinema de Aldrich. Ao contrário de uma parcela da nossa juventude dada a produzir audiovisual, ele nunca se deu por satisfeito com seus acertos cinematográficos.

Seria compreensível que intercalasse, a partir de A Morte Num Beijo, noir e faroeste, sempre apostando no tempero que fez as salas de exibição lotarem até então. Mas estamos falando de uma alma inquieta que se arriscou no melodrama com Folhas Mortas, filmes de guerra cercados de mistério como Colina da Ira ou violentos e belos como Os Doze Condenados. Tocou em temas tabus em Sodoma e Gomorra e no ótimo Triângulo Feminino, que ele afirmava ser seu trabalho preferido. Fez rir sem deixar de lado o sarcasmo nas comédias O Rabino e o Pistoleiro e Garotas Duras na Queda. Ufa! E tudo isso pode ser apenas o começo. Seus curtas e alguns trabalhos não creditados merecem ser redescobertos.

Perto das dedicadas à Bergman, as homenagens ao centenário de Robert Aldrich parecem discretas. Algo que parece combinar com alguém que afirmava não saber fazer outra coisa a não ser filmes e nunca fez questão de ter seu nome em destaque nos créditos. O que importava eram as histórias. Não interessava o gênero. Ele fez suas pequenas revoluções sem alardes, sem fazer disso sua razão de trabalho. Seu desejo nunca era o mesmo. Os desafios de sua carreira foram impostos por ele mesmo.

Fazer cinema era com Aldrich. Só nos resta aprender com ele ou, simplesmente, admirar sua obra. O que já é um presente e tanto.

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