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Desarmados – O polêmico tema do desarmamento!

O documentário Desarmados aborda um dos assuntos mais importantes da atualidade

Com o atual cenário político brasileiro, dificilmente o documentário Desarmados passará despercebido. Realizado em uma época em que a questão da segurança pública nunca foi tão relevante, um longa que se propõe a apresentar e discutir o tema do desarmamento nos revela uma coragem por parte dos seus responsáveis que é raramente vista em terras tupiniquins.

Didático, mas com momentos surpreendentemente poéticos, e tendo como linha mestra os comentários de Bene Barbosa, um dos maiores especialistas sobre o assunto, Desarmados é uma excelente oportunidade de entrar em contato com informações e dados que não só enriquecem a discussão, como também a tornam mais objetiva, o que, felizmente, afasta a produção das posições e dos discursos emotivos.

Leia a entrevista com Lion Andreassa, diretor do documentário Desarmados.

Desarmados

Longe de ser uma apologia às armas, mas centrado na constitucionalidade da legítima defesa e na importância das armas de fogo como ferramenta para exercê-la, o produtor do filme montou sua equipe com profissionais cujos pensamentos refletem opiniões dos dois lados do espectro político para que qualquer paixão (contra ou a favor) fosse posta de lado.

O filme tem como único objetivo o de fazer um relato simples e informativo sobre um dos assuntos mais importantes e discutidos da atualidade. Independentemente da opinião defendida pelo espectador, ao término da sessão, ele sairá com a certeza de que o seu referencial imaginário foi deveras alimentado e enriquecido.

Para reforçar essa posição, o financiamento da obra partiu dos próprios responsáveis e de uma quantia reunida através de crowdfunding, justamente para evitar que o auxílio financeiro de empresas armamentistas pudesse sugerir ao público um caráter panfletário ou propagandístico.

No entanto, ainda assim, o documentário não está tendo vida fácil. Mesmo que os seus objetivos sejam claros e as intenções, honestas, os realizadores têm encontrado dificuldades em fazer com que a produção estreie no circuito comercial do país. A explicação por detrás das negativas é a de que o assunto é muito polêmico.

O Formiga Elétrica, com exclusividade, assistiu ao documentário e entrevistou o diretor geral e produtor do projeto, Lion Andreassa. Na conversa, foram abordados vários assuntos. O resultado desse bate papo pode ser conferido pelo leitor logo abaixo:

Leia a entrevista com Lion Andreassa, diretor do documentário Desarmados.

Lion Andreassa, diretor e produtor do documentário Desarmados.

Entrevista com Lion Andreassa

Formiga Elétrica: Como surgiu o documentário Desarmados?

Lion Andreassa: Foi em 2015, quando, vendo o aumento da violência e acompanhando a discussão sobre o desarmamento, a ideia de fazer um filme que abordasse o assunto acabou surgindo para mim. Quando fui pesquisar sobre o tema, vi que só existiam documentários contrários à posse de armas de fogo e nenhum que mostrasse a importância da arma como instrumento de autodefesa. Como eu conhecia o Bene Barbosa desde 2013, sugeri a ele que fizéssemos algo que pudesse mostrar o outro lado da moeda. Durante meses, nós conversamos sobre o projeto. Porém, foi só na época em que a discussão sobre o impeachment esquentou que nós decidimos que aquele era o melhor momento para ele ser realizado.

 

FE: Qual foi a maior preocupação durante a realização do documentário?

LA: A maior preocupação foi a de levar à sociedade todas as informações e argumentos daqueles que são a favor das armas, o que até então nunca havia sido feito com profundidade. Afinal, uma democracia só é plena quando os dois lados da moeda são apresentados às pessoas para que elas possam decidir o seu futuro. Além disso, a nossa meta era fazer um documentário extremamente sensato. Pensando nisso, é que coloquei pessoas aliadas ao pensamento de esquerda no projeto, justamente para fazer o contraponto e evitar qualquer apologia às armas. Afinal, se existe ideologia de um lado, pode muito bem existir do outro. Há ideologias tanto de esquerda quanto de direita. E era exatamente esse tipo de postura que nós queríamos evitar. Tudo o que fizemos foi expor fatos, números e argumentos que pudessem ser vistos não só por aqueles que concordam com o fim do desarmamento, como por aqueles que discordam.

 

FE: O cineasta Michael Cimino costumava dizer que todo filme sobre a guerra é um filme anti guerra. Você diria que todo filme sobre o desarmamento é um filme anti desarmamento?

LA: Eu, particularmente, sou contra o desarmamento. Acho que a maioria dos fatos reforçam a minha posição. Porém, sei que isso, sozinho, não acabará com a violência no país. Juntamente com o desarmamento, há a necessidade de que a educação e cultura do nosso país melhorem. Mas isso não virá rapidamente. Essas transformações só ocorrem a longo prazo. Para que as coisas progridam, é preciso um conjunto de fatores.

 

FE: Caso ocorra o fim do desarmamento, há a necessidade da inclusão de uma cultura sobre as armas no país?

LA: Com certeza! As pessoas precisam entender que a arma não é a culpada pelos crimes e sim os sujeitos que a usam para perpetrá-los. Se o estatuto do desarmamento for derrubado, é preciso que seja feito, através da cultura, todo um trabalho de adaptação do povo brasileiro a essa nova realidade. As pessoas não podem ficar mais assustadas ao lado de armas. Há a necessidade de que elas compreendam o seu funcionamento e saibam como usá-las. Assim como para dirigir um carro, deve existir um treinamento para o uso de armas de fogo.

Leia a entrevista com Lion Andreassa, diretor do documentário Desarmados.

Bene Barbosa (à esquerda) e o ator Taiguara Nazareth.

FE: Como foi o processo de financiamento?

LA: Eu considerei a possibilidade de usar as leis de incentivo. Até acho que o nosso projeto seria aprovado. No entanto, era quase impossível que conseguíssemos patrocínio. Não é qualquer marca que gostaria de patrocinar um documentário sobre violência, posse de armas e segurança pública. Provavelmente, só obteríamos patrocínio de empresas da indústria armamentista. Porém, se nós obtivéssemos a ajuda dessas empresas, talvez a independência intelectual e artística do projeto pudesse ser colocada em xeque. A mídia, em geral, poderia argumentar que nós fizemos um filme de propaganda. Depois, pensamos em obter patrocínio de clubes de tiro, mas achamos que isso poderia também ser usado contra nós. Por fim, consideramos o crowdfunding. E foi através disso, além do dinheiro que nós mesmos investimos, que conseguimos realizá-lo.

 

FE: O crowdfunding é o futuro do financiamento de audiovisual?

LA: Acho que não. Se o assunto de um filme interessar à população e a obra for bem realizada, as pessoas continuarão a ajudar. Porém, assim que as coisas começarem a ser mal produzidas, esse tipo de financiamento começa a ruir. Acho que é uma maneira viável de trazer à vida certos projetos, mas não considero esse modelo como o grande salvador dos filmes feitos no país.

 

FE: Quais são as suas posições sobre o financiamento de filmes no Brasil?

LA: Acho que a situação atual, envolvendo editais e leis de incentivo, é necessária. Idealmente, o melhor modelo seria aquele usado nos Estados Unidos, em que um produtor, investidor ou estúdio banca o projeto e obtém lucro com isso. Trocando em miúdos, o ideal seria que existisse no país uma indústria que se alimentasse de si mesma. Isso evitaria a burocracia na qual nos encontramos atualmente. Porém, aqui nós não temos os mesmos números de faturamento vistos nos EUA. Afinal, lá eles têm grandes astros, ações gigantescas de marketing, o filme é em inglês, a distribuição ocorre no mundo inteiro. Nós ainda estamos aprendendo a fazer essas coisas. Por enquanto, estamos engatinhando. Muitos dos nossos temas são regionais, e isso acaba atrapalhando o escoamento das nossas produções. Portanto, vendo essa situação, para que continuemos produzindo filmes, os editais e as leis de incentivo são necessários.

Leia a entrevista com Lion Andreassa, diretor do documentário Desarmados.

FE: No entanto, por mais que  sejam necessários atualmente, as leis de incentivo e editais não acabam cortando a raiz de qualquer tentativa de se iniciar uma indústria cinematográfica no país?

LA: O problema é que as pessoas ficam viciadas no modelo atual de financiamento. Porém, para iniciar um modelo de negócio parecido com o dos Estados Unidos, é preciso que o Estado facilite, através da diminuição de impostos, o surgimento de novas empresas, estúdios e produtoras. Por exemplo: hoje em dia, o cinema é muito caro. As pessoas gastam muito dinheiro para a assistir a um filme. Frente a isso, o público prefere ver uma obra norte americana em vez de uma nacional. Agora, se a situação econômica do país fosse melhor, talvez as pessoas fossem mais aos cinemas para assistir aos filmes produzidos no nosso país.

 

FE: Alguma consideração final sobre os temas discutidos aqui?

LA: Só quero dizer que as situações são complexas. O desarmamento é um tema complexo, assim como a questão do financiamento. As leis de incentivo e os editais são necessários atualmente, porém alguns dos seus elementos precisam ser alterados. Uma das coisas que precisam sofrer mudanças é o fato de que a contemplação ocorre sempre para as mesmas pessoas. Isso faz com que o surgimento de novos talentos seja limado. Já sobre o tema do desarmamento, acho que expusemos toda a complexidade da situação no nosso documentário. É assistir para conferir.

Observações

O documentário Desarmados ainda não tem data de estreia, mas Lion Andreassa afirmou que estão negociando com várias salas de cinema. Dias antes da estreia, seja no circuito de cinemas, plataformas on demand ou TV, o Formiga Elétrica publicará uma crítica detalhada dos aspectos temáticos e técnicos da obra. Para aqueles que desejam acompanhar as atualizações e obter mais informações sobre o projeto, é só acessar a página do documentário no Facebook.

Não deixem de conferi-lo!

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