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Cinco filmes feministas (de verdade) e um bônus!

Os verdadeiros filmes feministas

Está na moda, nas propagandas de shampoo, na mesa do bar. A palavra feminismo parece ter se tornado não apenas a pauta do dia para estudiosos do tema, mas uma ótima estratégia para aumentar a venda de produtos e a audiência de programas que se propõem a passar uma ideia de liberdade. Será? (Calma, já chegaremos aos filmes feministas…)

Por mais que não tenhamos mais exclusivamente modelos magérrimas e loiras vendendo de pasta de dente à calcinha, ainda existe uma ditadura do que é certo e do que é errado. Existe padrão até para o diferente. As marcas ditas plus size nem sempre abrangem todos os manequins acima do 46 e mesmo o mais revolucionário dos cremes ainda promete juventude eterna, já que assumir as rugas é cool…mas só até a página dois.

No cinema, a simples proposta de uma protagonista mulher, ou mesmo de um elenco majoritariamente feminino, parece bastar para que alguns imprimam o rótulo de “feminista” em um filme. Prezados leitores, esta atitude pode parecer muito moderna (só para lembrar que o feminismo existe desde a Revolução Industrial, ou seja, moderno ele já foi um dia, mas continua soando como atitude rebelde), mas não passa de uma desculpa.

Lista - Filmes Feministas

Os verdadeiros filmes feministas que integram nossa lista!

Ter mulheres em um filme não significa que ele reflete as causas feministas, muito menos que agrade o público feminino. Jessica Jones é uma personagem ótima, mas quer coisa mais clichê machista que sua adaptação produzida pela Netflix? A Furiosa de Mad Max soprou uma leve brisa de inovação na franquia, mas ainda precisa ler muita Angela Davis, Judith Butler, Simone de Beauvior e Betty Friedan para encontrar seu verdadeiro caminho.

Ah, e sabem aquelas comédias adolescentes onde a menina mais popular humilha uma colega e esta dá a volta por cima e se vinga de todos que fizeram chacota dela? Isto também não faz parte de qualquer lista de filmes feministas, já que um dos preceitos para acabar com o patriarcado e garantir a igualdade chama-se sororidade. Está nos (em alguns, na verdade) dicionários: a união e aliança entre mulheres, baseado na empatia. Não somos inimigas nem nos arrumamos para causar inveja umas nas outras. Estamos todas na mesma canoa furada que ainda dita regras de comportamento, vestimenta e até sentimentais.

Afinal, devemos ser todas delicadas e maternais. Mas não somos, e isso não é nenhum pecado. É só uma coisa complexa chamada ser humano, que tentam nos convencer que são todos iguais. Para que as cinéfilas (e cinéfilos também, já que a verdadeira feminista não tem raiva de homem, mas quer que eles participem do diálogo) não fiquem confusos na hora de se divertir sem esquecer a luta por direitos iguais, preparamos uma lista de 5 filmes feministas. Mas feministas MESMO!

1 – Thelma e Louise (Idem, 1991) Dir. Ridley Scott

A lista de buddy movies (aqueles protagonizados por duplas de amigos em que um é o oposto do outro) é grande, especialmente no cinema americano. Muitos roteiros se resumem a dois caras cansados das próprias rotinas que saem pelo mundo em busca de diversão. A coisa muda de figura quando duas mulheres é que topam uma parada dessas. Conforme manda a sociedade patriarcal, devemos pensar primeiro nos filhos, depois no marido, depois no chefe, um pouquinho nos vizinhos para então prestarmos atenção em nossas vontades.

As amigas Thelma e Louise rompem estes estereótipos ao não pisarem no freio, cada uma ao seu modo, diante de uma nova possibilidade de vida. Elas cansaram de seus relacionamentos frustrados e dos dias que parecem iguais. E o são. Mudar de paisagem, mudar de lugar. Mas elas continuam as mesmas. A diferença é que o desejo guardado agora se mostra sem medo. Com roteiro inteligente, diálogos inesquecíveis e a força de duas atrizes poderosas, Susan Sarandon e Geena Davis, o filme de Scott é um hino feminista que discute temas como estupro, relacionamento abusivo e sororidade, sem deixar de lado o cinema ou levantar bandeiras. Um filme de fotografia exuberante (como esquecer a estrada e as pradarias que parecem levar a lugar nenhum, mas oferecem um mundo novo as duas garotas?) que diverte e faz pensar sobre assuntos importantes. E não são assim as grandes obras da humanidade?

 

2 – O Piano (The Piano, 1993) Dir. Jane Campion

Uma das melhores produções da década de 1990, o filme tem na direção de atores de Campion uma das qualidades que o tornam atemporal. A fotografia em tons frios não é apenas um retrato da paisagem neozelandesa no seu período de colonização. É um reflexo da alma de sua protagonista, Ada McGrath, interpretada pela maravilhosa Holly Hunter, vencedora do Oscar de Melhor Atriz. Muda, com uma filha pequena e um novo marido que, não bastasse ser um completo estranho, ainda a priva de sua maior paixão: o piano.

Grande demais para a nova morada do casal, o instrumento é vendido para George Baines (um inspirado Harvey Keitel) que está menos interessado em notas musicais e mais nos belos olhos de Ada. As teclas brancas e pretas são um pretexto para encontros que dão novo brilho ao cotidiano dos dois. Mas, ao contrário dos contos de fada, onde quem salva a mocinha de uma vida medíocre é um homem, a salvação vem da própria Ada, que descobre sua força interior. Agora ela sabe que um piano é pouco, perto do que ela é capaz de carregar.

 

3 – Uma Mulher Sob Influência (A Woman Under The Influence, 1974) Dir. John Cassavetes

A atriz Gena Rowlands era casada com o diretor John Cassavetes. Isso é o que dizem os livros e as revistas da época. Basta uma olhada nos trabalhos que ambos realizaram juntos para perceber que Gena traz para as criações de Cassavetes toda a sua alma e o cineasta, não se sabe se por acaso ou preferência, deixa que ela tome conta de seus filmes. Há muito de Gena em Mabel, protagonista neste filme que possui, sem dúvida nenhuma, a melhor atuação feminina do cinema.

Entra ano, sai ano, novas atrizes talentosas surgem mas ninguém atinge o nível de Mrs. Rowlands. Seja na imitação da coreografia do balé O Lago dos Cisnes ou na conversa franca com os filhos pequenos sobre sua incapacidade de entender a maternidade, Mabel conquista o espectador por ser tão teatral que parece…verdadeira. Suas crises, seus tiques, suas reações diante do tumulto que é ser uma dona de casa suburbana com três crianças para criar é tudo que queríamos ser, mas as regras de comportamento nos impedem de fazer. Thierry Jousse, um dos estudiosos da obra do diretor americano, diz que o cinema de Cassavetes reflete o momento em que a vida se transforma em teatro. E quantas de nós não interpretam dia e noite para seguirem em frente sem serem incomodadas?  Mabel é que é feliz: é ela mesma quando todos pensam que ela está interpretando.

 

4 – Laços de Ternura (Terms of Endearment, 1983) Dir. James L. Brooks

Mãe e filha. Uma relação cheia de camadas que costuma funcionar muito bem na tela grande. Mas muito antes de Lady Bird movimentar os críticos e a corrida do Oscar, de onde saiu de mãos abanando, Brooks usou seu talento para comédias agridoces e criou uma das duplas familiares mais verdadeiras daquela caricata década de 80. Debra Winger, uma então jovem atriz, se uniu à veterana Shirley MacLaine numa história sobre mulheres que se descobrem em épocas distintas da vida, mas ambas de forma intensa.

A impulsiva Emma tem um filho atrás do outro e encara a traição do marido como um sinal de que deve buscar novos ares. Aurora encarou a viuvez como estilo de vida mas enxerga no novo vizinho a possibilidade de experimentar os outros sabores que a vida tem. Telefonemas intermináveis, brigas homéricas e reconciliações banhadas em lágrimas. Ser mãe e ser filha parecem coisas distantes, mas no fundo são apenas duas mulheres crescendo juntas. Quem pensa que difícil é trocar fralda, deveria observar a fúria que é a transformação de uma menina em mulher. Pior que o peito que cresce, só a confusão de ter dois cromossomos x num mundo onde ser homem é vantagem.

5 – Bagdad Café (Out of Rosenheim, 1987) Dir. Percy Adlon

Quer melhor metáfora para a descoberta que um deserto? Na aridez americana, surge um oásis que vai mudar a vida de duas mulheres, assim como a paisagem que a cercam. Jasmin, vivida por Marianne Sägebrecht, é uma turista alemã que, no meio de uma viagem pelo Deserto de Mojave, briga com o marido e o abandona no meio da estrada. Sem explicações, sem remorso. Depois de uma caminhada no qual ela se livra dos outros pesos de sua vida (a roupa apertada, os sapatos bonitos mas insuportáveis), Jasmin chega ao Bagdad Café, misto de motel de beira de estrada com restaurante comandado por Brenda, interpretada por CCH Pounder, dona de um poderoso mau-humor que atormenta não só seus poucos clientes como também seus filhos. A vivacidade de Jasmin, agora livre do marido e da criação opressora alemã, vai contaminar Brenda aos poucos para logo o brilho no olho ser refletido nas mesas novas do agora movimentado e divertido Bagdad Café.

Além do apoio mútuo entre mulheres, o filme também rompe a ideia do relacionamento como cereja do bolo da felicidade. Jack Palance surge em cena na pele de um pintor andarilho, bem distante dos vilões dos faroestes que costumava interpretar, para ser o novo amor de Jasmin. Só que ele quer casar como manda o figurino e ela só quer amar, sem regras ou cerimônias. Tom Jobim cantou que era impossível ser feliz sozinho. Bateu na trave. É impossível não dividir felicidade. Mulheres não precisam de homem, nem mulher, nem os dois (pois não somos apenas heteronormativas como nas propagandas que empurram flores e bombons na nossa goela abaixo no dia 8 de março) para nos sentirmos completas. A gente precisa da gente mesmo, sem máscaras. Aí sim, vamos ver se o destino reserva alguém. Ou mais de um alguém.

BÔNUS: A Número Um (Numéro Une, 2017) Dir. Tonie Marshall 

Pelos anos dos filmes relacionados, alguém pode pensar que não se faz mais filmes feministas. Não é verdade! A estreia nos cinemas mais feminista deste 8 de março de 2018 é esta produção francesa sobre as mulheres do mundo coorporativo e a guerra diária que é sobreviver na selva dos negócios. Roteiro inteligente, direção afiada e elenco talentoso garantem mais que diversão neste caso. Emmanuelle, a protagonista interpretada por Emmanuelle Devos, vai passar por uma transformação pessoal e profissional ao descobrir que é possível ser uma grande executiva sem esquecer de ser mulher.

E sobre “ser mulher” não estamos falando de batom e vestido, mas de dedicação, força e olhar certeiro. Não é a sedução a nossa arma, mas a resistência. A gente verga, mas não quebra. Mesmo oprimidas, inclusive por outras mulheres, nos mantemos indomáveis. Somos mulheres. Somos a revolução.

 

Curtiu nossa lista de filmes feministas? Incluiria mais algum? Sobre feminismo, confira também nossos artigos sobre Sandman – Teatro do Mistério e o filme Mãe!, de Darren Aronofsky.

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