Que já faz um tempo que a TV norte-americana e britânica anda mais ousada que o cinema, não é novidade para ninguém. Ainda assim, mesmo em um ambiente mais livre, o objetivo final de qualquer indústria é o lucro, e embora séries não custem tanto quanto um blockbuster de Hollywood, ainda existe a cobrança por um resultado financeiro satisfatório que vez por outra acaba comprometendo a obra. É só lembrar que algumas boas séries da HBO, como Deadwood e Carnivale, que encerraram sua produção com a história inacabada, e Roma, que teve um final apressado e insatisfatório. Há também os casos em que obviamente acabou o assunto, mas uma boa audiência faz a série continuar. De qualquer jeito, a média qualitativa dos seriados dos EUA e da Inglaterra continua bem alta, e uma boa pergunta hoje é o que essa mídia vai fazer a seguir no quesito inovação, seja na abordagem ou na forma de produção e veiculação do produto final. O Netflix hoje nos dá uma boa ideia do que pode vir a ser esse futuro, mas não muito tempo atrás algumas pessoas deram passos diferentes. Como é o caso de Pionner One!
Falando em inovação, como hoje a tendência do financiamento coletivo, o crowdfunding, se mostra cada vez mais forte em produções culturais ao redor do mundo, nada mais oportuno do que citar uma iniciativa que no ano de 2010 já tentava emplacar esse padrão de outro modo. Pioneer One é uma série que foi distribuída online gratuitamente através de torrents, que podiam ser baixados em sua página oficial, com seus custos cobertos por doações através do site VODO (VOluntary DOnation) e pela venda de artigos relacionados. Até legendas em diversas línguas eram disponibilizadas por lá. Foi um projeto pequeno em termos de valores, pois o episódio piloto custou apenas U$ 6.000,00, mas o que faltava em condições técnicas acabou compensado pela ambiciosa premissa do roteiro.
Pionner One é um seriado de ficção científica, mais precisamente daquele subgênero que engloba conspiração e investigação governamental. Nada a ver com Arquivo X, pois Pionner One segue um mesmo arco dramático que vai desenvolvendo-se a cada episódio, acompanhando a trajetória de agentes da Segurança Nacional tendo que lidar com um estranho objeto não-identificado que cai no Estado de Montana. Pela quantidade de material radioativo espalhado na área, suspeita-se de ataque terrorista. Quando o agente encarregado chega à base, é informado que um jovem encontrado no interior do tal objeto está sob custódia. A coisa se complica ao identificarem que aquilo que o rapaz tripulava era uma Soyuz, um tipo de módulo espacial da antiga União Soviética. Sem entregar muito da trama, o ponto que se estabelece como o “mistério” da série é o fato de que pelo registro da nave, tudo aquilo é parte de uma missão tripulada a Marte durante a Guerra Fria. Assim está construído um interessante pano de fundo.
Conforme já ficou óbvio a essa altura do texto, seria impossível que Pionner One fosse um primor nos aspectos visuais. A pobreza da produção é evidente nos planos fechados e na penumbra que escondem a falta de cenário, em alguns movimentos tremidos de câmera e nas atuações que nunca chegam a convencer de verdade, mas por mais que isso pareça um exercício de boa-vontade, é preciso abstrair essas limitações e tentar embarcar na história. Um ponto positivo é que os seis episódios desta primeira temporada tem apenas cerca de meia hora, evitando tornar-se uma experiência cansativa. Raciocinando bem, quantos seriados por aí não enfiam 22 episódios por temporada na goela do espectador, porém sem investir muito numa boa história?
Grandes ideias numa produção ousada na premissa, na captação de recursos e distribuição. Com seu site hoje fora do ar, infelizmente a continuidade em uma segunda temporada é bastante improvável. Sem dúvida foi algo pioneiro e talvez seu formato de produção revele-se uma alternativa viável no futuro, com produtos melhor acabados. Apesar de tudo, o canal da série no Youtube continua no ar com as legendas em português. “Sim, a primeira temporada acaba em aberto” antes que alguém pergunte. “Não sei” é a resposta para alguém que questionou porque deveria perder seu tempo com algo inacabado e pobre visualmente. Só posso recomendar o que fizeram Josh Bernhard e Bracey Smith, criadores de Pioneer One: Arrisque-se!