(Bruce Timm também foi tema de um FORMIGA NA TELA!)
Se existe algo com que a Distinta Concorrente da Marvel pode se gabar em cima da rival, é quanto à indiscutível qualidade das animações com seus personagens, seja em séries ou longas para o mercado de home video. Essa supremacia começou em 1992, com a estreia de Batman – The Animated Series, que trazia um estilo visual que na época era pouco comum a super-heróis e até gerava um certo estranhamento inicial, porém, era preciso assistir apenas a um episódio para que essa sensação desse lugar à certeza de que ali havia algo muito especial. Sucesso de público e crítica, a série foi responsável por definir tanto uma marca estilística quanto um padrão geral de qualidade para as animações que a Warner produziria com os personagens da DC, e o cérebro por trás dessa revolução responde pelo nome de Bruce Timm.
Bruce Walter Timm nasceu em 1961 e já era um veterano no ramo da animação no início da década de 90. Trabalhou na famosa produtora Filmation em 1981, como artista de lay out em séries como Blackstar e The Kid Super Power Hour with Shazam! – um segmento em que o Capitão Marvel dividia o horário com outra animação chamada Hero High. Ambos os trabalhos tiveram breves e pouco lembradas passagens pela TV brasileira. Um ano depois, ocupou o cargo de animador assistente no longa-metragem A Ratinha Valente, de Don Bluth, para logo em seguida voltar à Filmation e trabalhar mais dois anos com as séries He-Man e She-ra, novamente como artista de lay-out e designer de personagens respectivamente. Pelos anos seguintes, manteve-se nas mesmas funções em séries de outros estúdios, como Comandos em Ação e Os Caça-Fantasmas, além do videogame Dragon’s Lair II – Timewarp. Na virada da década, o passo decisivo na carreira é dado quando vai para a Warner trabalhar na série Tiny Toon, por pouco tempo, é claro.
Ao lado do produtor Alan Burnett e do roteirista Paul Dini, aproveitando uma onda de bat-mania desencadeada pelo filme de Tim Burton – que ganhava sua continuação naquele mesmo ano – Timm apresenta sua nova versão do Batman para a TV, valendo-se de suas várias referências como artista, tais como os desenhistas Jack Kirby, Harvey Kurtzman e Alex Toth. Ambientando o personagem numa Gotham City Art Deco, escancarou a homenagem à lendária animação do Superman dos estúdios Fleischer, da década de 40, pioneira na técnica da rotoscopia, em que atores eram filmados em movimento, os fotogramas impressos e os traços da animação feitos por cima. Além da referência visual clássica, existe a vantagem de que um traço estilizado e com poucos detalhes facilita a animação do personagem, trazendo mais movimento e ação ao resultado final. O design de Gotham e do Batmóvel foram evidentemente calcados no trabalho de Anton Furst, designer do filme de Burton, cuja trilha sonora de Danny Elfman também foi emulada para o desenho pela compositora Shirley Walker. Aqui no Brasil, numa época pré-internet em que tudo chegava muito depois, o primeiro contato com a nova série foi através de fotos em revistas especializadas, sendo que ela já era exibida nos EUA há meses. Matando um pouco a curiosidade e aumentando a ansiedade dos fãs, em meados de 1993, o programa dominical sobre cultura pop Top Tv, da Rede Record, exibiu em um de seus blocos a sequencia de abertura da animação. Gaste um minuto assistindo ao vídeo abaixo e pense no impacto naquela época e circunstância.
Os roteiros privilegiavam a ação, porém, sem esquecer-se de construir personagens e conduzir uma história. O sucesso foi tanto que em 1993, um longa-metragem animado dentro do universo da série- Batman – A Máscara do Fantasma- é produzido e lançado nos cinemas. Segundo o Imdb, inicialmente o longa iria direto para home video, inaugurando a prática que dura até hoje, mas no fim da produção o estúdio mudou de ideia lançando-o nos cinemas. Foi um fracasso comercial, mas para muitos, até aquele momento, era o Batman definitivo e a melhor coisa feita com o personagem fora das Hq’s. A influência e alcance desta série são tão grandes que a personagem Arlequina, criada por Paul Dini e Bruce Timm para a TV, acabou migrando para as Hq’s tradicionais do Batman, e permanece até hoje no primeiro escalão da galeria de vilões.
Apostando numa fórmula vencedora, a Warner dá sinal verde para um novo projeto televisivo. Já como produtor respeitado em 1996, Timm arrisca-se ao trabalhar com um personagem que vários autores se queixam até hoje quanto à dificuldade de torna-lo relevante, e assim começa Superman Animated. Mesmo mantendo-se no estilo da sua predecessora, o traço é mais leve e próximo ao do quadrinhista espanhol Daniel Torres. Com uma ambientação menos sombria e mais fantasiosa como cabe ao personagem, nem por isso a abordagem foi infantilizada, pelo contrário. O drama de algumas situações era bem trabalhado e mostrou até mesmo uma morte explícita e irreversível, coisa impensável poucos anos antes em Batman. Foi nesta série, e mais especificamente em um episódio duplo – Apokolips Now – que Bruce Timm pôde deixar mais evidente sua influência e admiração por Jack Kirby. Teve apenas 54 episódios, mas graças á sua estrutura de seriado melhor trabalhada, Superman Animated acabou ganhando uma oportuna continuidade na série Liga da Justiça, desenvolvida anos depois.
A partir daí, entre os encargos de produtor ou do departamento de animação, às vezes ambos, Bruce Timm emplacou as séries Batman do Futuro, Jovens Titãs (num traço mais juvenil remetendo aos animes), a já citada Liga da Justiça, cujo desdobramento em Liga Da Justiça Sem Limites expandiu o universo DC na telinha, e Lanterna Verde, produzida em 3D. Nos longas, Batman do Futuro – O Retorno do Coringa, A morte do Superman, Lanterna Verde – Primeiro Vôo, Mulher Maravilha e adaptações diretas de sagas fechadas dos quadrinhos, como Liga da Justiça – A Nova Fronteira, Grandes Astros: Superman, Batman: Ano Um e Batman – O Cavaleiro das Trevas partes 1 e 2, entre outros. Sua trajetória profissional envolvendo o homem-morcego ainda se estende em participações nos videogames Lego Batman 2 e Arkham City.
Não bastando tudo isso, ele ainda fez grandes trabalhos nos quadrinhos como desenhista, sempre no estilo que o consagrou. Em 1994 ilustrou Mad Love, uma Hq do Batman, depois adaptada como um episódio homônimo da segunda fase da série animada, intitulada The New Batman Adventures. Escrito por Paul Dini e bastante premiado, o álbum foi lançado no Brasil em 2002 pela Opera Graphica como “Batman – Louco Amor”. Em 1999, Red Romance, escrita por Joe Lansdale, para a revista da linha Vertigo, Flinch. A história curta foi publicada no Brasil em 2007, pela Pixel Media em sua revista mix Pixel Magazine nº 5, com o título de “Romance em Vermelho”. Como suas séries na TV acabavam por gerar séries em quadrinhos na mesma pegada visual e independentes do universo DC tradicional, nada mais natural que também tenha desenhado ocasionalmente várias histórias desses títulos.
Contando com um currículo vitorioso como esse, a notícia de seu afastamento do departamento de animação da DC neste ano pegou todos os fãs de surpresa. As únicas declarações dizem que é algo voluntário e temporário, sendo que uma volta já estaria sendo preparada. Depois da reformulação editorial que culminou na linha Novos 52 em 2011, as decisões tomadas parecem indicar uma padronização dos estilos artísticos adotados nos personagens, logo, é normal supor que o setor seja afetado, já que seguiu um caminho independente e com certa liberdade até aqui. Quaisquer comentários sobre o que isso significa e o que acontecerá a partir de agora é mera especulação, mas parece contrariar bastante a lógica de que não se mexe em time que está ganhando. Sua última grande contribuição a esse universo foi o trabalho ao lado do diretor Zack Snyder no curta comemorativo do Superman, que completou 75 anos em 2013.
De qualquer forma, trabalhando na Warner ou não, o legado televisivo e o valor como artista de Bruce Timm é inquestionável. É certo que ainda ouviremos falar muito dele, então, por ora, só nos resta viajar pelos traços estilizados DESTA GALERIA.