A metralhadora giratória da Panini continua disparando e lançou sobre nós agora o exótico volume Bucky Barnes: Soldado Invernal – O Homem na Muralha. O volume vem em capa cartonada, 116 páginas e um preço razoável de 19,90 R$. Com o tanto de coisa que a editora vem lançando no Brasil, o amigo leitor sempre quer saber antes de tudo: vale a pena? E essa pergunta sempre respondemos com um controle de expectativas: depende do que você curte em uma HQ.
O volume em si é bem sucinto. A exemplo de outras séries da Nova Marvel que não couberam nos mix mensais, como ambos os volumes de Ms. Marvel, a série do spin-of favorito de Capitão América dos últimos tempos tem as suas cinco primeiras edições compiladas aqui. Nós acompanhamos Bucky após os eventos descritos na saga Pecado Original, quando ele substitui um idoso Nick Fury (em uma salada de continuidade que beira o incompreensível) no que ficou conhecido como muralha – uma espécie de última linha de defesa da Terra, instalada para impedir ameaças à Terra alheias até mesmo aos Vingadores e ao Quarteto Fantástico. Porque o amigo leitor sabe – para as grandes, maior deve ser sempre melhor…
Fato é que Fury deixa a vaga, e como ela é absolutamente necessária e somente combina com queles com sangue frio o bastante para fazer o que é preciso, quando é preciso, Barnes parece o homem ideal para o serviço. Mas na trama, ele decide seguir uma linha diferente do seu antecessor e, ao invés de agir de forma oculta e isolada, Barnes decide estabelecer alianças para melhor realizar seus trabalhos. A primeira delas é com Daisy Johnson, ex-diretora da Shield e alguém que “sabe das coisas”. A partir daí, Barnes retoma a “lista de tarefas” de Fury, em que busca realizar ações defensivas para impedir que potenciais ameaças ao nosso planetinha sequer venham a existir. Daí para frente, o Soldado Invernal se envolve em um conjunto de aventuras bastante exóticas e inesperadas para um personagem que veio da galeria mais “pé no chão” da Marvel, envolvendo Asgard, aventuras cósmicas e por aí vai.
É um volume muito distinto, e um pouco surpreendente, no sentido de que realmente é uma linha narrativa inesperada para o personagem. Quem conferiu o outro volume do personagem publicado aqui há pouco tempo, Marcha da Amargura, vai encontrar algo tão distinto que sequer parece que trabalha com o mesmo personagem. A escolha do nome para capitanear essa nova série, entretanto, já nos canta um pouco a bola de como seria essa proposta. Ales Kot, jovem escritor tcheco, ganhou notoriedade internacional trabalhando para a Image, publicando séries interessantes como Wild Children e Zero, que demonstram o potencial do roteirista para bizarrices. Entretanto, seus trabalhos para a Marvel parecem tê-lo colocado na coleira, e esse potencial fica bastante limitados as bobagens de continuidade da editora, como a série Vingadores Secretos – muito ruim, por sinal.
Era de se imaginar que a série do Soldado Invernal permanecesse nesse plano medíocre. Nem tanto. Sendo o homem da Muralha, as aventuras de Barnes acontecem paralelamente aos grandes eventos do universo da casa, dando ao escritor uma liberdade considerável para fazer o trabalho pelo qual ficou conhecido. E, gostando o amigo leitor ou não, algo temos que admitir – esse volume certamente não é uma coisa que se vê todo dia. Embora a ideia principal da trama pareça mais do mesmo, envolvendo Shield, Asgard, blá blá blá, a sua execução é um interessante exercício narrativo. A construção e diagramação dos quadros são muito diferentes do habitual, denunciando as muitas influências europeias do roteiro de Kot. Ele claramente pensa, quando tem essa liberdade, nos quadrinhos de maneira muito diferente dos americanos para os quais trabalha. Frisamos – não se trata de nenhuma obra-prima. Mas, quando se fala HQ’s de super-heróis mensais e continuidade, qualquer ponto fora da curva já chama a atenção. Para bem ou para mal.
A arte de Marco Rudy acompanha o mesmo caminho, mas a referência é outra. Quando se fala de HQ, a não ser que já sejam autores rodados e comprovados, nunca dá para saber até onde vai o dedo do roteirista e onde começa o do desenhista, e vice-versa. Mas aqui vamos dar um passo ousado, e dizer que Rudy se inspirou em uma boa fonte. Porque lendo O Homem na Muralha, a psicodelia e a transição exótica dos quadros, dando uma fluidez narrativa interessante para a HQ, lembram imediatamente – guardadas as devidas proporções – o clássico Nick Fury: Agente da Shield, do magnífico Jim Steranko. Incidentalmente, talvez a maior evidência para fazermos essa conexão, seja o fato de que Barnes está substituindo ninguém menos do que o próprio Fury como o Homem da Muralha. Novamente: Rudy está anos-luz de distância de Steranko. Mas se ele buscou se inspirar nele, o que mostra que ao menos teve a dignidade de se inspirar em um dos grandes. Assim, a arte desse volume é muito diferente do habitual. Mas o amigo leitor acostumado ao padrão pasteurizado do resto das edições mensais pode estranhar.
O saldo final é mediano. Soldado Invernal: O Homem na Muralha não é nenhuma HQ histórica, mas suas referências são bastante interessantes. Para alguém que busca fugir um pouquinho da mesmice do gênero, talvez até valha a pena. Cabe a você decidir se vale esse discurso todo ou não.
Só não vale ficar em cima da muralha.