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Shenzhen: Uma Viagem à China – Estranho numa terra estranha!

Guy Delisle conta sua estadia na cidade de Shenzhen

Ninguém discordaria que viajar é sempre uma experiência bacana. Se o viajante vai conhecer um local de cultura diversa, melhor ainda. Dificuldades existem, mas quase nunca são algo inesperado e isso sempre é considerado antes de partir em uma nova aventura. No entanto, o que foi descrito aqui é uma situação comum de férias, onde o objetivo é o passeio. E quando você é obrigado pelo seu trabalho a morar por algum tempo em um lugar que jamais teria escolhido? O canadense Guy Delisle passou por isso e relatou seu cotidiano em Shenzhen: Uma Viagem à China (Shenzhen: A Travelogue From China).

Resenha de Shenzhen: Uma Viagem à China, de Guy Delisle

Shenzhen: Uma Viagem à China

O álbum foi lançado no Brasil há alguns anos pela Zarabatana Books (a mesma que publicou Angela Della Morte). Shenzhen é uma das cidades mais importantes da China, situada ao lado de Hong Kong. Em 1979, foi declarada pelo governo como zona econômica especial, o que transformou um vilarejo em megalópole, com uma taxa de crescimento econômico e populacional monstruosa. Parece atrativo, mas, ao mesmo tempo em que isso tornou a região importante para os negócios, também a deixou fria e impessoal, sem os traços cosmopolitas do vizinho. O isolamento é evidenciado pela vigilância de fronteira.

No fim da década de 1990, Delisle passou três meses em Shenzhen, como funcionário de uma empresa europeia de animação que terceirizava serviços para estúdios asiáticos. Mesmo em uma ocupação que envolve trabalho artístico, o tédio é um problema quando não há com quem conversar em um ambiente estranho.  Ao contrário do que muitas pessoas pensam, o inglês não resolve problemas de comunicação em 100% do mundo.

Resenha de Shenzhen: Uma Viagem à China, de Guy Delisle

Além da questão da língua que os locais não dominam, o provincianismo de Shenzhen atrapalha ainda mais essa estadia. A frustração aumenta com a consciência de que Hong Kong está ali ao lado e as coisas seriam bem diferentes por lá. O choque cultural inevitável e a solidão do nosso protagonista lembram o que o personagem de Bill Murray passava em Encontros e Desencontros, de Sofia Coppola. A experiência de Guy Delisle rendeu esta bela HQ autobiográfica, publicada originalmente em 2000.

Shenzhen: Uma Viagem à China não é um retrato excessivamente melancólico de um estrangeiro chorão. As descobertas e as dificuldades são narradas com a leveza de um narrador honesto, que consegue transmitir o peso correto de seu relativo fardo, caindo no inevitável humor de situações comuns a quem conhece um lugar novo. O traço cartunesco de Guy Delisle dá o tom correto para essa jornada sem picos ou viradas dramáticas surpreendentes.

Parece sem graça? Calma! Continue lendo…

Talvez você esteja perguntando-se agora por qual motivo deveria ler isso. Afinal, com essa descrição, parece um diário de viagem ilustrado e com poucos floreios narrativos. É aí que entra aquela sensibilidade que faz a diferença. Vários artistas dos quadrinhos já nos mostraram como o comum pode ser fascinante. Bons exemplos disso são Xampu Vol. 1, de Roger Cruz, e o inesquecível American Splendor, de Harvey Pekar.

Resenha de Shenzhen: Uma Viagem à China, de Guy Delisle

No caso de Delisle, a graça da história e o que nos move pelas 160 páginas do álbum (que vai numa fluidez invejável) é caminhar com ele, descobrindo mais sobre Shenzhen e seus habitantes. Ele consegue provocar a curiosidade do leitor sobre como será o dia seguinte em coisas corriqueiras, como o cardápio do almoço, detalhe que pode ser um tanto complicado para os de fora.

Além de tudo, Shenzhen: Uma Viagem à China traz uma sensação prazerosa, em que parece que encontramos um amigo para ouvir suas histórias de viagem. Chegar a esse grau de cumplicidade com seu público não é fácil e um dos pontos que destacam seu autor. Casado com uma administradora do programa Médicos Sem Fronteiras, Guy Delisle já viajou bastante e essas andanças renderam outros quadrinhos que também valem a pena. Mas isso é assunto para outra(s) resenha(s).

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