Sabe aquelas histórias bem exageradas, que usam lendas urbanas ao pé da letra, onde o surreal é tão presente quanto o real e ainda possuem uma boa dose de humor negro na receita? É isso que você encontrará em A Sereia de Mongaguá.
Publicado agora pela editora Veneta, A Sereia de Mongaguá é realização de Thiago Moraes Martins e Marcos Paulo Marques, que já trabalharam na série animada Fudêncio e seus Amigos, da MTV. A HQ conta uma história que se desenrola através de vários personagens. Dentre eles, uma aspirante a atriz que toma aulas de interpretação com um taxidermista. Este, por sua vez, busca inspiração invadindo a privacidade de seus clientes. Também temos um cineasta em crise que se submete a um tratamento peculiar de hipnose burlesca e, para fechar o “time”, entra em cena um vidente que lê o futuro nas próprias tatuagens – prática categorizada como dermoclarividência.
A narrativa é bem dinâmica e de leitura rápida. Sua estrutura se assemelha muito a um episódio de vinte minutos de algum cartoon – algo esperado pelo currículo dos autores. Essa agilidade ajuda muito no humor, sem perder o leitor por sequer um minuto. Tudo acontece de forma muito veloz, no bom sentido. O timing do humor é muito bem administrado pela diagramação, simples e eficaz, aliada a um traço totalmente cartunesco e expressivo.
O litoral paulista se tornou um cenário mais que acertado. Além de já nos aproximar mais da leitura do que de uma história ambientada na ilha de Manhattan, o teor sensacionalista, a tragédia e o humor negro funcionam muito bem, pois poderíamos receber a notícia do ocorrido em um canal de televisão ou por um jornal da baixada, por exemplo. A esperteza do roteiro vem da simplicidade e boa ligação de causa e consequência. Tudo é bem amarado e sem grandiloquências desnecessárias. O exagero proposto por este tipo de obra não é do estilo arrasa-quarteirão, mas sim de situações surreais acontecendo com pessoas em locais ordinários.
Além do estilo pulp, A Sereia de Mongaguá também é um fruto que nasceu a partir de várias referências da cultura pop. Para o leitor que consome produções artísticas em várias mídias, vai notar toques de séries, filmes, cartoons e até livros. Para quem já leu Ray Bradbury, a associação do dermoclarividente ao conto O Homem Ilustrado (publicado recentemente na coletânea A Cidade Inteira Dorme e Outros Contos) vem de imediato. Não soltarei o spoiler aqui revelando o livro, mas muitos se lembrarão também de Clarice Lispector.
Como já ficou evidente, essa é uma obra tragicômica de leitura rápida. Não espere grandes reflexões e nem um estudo aprofundado sobre a linguagem da nona arte. Aqui, o objetivo é ser uma diversão ágil, saindo-se muito bem nesse quesito. Se os autores resolverem fazer vários quadrinhos nesse estilo, com diversas histórias e causos, com certeza valeria conferir.
A Sereia de Mongaguá é uma leitura dinâmica e divertida. Além de conter vários elementos que compõem a cultura pop, o quadrinho é prova de que não precisamos de um cenário estrangeiro para contar boas histórias. Uma pacata cidade no litoral paulista e uma boa ideia já são o suficiente.