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Ragemoor – Aquela velha história de terror!

Ragemoor é horror clássico e divertido para quando precisamos disso

Jan Strnad e Richard Corben são uma daquelas “duplas canônicas” dos quadrinhos, que até quando estão funcionando no automático produzem algumas obras que simplesmente valem nosso tempo. É o caso de Ragemoor, publicado aqui pela Mino. A HQ já tem alguns anos de estrada, tendo sido entregue em quatro volumes durante 2012. Mesmo assim, se trata de um trabalho bem posterior dos dois – o que não significa absolutamente nada, já que essa dupla dificilmente perde a mão, principalmente quando estão na sua zona de conforto. É o caso aqui.

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Para quem não acompanha tão avidamente quadrinhos, é preciso apontar que Strnad e Corben são duas verdadeiras lendas – com um leve puxada de saco a mais para o segundo. Os agora septuagenários artistas estão rodando na indústria há um tempo, e sua sintonia única para produzir obras grotescas e chamativas fez com que eles produzissem um bom punhado de colaborações.

O “grotescas” acima é um louvor – ambos são mestres dos quadrinhos góticos, de horror e de terror, e provam isso mais uma vez aqui no volume em questão. A trama é o mais puro suco de quadrinhos clássicos de horror, com uma explícita pegada de EC Comics – tanto em comparação quanto em pretensão – mas que, nesse caso, precisa ser colocada em contexto: Esses caras não são influenciados. Eles são influenciadores. Durante décadas agora, o trabalho deles é o que inspira autores dos gêneros malditos, principalmente o indefectível traço de Corben.

Precisamos reafirmar isso, pois a trama em si cheiraria naftalina se fosse pelas mãos de outros artistas. Mas quando você é um definidor de estilo, está valendo. Nela, um jovem bate à porta do Castelo Ragemoor. Ali, irá encontrar um velho parente aristocrata já sem completo domínio das suas faculdades mentais e um mordomo de comportamento no mínimo duvidoso tocando o lugar.

A partir disso, pequenas subtramas se disseminam pelo volume, envolvendo a exploração do misterioso Castelo, que possui vida própria. Literalmente vida própria. Seus corredores e andares se movimentam como as entranhas de uma besta viva, conduzindo seus habitantes segundo sua vontade. Os que resistem, dificilmente duram muito tempo.

Então sim, o volume é uma grande colagem de clichês do gênero do horror que ecoam conforme definidos desde os tempos da supracitada EC, mas que também devem muito aos criadores em questão. Não há outras palavras para definir Ragemoor: É o tipo de horror grotesco feito única e exclusivamente para entreter os fãs dos tropos clássicos do gênero, adornados com a arte de um verdadeiro mestre.

Clichê é para quem pode, não para quem quer

E que arte. Paradoxalmente, embora a trama seja intencionalmente um grande clichê, Corben trabalha a sua arte com nuances claras de entretons, atingidos com uma mãozinha digital inacessível durante o auge de sua carreira há trinta anos. Isso pode dividir alguns fãs, já que o preto e branco de Corben produziram alguns dos melhores painéis de ficção dos quadrinhos e a atmosfera carregada de cinza de Ragemoor pode chocar um pouco os fãs habituados com seus trabalhos mais clássicos.

No entanto, no caso específico de Ragemoor isso funciona. Isso porque a trama, apesar de soterrada dos absurdos fantásticos que são adorados nos quadrinhos de horror, ainda emana características de Poe e Lovecraft, conforme declaradas pelo próprio autor para o volume. É uma verdade que Strnad tenha vendido esse peixe um pouco caro, pois a influência desses autores é muito mais um verniz do que sua essência.

Mas, no fim das contas, é realmente a arte de Corben fica com o encargo de trazer essa atmosfera mais melancólica, enquanto a narrativa em si não pensa duas vezes antes de descambar para um absurdo que mergulha de cabeça no gore. E honestamente, isso é algo bom, pois dois mestres como Strnad e Corben não precisam fazer o que tantos jovens e pretensiosos autores de horror fazem hoje, ordenhando sem misericórdia a vaca tentacular de Lovecraft em busca de alguma legitimação para o seu (muitas vezes não tanto) trabalho criativo. Esses sujeitos já passaram disso, e Ragemoor é a divertida e despretensiosa prova disso.

Por tanto, que fique claro: Ragemoor é um daqueles refinados volumes para pessoas de gosto duvidoso, como esse colunista. Não espere grandes arroubos de sutileza narrativa e artística. Strnad e Corben sabem do que gostam, e esse volume é explicitamente feito com o único propósito de divertir o leitor com castelos mágicos, monstros nojentões e mordomos malucos. Não chega perto dos trabalhos clássicos da dupla, como Mutant World, ou New Tales of the Arabian Nights, mas é digno em sua inexorável proposta de diversão. É isso que ele entrega. Nem mais, nem menos.

Portanto, fica a critério do leitor adentrar os portões de Ragemoor. Não garanto sua vida, mas garanto sua diversão (insira aqui risada maligna).

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