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Aurora – Previsível!

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Até o anúncio de Aurora, o nome do ator Felipe Folgosi dificilmente seria associado a HQ’s pelo grande público. Fruto de uma ideia que surgiu há cerca de dez anos, quando retornava dos EUA após um curso de especialização em roteiros, a história foi inicialmente imaginada para o cinema, conforme Felipe explica no prefácio da edição. Como estamos no Brasil, onde o conceito de grande orçamento cinematográfico está anos-luz abaixo de Hollywood, um projeto que exigiria a utilização maciça de efeitos especiais está fora de questão. Já que o ator/roteirista é também um admirador de quadrinhos, nada mais natural que tenha procurado concretizar sua visão por esta outra via artística.

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Publicado pelo Instituto dos Quadrinhos, o projeto foi viabilizado através de financiamento coletivo. A história mostra o imigrante português Rafael, um pescador exposto à radiação de uma tempestade cósmica, deixando-o em condição aparentemente terminal, com vários pequenos tumores pelo corpo. Sua esposa pede ajuda ao padre local, que por sua vez pede ajuda a seu irmão, um físico alcoólatra que consegue leva-lo para ser tratado em uma universidade. Descobrimos então que Rafael, agora desperto, na verdade evoluiu ao próximo degrau da condição humana, revelando telepatia e telecinese.

Através de outras cenas rápidas anteriores, descobrimos que o governo norte-americano não só estava de olho no fenômeno, como também o esperava, e – como manda a cartilha – começa a eliminar as testemunhas antes de perseguir o super humano. Premissa básica, mas o roteiro ainda apresenta ideias interessantes, como o padrão dos tumores de Rafael emular o mapa da Via Láctea. Infelizmente, isso é colocado para o leitor de uma forma tão didática que uma personagem parece estar ali apenas para explicar um conceito de astronomia, a precessão dos equinócios, além de servir de interlocutora em outros diálogos com o mesmo propósito, sumindo quando perde essa utilidade.

Felipe Folgosi

Felipe Folgosi

Em sua estreia como roteirista de HQ’s, é evidente o esforço de Felipe Folgosi na pesquisa realizada para dar consistência científica e filosófica para Aurora. No entanto, essa bagagem não ajuda quando é diluída em diálogos rasos – caricatos, explicativos e, às vezes, as duas coisas juntas – saindo da boca de personagens estereotipados, como o vilão psicopata malvado até a medula, que ameaça a família do protagonista. A inclusão da fé como elemento de discussão, razão pelo qual temos um padre ali, é de uma obviedade que piora se lembrarmos de casos onde isso foi bem explorado, como Contato, de Carl Sagan. Teria sido uma influência?

Aurora

A arte de Leno Carvalho oscila entre o funcional e o apressado, exceto por um ou dois trechos bacanas com imagens mais “cósmicas”, por assim dizer. Uma pena esse conjunto irregular, já que ele demonstra uma boa narrativa visual, dando uma força para um roteiro tão previsível, o que torna ainda mais questionável a decisão editorial de uma capa sem o nome do desenhista. Entende-se que o chamariz da HQ é realmente o seu criador, mas isso não justifica seu nome sozinho naquilo que é o cartão de visitas do trabalho. Fora isso, a edição também peca pela falta de revisão em seu texto.

O espaço que Aurora conseguiu, graças ao seu roteirista e idealizador, não é algo desprezível e aumenta o alcance dos quadrinhos produzidos em nosso país, o que é positivo, mas seria bom esquecer os clichês de produções hollywoodianas, caso a evolução dos escritores/artistas e mercado esteja entre os objetivos. Sempre é bom lembrar que “menos ambicioso” ou “simples” nem sempre é sinônimo de “inferior” ou “ruim”.

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