A Gigantesca Barba do Mal é uma bela fábula sobre ser diferente em um mundo padronizado
Sabe quando tudo à sua volta parece rigorosamente padronizado, a ponto de você quase desenvolver uma fobia de tais banalidades? Pessoas, vestuários, tecnologias, relações, informação, enfim. Até mesmo aqueles que acreditam sair da curva, nada mais nos parecem além de meras tentativas enfadonhas onde, em seu desespero por ser diferente, acabam de tornando apenas mais uma lata de sopa Campbell.
É claro que um mea culpa é necessário. Mesmo com essa consciência, fazemos sim parte dessa massa uniforme à distância. De uma forma ou de outra, seguimos uma maré bem determinada. Mas, e quando alguma coisa nos destaca em meio à multidão? O que acontece conosco e com nosso entorno quando algo se afasta dos padrões aceitáveis? De forma cativante e lúdica, Stephen Collins mostra os benefícios e os malefícios de se afastar do status quo através de uma Gigantesca Barba do Mal.
Escrita e desenhada por Collins e publicado originalmente em 2013, A Gigantesca Barba do Mal (The Gigantic Beard That Was Evil), foi lançado no Brasil em 2016 pela Nemo (Uma Metamorfose Iraniana e Paciência). É uma HQ que nos traz a história de Dave, um sujeito normal que vive na Ilha de Aqui, onde tudo é meticulosamente organizado, desde a limpeza da cidade até nos rostos perfeitamente barbeados.
Tudo acontecia da maneira padronizada de sempre, até que um dia uma barba começa a crescer ininterruptamente no rosto de Dave, que, mesmo se barbeando, não consegue parar o crescimento dos pêlos indesejáveis. O fenômeno causa uma comoção generalizada na ilha, de modo que a gigantesca barba se torna assunto de segurança pública.
Um roteiro esperto e cativante
Utilizando elementos surreais, Stephen Collins transforma o texto em uma verdadeira aventura lúdica. Longe de ser infantil, o quadrinho consegue gerar empatia em qualquer leitor que já sentiu algo semelhante ao protagonista, de maneira muito incisiva.
A grandiosidade dos acontecimentos reflete um estado mental que, aos poucos, vai se acentuando até tornar-se uma verdadeira paranoia incômoda. Mesmo que a crítica principal seja explícita, tudo em volta pode ser interpretado de inúmeras maneiras, dependendo da vivência individual de cada leitor, pois não se trata de uma história simplória, tampouco clichê.
A criatividade e a progressão dos acontecimentos acontecem de maneira tão fluida, de modo que o leitor mergulha de corpo e alma nesse mundo surreal e cativante.
Arte simples e aconchegante
Os traços leves e seguros, aliados a uma diagramação sofisticada, fazem com que a arte seja muito convidativa e apropriada ao tom de fábula que a história possui.
Não só isso, mas o uso do desenho como propósito narrativo, junto ao próprio traço da barba ao crescer, dá um ar relativamente bestial, como se a barba fosse uma personificação do pensamento de Dave.
A Gigantesca Barba do Mal é um quadrinho cativante, surreal e muito contundente para os tempos de hoje. Com uma leitura tranquilo e reflexiva, o autor, através de sua fábula, nos mostra que ser diferente é tão importante quanto é doloroso.