Vilões do Batman em histórias clássicas do final dos anos 80
A máquina caça-níquel chamada Panini continua a pleno vapor. E não me venha com essa de “ah, eles seguem o modelo de publicação americano”. Isso é balela. Conversa de gente privilegiada que pode gastar uma fortuna por mês com quadrinhos desnecessários, ou colecionadores/complecionistas fanáticos que não ligam de torrar uma fortuna com materiais secundários publicados de forma aleatória. Ou pior, como no caso de Origens Secretas: Os Piores Vilões de Gotham, republicação em 2017 de alguns materiais que acabaram de sair, em 2013, no volume Batman: O que aconteceu com o Cavaleiro das Trevas. Aí já é sacanagem.
Esse volume já havia sido publicado aqui no começo dos anos 90 pela Abril, no falecido volume Superalmanaque DC: Origens Secretas – ainda naquele bom e velho “formatinho”, que era uma porcaria, mas que nós amávamos. O volume era uma compilação de várias histórias de “origem”, que não eram bem de origem – elas ofereciam um pouco mais de background para alguns personagens regulares que apareciam nas revistas dos heróis DC.
Esse tipo de história curta se tornou comum porque foi uma maneira que a DC encontrou de realocar muitos de seus personagens secundários e vilões na massiva reformulação ocorrida após o primeiro grande mega-evento dos quadrinhos, a Crise nas Infinitas Terras. E a iniciativa deu certo – muitas dessas histórias, embora não sejam excepcionais, são muito boas e contam com bons times criativos. A Abril então decidiu fazer uma compilação bastante abrangente, e colocou uma cacetada dessas em um único volume – que, aliás, é o primeiro de que dá para fazer coisa melhor por um preço final menor para o amigo leitor.
Em Origens Secretas: Os Maiores Vilões de Gotham, nós temos uma equipe de jornalistas que tenta, apesar dos avisos de um certo psicopata com fetiches por morcegos, entender o lado dos vilões do Batman em relação à sua própria história. A partir daí, nós temos muitos clichês – como a loucura dos vilões justificada pelo abandono, violência, bullying, etc. – mas também temos alguns bons materiais. As equipes criativas são competentes, e o volume em si é até bem organizado.
E bonito, porque seguindo o padrão da Panini, ele vem com capara dura, papel couché e formato americano. Ou seja, uma apresentação digna dos bons e velhos vilões do Batman. Então, porque eu estou reclamando como o velho ranzinza que sou?
Maior e mais caro não significa melhor
Alguém pode argumentar que os volumes da Abril eram um balaio de gato, onde ela socava um monte de coisa apenas para vender e manter as publicações regulares. Verdade, sem dúvida. Mas nesses balaios, acabavam vindo coisas muito interessantes. Nesse mesmo volume da Abril, há uma história do Sr. Milagre e Oberon, escrita por Mike Carlin e desenhada por ninguém menos que Don Heck, sendo infinitamente superior a qualquer coisa da porção que a Panini decidiu publicar na sua edição de luxo com apenas os vilões de Gotham. Ou seja, balaio por balaio, o da Abril era melhor e mais barato que o da Panini, embora a embalagem não seja tão bonita.
E note que isso não significa que as histórias sejam ruins, muito pelo contrário. Afinal de contas, quem comanda a maior parte do volume é a sumidade da sétima arte Neil Gaiman. E para dar apoio a ele, nós temos uma equipe de desenhistas que conta com nomes como “apenas” Simon Beasley, Mike Hofman e Mark Buckingham. Não bastasse, na história A Bicada Mortal, ainda temos um duo de Alan Grant e Sam Keith. São pesos pesados, qualquer um tem que admitir.
Entretanto, por mais que as histórias sejam boas, elas não compensam duas questões que vão diretamente para a conta da Panini: primeiro, e me perdoem o palavreado, mas esse puto desse padrão de manter tudo sendo lançado “de luxo”. Tem coisa que simplesmente não precisa ficar adornando a porra da estante. São histórias curtas, para serem lidas e guardadinhas num canto depois. Não são obras-primas, e muito menos valem R$ 23,00 em um mercado com um público restrito e que não está cagando dinheiro.
Segundo, e que está diretamente relacionado ao primeiro tópico, o fato de que algumas dessas histórias – especificamente do Charada e da Hera Venenosa (quase 30% de Origens Secretas) – acabaram de ser publicadas em Batman: O que aconteceu com o Cavaleiro das Trevas, como dissemos lá no primeiro parágrafo. E esse volume custava – adivinhe – quase R$ 25,00. Ou seja, o amigo leitor casual e/ou desavisado, que é fã do morcego e compra tudo o que vê pela frente sem pensar muito, vai ter na sua estante dois belíssimos, luxuosos e caros volumes adornando sua estante – com o mesmo conteúdo.
Mal necessário. Necessário?
Uma parte de mim fica até ressentido de ter que apontar esses fatos, pois a verdade é que até alguns anos atrás, os leitores de quadrinhos reclamavam que nada chegava aqui, e ficávamos com lapsos imensos nas histórias. Agora em que temos uma empresa que publica quase tudo o que sai das grandes aqui – e ainda republica material clássico como esse – nós continuamos reclamando. Mas reclamamos porque queremos o melhor para o nosso mercado de quadrinhos.
Como fãs da nona arte, nós sabemos que somos um público escasso, temporariamente inchado pelo sucesso do gênero no cinema. Em entrevistas realizadas na CCXP 2015, muitos dos roteiristas e desenhistas no local afirmavam a mesma coisa – o mercado apenas dos quadrinhos, tirando o sucesso no cinema, continua tão ruim quanto era a vinte anos atrás.
O que significa que a galera, de fato, não compra tudo o que vê pela frente por inúmeros motivos. E ter uma pegadinha como essa entre Origens Secretas: Os Maiores Vilões de Gotham e Batman: O que aconteceu com o Cavaleiro das Trevas é não só uma sacanagem com o amigo leitor, como também um desserviço para o próprio mercado, que mais dia menos dia vai colapsar sob o volume de publicações e seus preços, e a ausência de uma demanda para tudo isso.
