Lançado oficialmente há pouco, na Bienal de Quadrinhos de Curitiba, o álbum Dies Irae é a versão impressa de uma HQ inicialmente publicada em formato digital. É uma iniciativa do Coletivo Tesla (clique para saber mais e comprar esse ou outros trabalhos), de Caxias do Sul, contando com um grupo de artistas que produziu um total de oito capítulos que integram a edição. Frank Tartarus e Rafael Rodrigues respondem pelos roteiros, cada um responsável por quatro segmentos interligados e ambientados em um futuro não tão distante, onde uma situação inusitada pega o mundo de surpresa.
Nesta premissa, onde as possibilidades do virtual são extrapoladas, a Terra é surpreendida quando vários seres estranhos começam a cair do céu. O mais curioso é que cada criatura se assemelha a uma divindade de uma cultura diferente, estremecendo a relação das pessoas normais com seus próprios sistemas de crenças. A partir do primeiro evento, cada uma das oito histórias vai debruçar sobre uma situação específica e pessoal dentro deste cenário cataclísmico.
A ideia do enfoque no indivíduo, apenas tentando seguir em frente em meio a um contexto de proporções gigantescas, tem seu apelo intrínseco e Dies Irae se beneficia disso. Os roteiristas também mostram que capricharam na pesquisa, não apenas no que diz respeito aos vários deuses que dão as caras pelas páginas. Para o leitor, é sempre um exercício interessante procurar a sintonia das ideias dos criadores, concordando ou não com elas. Conforme a história avança, refletir sobre as metáforas propostas é inevitável.
Infelizmente, se a discussão pretendida e o pano de fundo se mostram muito interessantes, a narrativa não dá conta do potencial que essas intenções carregam. Além da história, no geral, perder-se em verborragia explicativa e citações para situar o leitor, no campo das caracterizações dos personagens que carregam algum tipo de protagonismo em cada capítulo, a coisa também fica no meio do caminho. Nenhum deles chega a alcançar a substância dramática necessária para gerar envolvimento, mesmo em um caso isolado, onde um determinado personagem aparece em mais de um segmento.
Com desenhos de Adan Marini, Thiago Danieli e do próprio Frank Tartarus, contando com cores de Luciana Lain, a concepção visual tem que lidar a quantidade de texto – que poderia ser mais enxuto – que as páginas carregam, criando uma relação conflituosa entre os dois. Existem bons momentos desta arte, mas são quadros isolados, entre outros trechos que parecem mais apressados. Em outros momentos, não há cenário ao fundo. São detalhes que acabam sacrificando verossimilhança. Levando em conta o formato “widescreen” das páginas, natural em HQ’s que vieram da internet, não há muita ousadia em termos gráficos, mesmo na escolha daquilo que é colorido em meio ao preto e branco.
Dies Irae tem valor como ideia e é visível o esforço de seus autores, agregando um material de peso na parte conceitual. É realmente uma pena que a obra completa não esteja à altura desta ambição, mas é possível sentir a vontade de produzir que esse grupo carrega, o que já garante, pelo menos, curiosidade sobre o que eles podem produzir a seguir. Já foi mais longe que muita coisa que vemos por aí.
Dies Irae está disponível na plataforma Social Comics!