Star Wars: Kenobi mostra a longa espera do mestre jedi
Que Star Wars é uma colcha de retalhos temática, fruto de uma adolescência bem vivida por George Lucas, é um fato bastante conhecido. Uma delas é o faroeste. Afinal, pistoleiros e mercenários povoam esse universo tanto quanto jedis e imperadores, dando um certo sabor para a história – quando nos lembramos que eles estão ali. É dentro deste ensejo que o autor John Jackson Miller consegue inserir a trama particular daquele que talvez seja um dos mais amados personagens da franquia: Obi Wan Kenobi, em Star Wars: Kenobi publicado pela editora Aleph!
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Embora, como dito acima, seja um dos personagens mais amados da franquia, Kenobi sempre pareceu um outsider. É um dos poucos personagens que não tiveram sua história ou sua personalidade revista e/ou acrescida; é sempre um guerreiro astuto ou um mestre sagaz. Nunca o mais poderoso, mas sempre aquele que encontra um jeito de prevalecer. É o arquétipo quintessencial da inteligência sobre a força – a figura que ensina ao herói que paciência e/ou uma boa ideia resolve problemas mais rápido do que conhecimento acumulado ou poder devastador.
E é exatamente essa faceta que é mostrada no livro, com uma roupagem de western que lembra, de certa forma, as interpretações que esse gênero fez dos chambaras que os inspiram. A trama se passa imediatamente depois dos eventos vistos em A Vingança dos Sith. Obi Wan esconde Luke, um dos filhos de Anakin, no distante e desértico planeta Tatooine. Ali, ele terá a oportunidade de crescer e se preparar para cumprir seu destino manifesto na Força. A intenção não é muito necessária descrever.
Porque não é sobre ela que se trata o livro. Ele se trata da longa espera de Obi Wan pelo crescimento de Luke, e o que ele fez enquanto esperava. E a resposta é: não muita coisa. Nós dissemos que Kenobi parece bastante baseado em westerns, e é verdade; mas muito mais próximo de um clima contemplativo e de desenvolvimento lento, como um Leone, do que algo mais movimentado e intenso como um Peckinpah. A ideia era Obi Wan se esconder em um planeta distante onde nada acontece, para que Luke permanecesse oculto. O problema é que um forasteiro de imenso poder chegando em um lugar onde nada acontece é um grande acontecimento.
Apesar de deixar Luke com a família Lars e fazer seu melhor para ficar abaixo do radar, Obi Wan muitas vezes tem problemas em renunciar à sua boa índole. O que significa que é difícil para ele permanecer alheio às injustiças de uma terra sem lei. É assim que começa seu envolvimento com a família Calwell, que toca o armazém no Oásis Pika (aaaah, Star Wars e sua eterna fábricas de nomes involuntariamente hilários…). O armazém é um dos poucos lugares civilizados e que mantém a vida de muita gente funcionando num raio de milhares de quilômetros. E, justamente por isso, é o alvo favorito do temido Povo da Areia, que todos conhecemos tão bem desde o primeiro filme da saga.
Western numa galáxia distante
O estilo western aqui é mais do que explícito: o bom e velho “defesa do forte”, com Obi Wan desempenhando o papel de herói relutante e solitário. E bota relutante nisso. Em situações normais, Obi Wan provavelmente teria uma meia dúzia de planos mirabolantes e afastaria o Povo da Areia sem muito mais trabalho do que merece. Entretanto, esse é o Obi Wan pós-VdS – um homem amargurado e traumatizado pela terrível derrota sofrida. É um momento muito bem desenvolvido por Miller entre esse e o Obi Wan de Alec Guiness, um guerreiro no fim da vida, e preparado para lutar depois que esta acabe.
Portanto, sua maneira de lidar com essa situação de conflito é muito mais distante – ele pode impedir a injustiça que vê, mas demora a se interessar em combater sua fonte. E, apropriadamente, é assim que os vilões ganham força. Obi Wan, por se ater ao plano inicial e focar no panorama geral, apresenta o que pode ser considerada uma moralidade dúbia, permitindo que pequenas injustiças tenham curso. No geral, é uma apresentação bastante polivalente e aprofundada do personagem, em um recorte que nos permite perceber o quanto esse guerreiro astuto, sempre com um sorriso no canto da boca mesmo nas piores situações, realmente sofreu com a ascensão dos Sith.
O grande – em todos os sentidos – problema do livro é sua extensão. Na tentativa de criar um clima narrativo lento, que tenta transitar entre a contemplação e o tédio sentido pelo protagonista, o autor acaba entediando o leitor. Kenobi é um tijolo de 500 páginas que poderia facilmente ter umas 200 a menos. O protagonista é razoavelmente bem trabalhado, assim como os coadjuvantes e a ambientação, mas existe muito “espaço vazio” dentro do livro. Miller peca ao acreditar que nos fazendo esperar por algo acontecer conseguimos sentir o que Obi Wan sente. Ele até consegue, mas se esquece que o leitor, ao contrário do protagonista, não é alguém numa missão a longo prazo.
De toda forma, dos livros do universo expandido recente de Star Wars, Kenobi é um dos melhores. De fato, mesmo se virasse um roteiro para um filme, ainda seria muito melhor do que os episódios I, II e III e a recente trilogia. Talvez uma boa mini-série. Só o que sabemos é que, se é para produzir lixo a toque de caixa, a dona Disney podia pelo menos nos oferecer um pouco mais do melhor jedi que já caminhou pela galáxia.
Isso é somente a verdade. Por um certo ponto de vista…