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Nossos Deuses São Super-Heróis – Analisando o fenômeno!

As bases do conceito e além em Nossos Deuses São Super-Heróis

Ainda que os Quadrinhos de Marvel e DC continuem vendendo mal, sem previsão de recuperação, impossível negar a popularidade que seus personagens desfrutam hoje. Cinema, seriados e videogames mantém esses super-seres em alta, mesmo que as novas gerações nunca tenham lido qualquer revista de seus heróis favoritos. A esses “fãs”, não deve interessar a base do surgimento do herói uniformizado, mas quem pretende investigar esse fenômeno moderno, do ponto de vista social e cultural, tem em Nossos Deuses São Super-Heróis (Our Gods Wear Spandex) um bom ponto de partida, com algumas ressalvas.

Compre clicando na imagem!Resenha de Nossos Deuses São Super-Heróis

Lançado originalmente em 2007, chegando ao Brasil no ano seguinte pela Cultrix, selo da editora Pensamento, o livro chega a ser um prenúncio. Afinal, 2008 marcou a estreia de Homem de Ferro, iniciando o Universo Marvel nos cinemas. Escrito pelo quadrinhista Christopher Knowles, o texto passa por diversos tópicos que vão além das dificuldades dos EUA durante a Grande Depressão. Na verdade, o caminho tortuoso do raciocínio de Knowles passa pelo fascínio que o espiritismo exerceu naquele país, o ocultismo popularizado por Aleister Crowley, as descobertas arqueológicas no Egito, sociedades secretas e, pasmem, mormonismo.

Claro que ele não despreza o que é mais óbvio, como a filosofia de Nietzsche, picos da criminalidade a partir da década de 1930, o folclore judaico e os panteões grego e nórdico. Além disso, ele também se propôs a incluir breves biografias sobre personalidades que, segundo sua visão, trouxeram algo à formação do conceito super-heroico. Estão lá Conan Doyle, Allan Poe e, claro, Harry Houdini. Grandes nomes diretamente associados ao mundo dos Quadrinhos não poderiam faltar, como Jack Kirby e Alan Moore, onde o texto faz uma ponte entre a mitologia e o hermetismo antigo com o super-herói moderno.

Parece muita coisa para cerca de 250 páginas, não? E é mesmo. Exatamente por isso que Nossos Deuses São Super-Heróis serve mais para apresentar curiosidades que podem ser anotadas e pesquisadas mais a fundo depois. Uma interessantíssima, por exemplo, é a suposta influência de The Coming Race, livro de ficção científica de 1871, sobre um certo partido nacional socialista da Alemanha. Pena que ele inclua comentários muito pessoais e questionáveis sobre proximidades duvidosas entre criações da Cultura Pop, como uma comparação entre o Quarteto Fantástico e os personagens principais do Star Wars de 1977.

Nesta mesma seara, muita coisa do que ele diz é especulação particular pura, como a relação dos gregos com suas divindades, forçando uma relação mais próxima dos deuses da antiguidade com os heróis das HQ’s. Esse tópico em especial denota um caráter um tanto tendencioso do livro, mostrando que é preciso cuidado da parte do leitor. Knowles, além de profissional do meio, é um fã, evidentemente. Nenhum problema nesse fato, mas ele parece ceder a uma tentação bastante comum nestes tempos.

A impressão é que ele busca provar um valor conceitual muito maior aos super-heróis através deste elo com o passado, fazendo conexões que carecem de fundamento, até por serem assuntos que não são sua especialidade. Com isso em mente, o conjunto da obra é melhor apreciado e assimilado.

Problemas de estrutura e tradução

Feitas as considerações necessárias sobre a abordagem, é hora de apontar detalhes incômodos na estrutura de Nossos Deuses São Super-Heróis. O autor se atrapalha quando precisa explicar pormenores de origens e sagas bem conhecidas pelos leitores de HQ’s de super-heróis. O iniciado perceberá isso facilmente e pode muito bem ignorar, mas é um problema para os poucos desavisados que se arriscarem nestas páginas. Não se engane ao achar que Knowles mirou um nicho bastante específico de público. Se fosse o caso, nem haveria preocupação com esse tipo de didatismo, mas esse resultado complica a vida de alguém buscando informações mais específicas.

A própria organização geral das informações é uma faca de dois gumes. Por um lado, é tudo muito dinâmico. Por outro, faz com que vários detalhes se repitam de uma forma um pouco irritante, como se o autor não percebesse que já citou determinado episódio. Da metade para o fim do livro, isso começa a pesar muito. Sobretudo para quem já conhece bem os Quadrinhos dos EUA, seus principais personagens e os criadores mais importantes, pois o que ele tinha de inusitado para expor já passou.

Resenha de Nossos Deuses São Super-Heróis

As ilustrações de Joseph Michael Linsner brincam com as relações propostas por Christopher Knowles, envolvendo a Maçonaria e e a mitologia egípcia, entre outras coisas.

Talvez a tradução tenha mais responsabilidade do que parece neste quesito. De qualquer forma, saindo da suposição e avaliando o concreto, a transição do idioma é mais um problema para nossa edição brasileira. Apesar do aviso no início sobre os nomes traduzidos, onde afirma-se manter o que já foi estabelecido nas publicações do Brasil e deixar os inéditos no original, não é isso que acontece e existem várias discrepâncias que qualquer pesquisa no Google resolveria. Exemplo? O clã ninja das histórias do Demolidor é referido como “A Mão”, traduzindo o original diretamente, mas ignorando que aqui é chamado “O Tentáculo”.

Alguns perceberão que, por conta das particularidades do inglês, houve confusão de gênero em um caso. Problemas, infelizmente, bem comuns em nosso mercado editorial, onde ignora-se que determinadas obras pedem um tradutor ou revisor com conhecimento específico. Como é um texto curto e dinâmico, compromete menos a diversão, mas nem por isso deixam de ser defeitos.

Apesar de tudo, vale a aquisição

Nossos Deuses São Super-Heróis é um tipo de obra bastante peculiar, investigando a trajetória de um fenômeno cultural partindo de ligações com o ocultismo e outras vertentes menos comentadas. Nem sempre acerta, mas aguça a curiosidade de quem se interessa em transcender o assunto. Nesse sentido, pode-se dizer que o livro é bem sucedido e compensa o investimento. As belas e divertidas ilustrações de Joseph Michael Linsner são um bônus.

Se o seu interesse é mais em contexto histórico e em algo mais concreto, melhor procurar por obras como Homens do Amanhã, Marvel Comics: A História Secreta e Superman: Uma Biografia Não Autorizada. Porém, se também vai atrás de coisas no estilo de Superdeuses, aqui há material de sobra para algumas conversas bem divertidas.

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