Hugo Gernsback, sci fi e a cultura pop em geral
Dependendo do quanto você curte Ficção Científica em geral, o nome de Hugo Gernsback já é bastante familiar. Um cara como esse, cuja contribuição ao sci fi é tão reconhecida que um dos grandes prêmios do gênero leva seu nome, merece respeito. Só que a importância dele ainda vai um pouco além deste nicho literário, um assunto que rendeu artigo originalmente publicado no Nerdist, que fizemos questão de traduzir.
(Aproveite e leia também este artigo sobre a Proto Ficção Científica)
Confira!
Muitos já disseram que a Ficção Científica começa com a publicação de Frankenstein de Mary Shelley, em 1818, um romance que postula que se a ciência médica pudesse ressuscitar os mortos, traria uma série de conflitos filosóficos. Enquanto Frankenstein, tecnicamente, pode ser a primeira obra do gênero, a popularidade atual da Ficção Científica – e do termo em si – é um fenômeno muito mais recente e totalmente americano. A origem do termo e, por consequência, a noção já estabelecida de “fandom”*, começa com Hugo Gernsback, em 1926.
*(Subcultura composta por fãs de algo ou alguém)
Um dos grandes heróis da cultura de gênero, Gernsback é chamado, às vezes, de O Pai da Ficção Científica. Ele era um editor, nascido em Luxemburgo, que mudou-se para os EUA no começo de 1900, imediatamente perseguindo sua vocação no ramo de distribuição de mídia. Fundou uma estação de rádio em New York, sempre bastante interessado no trabalho interno das rádios e outros equipamentos técnicos. Gernsback sempre teve paixão por ciência e tecnologia, até mesmo iniciando uma revista sobre o assunto, chamada Modern Electrics. Possivelmente, a primeira revista de tecnologia do país, fundada na época em que rádios ainda eram chamados “the wireless”.
O interesse de gernsback por tecnologia também influenciou sua atividade irregular escrevendo ficção (ele escreveu um romance sci-fi chamado Ralph 124C+, em 1911), levando-o a buscar um novo nicho de literatura pulp fiction que ainda estava em ampla circulação no começo do século, especialmente com inclinação técnica ou científica. Gernsback já estava lendo os trabalhos de astrônomos renomados – Percival Lowell era seu favorito, mas também apreciava a série Barsoom*, de Edgar Rice Burroughs. Romances pulp eram (e ainda são) vistos como algo fora da elite do mundo literário, feitos para atrair um grande público. Desta forma, não eram necessariamente sensíveis ou intelectuais (The Steam Man of the Prairies é importante, mas não exatamente de alto nível), e nem necessariamente considerados como outras obras de seu tempo, como, digamos, Kim, de Kipling, ou O Sol Também se Levanta, de Hemingway.
*(Que introduziu o personagem John Carter)
Gernsback, no entanto, viu um grande potencial no segmento, imaginando o monte de dinheiro que poderia fazer mesclando aventuras pulp com o complexo pensamento científico de suas revistas de tecnologia. Ele até mesmo imaginou uma mistura certa – 75% ficção e 25% ciência – que seria a receita ideal para o apelo popular. Em 1926, Gernsback fundou a revista Amazing Stories, a primeira dedicada ao sci-fi e, essencialmente, a própria origem da Ficção Científica. Ele até tentou cunhar uma palavra mista para designar seu novo gênero: scientifiction (junção de “scientific-fiction”). A palavra não pegou, mas uma versão encurtada dela, apresentada no segundo número de Amazing Stories, sim – “sci-fi”.
Inicialmente, Gernsback preencheu a Amazing Stories com material republicado (como histórias de H. G. Wells e Júlio Verne), mas começou, eventualmente, a coletar histórias originais para maior exposição. Gernsback foi um dos primeiros editores a apresentar trabalhos de H. P. Lovecraft. Incidentalmente, ele não tratava seus autores tão bem, frequentemente adiando pagamentos. Lovecraft, de acordo com sua biografia, foi gravado chamado Gernsback de “Hugo, o rato”. O legado deixado por ele, de fato, tem sido manchado por algumas práticas comerciais desonestas, fazendo com que os que se lembram dele sintam algo que quase chega ao desprezo.
Mais significativo para a cultura nerd moderna, no entanto, foi a opção de Gernsback de incluir uma seção de cartas em Amazing Stories. Enquanto outras revistas publicavam cartas ocasionais ao editor, Gernsback optou por colocar os nomes e endereços dos fãs que escreviam. Ele sabia, aparentemente, que havia outras pessoas ansiosas por compartilhar sua paixão pela escrita de ficção baseada em ciência e queria encorajar seus leitores a se comunicarem entre si, além da correspodência para a revista. Efetivamente, Gernsback criou a primeira rede de fãs. Subitamente, os fãs de sci-fi não apenas tinham um termo para descrever sua paixão, mas também acesso garantido a um grupo fechado de entusiastas com mentalidade semelhante, com quem poderiam teorizar e postular.
Em pouco tempo, o fandom – como nós entendemos hoje – nasceu.
Imagine o que isso significa para os nerds de hoje. Sem o molde deixado por Hugo Gernsback, os fóruns da internet poderiam nem existir. A ideia de que fanáticos com ideias parecidas poderiam reunir-se em uma celebração poderia levar muito mais tempo para desenvolver-se. Se você gosta de falar sobre os filmes da Marvel, você está diretamente engajado com a cultura fundada naquele fatídico dia de 1926.
O legado de Gernsback é celebrado até hoje com o prêmio que leva seu nome – The Hugo Awards -, iniciado em 1953.