Se você é fã de Horror, logo deve ser admirador do trabalho do mestre Stephen King, certo? Provavelmente também é ou já foi fã de Clive Barker e, no cinema, de John Carpenter e do genial Guillermo Del Toro, estou certo? E se eu dissesse para você que todos estes nomes foram diretamente influenciados pelo trabalho do escritor norte-americano Howard Phillips Lovecraft, popularmente conhecido como H.P. Lovecraft?
E mais… E se eu dissesse que a influência do trabalho de Lovecraft é tanta que transcendeu a literatura de Horror? Nomes como os dos autores de Graphic Novels Alan Moore, Neil Gaiman e Mike Mignola, do escritor William S. Burroughs, de seu amigo Robert E. Howard (criador de Conan, o Bárbaro), e do artista H.R. Giger (criador do temível Alien do cinema), são apenas alguns dos profissionais influenciados pelo trabalho do escritor. Infelizmente, sua trajetória não foi nada gloriosa e aqui vai um relato sobre as trágicas vida e morte e da riquíssima obra deste que, sem dúvida, foi o homem que deu forma ao Horror como viemos a conhecê-lo através das décadas, ainda que para alcançar este status, ele tenha pago o mais caro dos preços.
H.P. Lovecraft nasceu em 20 de Agosto de 1890, na cidade de Providence, Long Island. Suas dificuldades na vida começaram cedo, quando seu pai foi confinado à uma instituição para doentes mentais apenas três anos depois. Sua mãe, muito ligada a ele, viria a falecer muitos anos depois na mesma instituição que seu marido, sofrendo dos mesmos sintomas de histeria e depressão.Precoce, começou a escrever contos de Horror – ainda rudimentares, evidentemente- quando tinha apenas oito anos de idade. Desde pequeno, ele já sofria de ataques de ansiedade e de “terrores noturnos”, uma espécie de doença do sono. Ele dizia ser assombrado em seus sonhos por horrendas criaturas noturnas sem rosto, que mais tarde se tornariam tema de um poema seu, chamado Night Gaunts. Tais dificuldades tornaram sua convivência com outras crianças na escola algo insuportável, mas no colégio, Lovecraft começou a cultivar algumas amizades. Ele acabou não se formando, mas adquiriu um conhecimento de maneira autodidata formidável em história, linguística, química e astronomia. Tópicos que, curiosamente, viriam a permear sua escrita futura.
Um grande influenciador, conforme já mencionado, Lovecraft também foi influenciado em sua carreira como escritor. Sua inspiração foi, é claro, Edgar Allan Poe, cujos diversos elementos de suas histórias, seriam adaptados com um verniz ainda mais mórbido pelo jovem admirador. Aos 23 anos, foi convidado para ingressar em uma associação de jornalismo amador, e encorajado pelo convite, começou a divulgar alguns de seus contos. Quando completou 31 anos, ele teve sua primeira história publicada em uma revista profissional. Aos 34, era um colaborador habitual da revista Weird Tales, publicação especializada em histórias de Horror, Ficção, Suspense e Fantasia.
Em sua vida adulta, Lovecraft era um recluso. De face extremamente pálida, o escritor quase nunca saía de casa antes do anoitecer. Isso não o impedia de se comunicar com outros autores contemporâneos por carta. Seu principal correspondente e único amigo era Robert E. Howard, o já citado criador de Conan, o Bárbaro.Foi nesta época inclusive que H.P. Lovecraft criou seu próprio universo ficcional, os Mitos de Cthulhu (Cthulhu Mythos) – termo utilizado pelo escritor August Derleth, primeiro editor dos contos – que girava em torno da criatura conhecida como Cthulhu, uma figura central em sua literatura, e foco do conto O Chamado de Cthulhu (The Call Of Cthulhu), publicado pela revista Weird Tales em 1928. Mitos de Cthulhu é um título utilizado até hoje para identificar esse universo, revisitado posteriormente por outros escritores dispostos a explora-lo mais.
Para quem não sabe, Cthulhu é uma das criaturas criadas por Lovecraft conhecidas como “The Great Old Ones”, algo como “Os Grandes Antigos”, que seria um panteão de antigas e poderosas entidades do espaço que uma vez já dominaram a Terra, entrando depois em um estado de hibernação. De acordo com o conto O Chamado de Cthulhu, as mentes humanas entrariam em estado de deterioração apenas com uma olhadela em uma destas criaturas que existem além de nossa realidade.
Em 1924, cinco anos depois da morte de sua mãe, Lovecraft se casou e partiu para Nova York, onde esperava que seu trabalho fosse reconhecido e remunerado satisfatoriamente. No mesmo ano, trabalhou como escritor-fantasma do famoso escapista Harry Houdini, no conto Aprisionado com os Farós (Imprisoned with the Pharaohs). No entanto, pouco tempo após o casamento, sua esposa, principal mantenedora da relação, perdeu seu negócio e seus bens após a falência do banco responsável por seus investimentos. Quase abandonando a escrita, procurou por empregos comuns para sustentar a esposa, sem sucesso. Escrevendo bem menos (suas histórias eram repetidamente rejeitadas por revistas), principalmente devido à censura da época e o tom cada vez mais mórbido contido em seus contos, a situação financeira do escritor beirava a falência.
Sua esposa então conseguiu um novo emprego, que exigia dela constantes viagens, deixando-o praticamente sozinho em Nova York, vivendo com uma pequena pensão que ela mandava durante as viagens. Para piorar, seu pequeno apartamento no bairro de Red Hook foi depenado, deixando-o apenas com a roupa do corpo. Mesmo subsistindo neste cenário desolador, Lovecraft ainda foi capaz de escrever dois de seus melhores contos, Horror em Red Hook (The Horror at Red Hook) e Ele (He), histórias que iam totalmente de encontro ao delicado momento da vida do escritor. Em 1926, aos 34 anos e 20Kg mais magro, ele retornou para Providence, sua cidade natal.
SEGUNDA E ÚLTIMA PARTE! (Aproveite e leia a entrevista de Alan Moore onde o assunto foi Lovecraft)