Philip K. Dick é um nome de destaque na literatura sci-fi. Seus contos e romances, muitos adaptados para o cinema, influenciam a cultura pop até os dias de hoje. Nascido em 1928, o autor norte-americano morreu aos 53 anos e deixou um legado com diversas e memoráveis obras de ficção-científica, dentre elas podemos destacar O Homem do Castelo Alto e Andróides Sonham com Ovelhas Elétricas? (livro que deu origem ao cultuado filme Blade Runner – O Caçador de Andróides, de Ridley Scott).
Em Fluam, Minhas Lágrimas, Disse o Policial, escrito em 1974, acompanhamos o personagem Jason Taverner, um popular cantor e apresentador de televisão, que um dia acorda sozinho num quarto de hotel e percebe que tudo mudou; ninguém o reconhece e não há nenhum registro oficial de sua existência. Taverner precisa então, iniciar uma jornada pela ilegalidade para tentar descobrir o que aconteceu com o mundo que tanto o idolatrava.
A trama se passa no início do século XXI e, assim como em outras obras de P.K.D., temos uma clara divisão de castas na sociedade e uma forte opressão policial. Obrigado a agir no submundo, Taverner acaba sendo o fio condutor que nos apresenta este novo universo. Como o protagonista não sabe o que está acontecendo, ele mesmo acaba questionando as dúvidas que começamos a ter a respeito de como tudo funciona. Isso aumenta consideravelmente o estilo thriller, já que ele precisa agir furtivamente para desvendar o mistério de sua nova e desconhecida identidade. Se é que tem uma.
Com um clima angustiante, que lembra levemente O Processo, de Franz Kafka, a narrativa consegue gerar reflexões sobre o próprio conceito de identidade. Afinal, se ninguém mais souber quem você é, ainda assim seria você? Ou a identidade seria gerada a partir do momento em que estamos inseridos em um meio que nos reconhece como indivíduo? Esses questionamentos são feitos pelo leitor, mas não pelo protagonista.
Taverner é egocêntrico, orgulhoso e – propositalmente – nada carismático. Ele era alguém que vivia dos holofotes. Agora, sem a luz da fama, não se contenta simplesmente em viver de outra forma e luta para provar quem é. A ideia de não ser reconhecido o corrói como um ácido.
O segundo ato do livro se estende demais, um ponto que atrapalha a experiência da leitura. A história não avança e questionamentos novos não são gerados, dando a forte impressão de que poderia ser um conto ao invés de um romance – relativamente longo, mas ainda assim um conto. Mas o grande ponto forte está no terceiro e último ato. A troca de perspectiva e acontecimentos com um personagem, oportunamente aleatório, conseguem gerar uma catarse muito gratificante. Sem spoilers, é possível dizer unicamente que o final ressignifica a obra como um todo, fazendo com que o epílogo se torne inútil e até mesmo vulgar.
Vencedor do prêmio John W. Campbell como melhor romance de ficção-científica de 1975, Fluam, Minhas Lágrimas, Disse o Policial é instigante, angustiante e reflexivo. Philip K. Dick mostra, como poucos, que os conceitos de identidade e realidade são mais tênues e voláteis do que aparentam.