Já se imaginou em um mundo onde um homem pedindo carona na estrada pode ser um vampiro, uma tatuagem em seu corpo é uma terrível premonição e um falso messias extraterrestre sangra mais enquanto satisfaz o egoísmo de um crédulo querendo ser abençoado? Estes são apenas alguns dos elementos apresentados em A Cidade Inteira Dorme e Outros Contos.
O livro da editora Bilioteca Azul é uma compilação de 13 contos do norte-americano Ray Bradbury (1920-2012). São eles: Uma pequena Viagem, O Lixeiro, O Visitante, O Messias, A Autêntica Múmia Egípcia Feita em Casa, A Cidade Inteira Dorme, O Homem Ilustrado, O Homem em Chamas, As Frutas no Fundo da Fruteira, O Dragão, O Pedestre, O Alçapão e A Hora Zero.
Repleto de ironia, o texto de Bradbury mostra com perspicácia o quão frágil é o ser humano. Utilizando várias questões sociais, desde o caráter egoísta – que supera a devoção cega – até o medo paranoico fundamentado na ilusão, os contos proporcionam ao leitor um ponto de vista superior ao dos personagens, de forma que não sentimos empatia, mas sabemos de suas intenções. Essa falta de identificação se prova muito útil para nas histórias que não são sobre os personagens, mas sobre o homem como um ser carregado de falhas intelectuais e morais. Cada narrativa mostra uma questão diferente, de modo que as ideias não se repetem ao longo dos contos, proporcionando aquele teor instigante e ótimo ritmo de leitura.
O elemento fantástico – quando há – dentro dos contos é colocado de maneira esperta e sofisticada. Muitas vezes não é sutil, mas quando isso acontece é porque o cerne é outro. Sem empregar uma grandiloquência para mostrar e descrever tais eventos, Bradbury consegue fazer com que a narrativa não perca o propósito em prol do apelo.
O nome do autor normalmente é associado à ficção-científica devido às suas obras mais famosas, como Fahrenheit 451 e Crônicas Marcianas. No caso das histórias reunidas em A Cidade Dorme e Outros Contos, podemos atribuí-las muito mais ao gênero da fantasia e suspense no melhor estilo Além da Imaginação – se bem que, considerando as datas de publicação original de algumas delas, Rod Serling (criador do clássico televisivo) talvez tenha até se inspirado neste tipo de narrativa curta e sem muitas explicações racionais, como os escritos de Bradbury.
Além de dinâmicos e curtos, os contos também ganham força pela crescente curiosidade que despertam no leitor. A famosa e desejada sensação de querer virar as páginas para saber o que acontece no final está em A Cidade Inteira Dorme e Outros Contos. Só não espere finais muito felizes, afinal, quando se trata de determinadas questões relacionadas ao ser humano, a felicidade só pode ser encontrada na ficção de autores menos pessimistas do que aquele que nos deu um vislumbre de um futuro aterrador, onde o trabalho dos bombeiros é acabar com a cultura e o conhecimento, ateando fogo em livros.