Aos 62 anos, Jackie Chan não segura mais o protagonismo do tipo de aventura cômica de artes marciais que o tornou famoso. Carisma não lhe falta, é verdade, mas um trabalho que depende tanto do físico sofre com as limitações da idade e, mesmo que ele ainda faça muito nesta condição, os parâmetros sempre serão seus trabalhos de mais de uma década atrás. Mas, se no divertido A Hora do Rush (1998) ele se deu bem reciclando a fórmula dos policiais incompatíveis que se acertam depois, agora ele tenta algo mais na linha de 48 Horas (1982), onde um agente da lei forma uma dupla com um trambiqueiro. Essa é a ideia básica de Fora do Rumo (Jue di tao wang), co produção entre Hong Kong, China e EUA, que se mostra um desastre por vários motivos e seu diretor é um deles.
Renny Harlin, que teve seus melhores momentos entre 1990 e 93, com Duro de Matar 2 e Risco Total, algo que também não significa muita coisa, foi responsável por bombas como Alta Velocidade e O Exorcista – O Início, na década seguinte. Essas credenciais já dizem tudo. Os roteiristas Jay Longino e BenDavid Grabinski são inexperientes na função – o único crédito anterior de Longino é A Última Festa de Solteiro 2, de 2008 – e deixam isso claro nas falas que escreveram para esta tranqueira. Especificamente, me refiro às “tiradas espertas” disparadas pelo parceiro do protagonista, Johnny Knoxville, mais sem graça do que qualquer personagem de A Praça é Nossa.
Esboçar algum tipo de sinopse para o filme é uma tarefa inglória, mas vamos lá. Jackie Chan é Bennie Chan, que investiga Victor Wong, um ricaço benquisto que comandaria sozinho toda a rede do crime organizado, teoria rejeitada por seu capitão. Abrindo o filme com a morte de seu parceiro, atribuída ao tal bandido, ele continua sua busca por anos, mas a chegada em Hong Kong do personagem de Knoxville, Connor Watts, cria problemas para a filha de seu parceiro, funcionária do hotel de Wong.
Existe ainda uma subtrama que leva Connor à força para a Rússia, no que Chan é obrigado a resgatá-lo – contra sua vontade – para salvar sua afilhada, descobrindo no caminho que o malandro conseguiu, sem querer, uma prova decisiva para sua investigação. A volta para Hong Kong será complicada por ser um trajeto por terra e pelo conflito entre os dois, baseado na ética de um e a falta de vergonha na cara do outro, um choque cultural que você já viu melhor realizado em vários outros filmes. Além de tudo, eles também precisarão lidar com o bando do vilão e com os russos atrás deles.
Falando diretamente, Knoxville não tem como compensar a falta de um Jackie Chan mais ativo em acrobacias e coreografias de luta, algo que nem deveria ser tentado, na verdade, mas a culpa não é inteiramente dele. Fora do Rumo é uma comédia de ação, mas escorrega vergonhosamente em trechos pretensamente dramáticos e lições de moral, algo que nem é cabível, além de repetir a situação básica de um personagem tentando enrolar o outro, testando a paciência do espectador. Fora isso, também traz momentos embaraçosos, como um número musical, ao som de Adele, com uma tribo mongol, entre outros que pretendem mostrar cartões postais dos locais por onde passam, na maior cara-de-pau.
Quer mais? O filme tenta ser estiloso em sua vinheta de abertura e na apresentação dos personagens, em um estilo meio Marvel Studios, meio Guy Ritchie, só que bem mais pobre. A própria edição é tão jogada que espectador mais desatento vai perceber que, em vários momentos, existe algo errado na transição entre um plano e outro. A falta de um planejamento mais sério – em termos de acabamento – se mostra também na incrível duração de 107 minutos, interminável para uma comédia que falha em fazer rir. Talvez haja um ou outro momento que provoque risos de verdade, mas, na minha experiência pessoal, foi um efeito reverso, tamanha a falta de graça constrangedora – além de um trecho que me lembrou um episódio de Chapolin.
Fora do Rumo tenta surpreender o público com reviravoltas forçadas, mas, no máximo, fará vários espectadores revisitarem com urgência os filmes antigos de Jackie Chan, para manter intocada a imagem bacana daqueles bons tempos. Johnny Knoxville é aquilo mesmo, até que se prove o contrário, e sobre Renny Harlin, quanto menos falarmos dele, melhor.