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Vermelho Russo – Quando a ficção se confunde com a realidade!

Vermelho Russo é uma curiosa mistura de gêneros

O cinema brasileiro atual tem chamado a atenção por fazer uma mistura muito interessante entre ficção e realidade. Vide O Olmo e a Gaivota, de Petra Costa e Lea Glob, Branco Sai, Preto Fica, de Adirley Queirós, e Era o Hotel Cambridge, de Eliane Caffé. Essa mistura já vem desde o Cinema Novo, quando os cineastas queriam mostrar o Brasil que não era visto. Casos mais recentes – com a exceção do filme de Caffé e Queirós – se mostram interessados em outras histórias sem um lado político envolvido, mas ainda fazem um bom trabalho, colocando o espectador em dúvida sobre o que é ficção e realidade. Vermelho Russo, novo trabalho do diretor Charly Braun (Além da Estrada), é mais um exemplo desta nova tendência e o resultado final é muito positivo.

Vermelho Russo é um filme nacional que supreende pela inventividade narrativa

Vermelho Russo

O longa acompanha Marta (Martha Nowill) e Manu (Maria Manoella), duas atrizes de teatro que vão até Moscou para um curso de interpretação, baseado no famoso método de Constantin Stanislavski. Durante a viagem, ambas tem que se adaptar ao clima do país, enfrentar incertezas e resolver suas diferenças, dentro e fora do palco.

Por mais artificial que a sinopse possa parecer, a trama é desenvolvida com profundidade. Charly Braun, que assina o roteiro junto com Martha Nowill, se mostra mais preocupado em desenvolver os personagens e muito se deve pelas raízes teatrais de ambas atrizes e o diretor. Esteticamente, o longa pode ser feio e deselegante pela câmera não parar de mexer e pelo uso de zoom em certos momentos, mas é justificado por conta da presença do personagem interpretado por Esteban Feune de Colombi, que vai documentar todo o processo do curso. Isso torna sua câmera a objetiva do filme em vários momentos, deixando a obra com várias camadas de interpretação. Tudo acaba girando sobre o conceito de documentário e sobre um processo em que atrizes de verdade interpretam atrizes que tem o mesmo nome, etc.. E se torna um jogo muito interessante proposto pelo diretor.

Vermelho Russo é um filme nacional que supreende pela inventividade narrativa

Não que o longa não tenha alguns problemas. Há assuntos que não são muito bem explorados, como o triângulo amoroso que ocorre entre as amigas e o personagem de Michel Melamed, um diretor de teatro. Esse não vai a ponto algum, principalmente porque some no final e não é mais citado. Além disso, há momentos em que o longa de se perde e parece que as protagonistas são de menor importância para o filme, ainda que sejam poucos. O ritmo é bem agradável e o texto mistura angústia, frustração e bom humor muito bem, com a maioria dos diálogos soando orgânicos.

Todo o elenco mostra uma excelente química, mas o grande destaque vai para a dupla de protagonistas. São carismáticas, expressivas e com presenças muito fortes. Interessante como as duas exibem um estilo diferente de atuação, pois enquanto Maria Manoella se mostra do tipo mais introspectiva, que fala muito com o olhar e os gestos são mais calculados, Martha Nowill é mais explosiva e chama a atenção, falando mais alto com uma presença muito poderosa. Pode ser visto como um jogo de tipos diferentes de atuação, que funciona no conjunto. É bom notar que ambas mudam esse tipo dependendo da situação: Manu como a mais explosiva e Marta como a introspectiva. É como se fosse um duelo de métodos de Brecht e Stanilavski.

Vermelho Russo é um filme nacional que supreende pela inventividade narrativa

Rússia: Berço da Cultura

Outra coisa que Vermelho Russo homenageia bastante é a própria cultura do país retratado. Além do teatro, há passagens honrando o cinema e a literatura local. Muito da fotografia e da direção de arte vem de lá mesmo e percebe-se que não há uma manipulação da imagem e do cenário. É uma grande declaração de amor do diretor à Rússia. É interessante ver como ele se interessa mais pela cultura do local do que pela história política, que não é citada em momento algum. Realmente, não faz diferença.

O “olhar” do filme é o de um turista que reconhece a beleza do local. Nem tanto pelo discurso, mas pelo jeito como é filmado. Lembra um pouco os filmes de Woody Allen, onde o local é quase um personagem. Charly Braun não aproveita apenas por serem bonitos, mas pela sua força narrativa por trás. É um trabalho muito preciso.

Enfim, Vermelho Russo mostra ser um dos filmes mais interessantes do ano. Além de ser uma boa porta de entrada para mostrar a cultura russa, tem ótimas atuações e é muito mais do que aparenta ser. Por mais simples que possa parecer na superfície, quanto mais avança, mais revela camadas.

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