Alguns nomes carregam o peso da expectativa a cada novo trabalho por causa do merecido reconhecimento pelo talento mostrado em diferentes momentos do passado. O cineasta alemão Wim Wenders conseguiu respeito mundial com obras-primas como Paris, Texas (1984), Asas do Desejo (1987) e o memorável documentário Buena Vista Social Club (1999), que se destacaram não apenas pela acurada qualidade técnica e visual, mas também pela linguagem inovadora, alheia às imposições do cinema comercial. No entanto, como efeito colateral do sucesso, as decepções acompanham a carreira do diretor na mesma medida que a grandiosidade dos trabalhos mencionados funciona como parâmetro. Parceria entre Alemanha, Canadá, França, Suécia e Noruega, Tudo Vai Ficar Bem (Every Thing Will Be Fine), mais nova produção de Wenders, cai neste desafortunado grupo, infelizmente.
A sinopse anuncia um filme introspectivo, imersivo e reflexivo sobre o enfrentamento de alguns dos fantasmas pessoais mais devastadores e difíceis de lidar: culpa e remorso. Após uma noite de reclusão em uma cabana de pescadores no rigoroso inverno canadense, o escritor em ascensão, Tomas, atropela e mata uma criança enquanto dirige de volta para casa. O peso deste acontecimento afetará para sempre suas relações pessoais, seu trabalho e a forma como lida consigo mesmo.
A ótima premissa, no entanto, é desperdiçada em uma trama que não aprofunda o intimismo que a trama exige. Ao contrário, se distancia cada vez mais dos dramas internos dos personagens. Tal situação seria até tolerável em um enredo que estivesse recheado por acontecimentos relevantes e impactantes, camuflando para o espectador a importância da proposta reflexiva. Infelizmente, o que encontramos é um roteiro que não se desenvolve, resultando em um filme monótono e chato de se assistir.
Nas quase duas horas de projeção, o filme apresenta diversas passagens de tempo que se apresentam como forma de exibir como o trágico acontecimento afeta a via dos personagens. Tal recurso só piora o cenário ao reforçar o distanciamento entre público e protagonistas com as questões principais. Tudo é tratado frieza e até em tom blasé, postura inadmissível ao se tratar de uma morte infantil sem uma justificativa narrativa palpável. A situação é evidente até mesmo com personagens que poderiam ser o ponto de choque do filme, mas a conformada mãe do garoto morto e o abobado irmão sobrevivente são tristes decepções. As intervenções destas figuras na vida de Tomas até ameaçam, mas não avançam pra lugar nenhum e só causam frustração, isso quando não caem para o humor involuntário.
Com personagens surpreendentemente rasos e pouco trabalhados, o elenco pouco acrescenta em termos de qualidade dramática. James Franco (127 Horas) esbanja uma canastrice difícil de engolir, Rachel McAdams (Sherlock Holmes) entra e sai da trama sem nem percebermos e Charlotte Gainsbourg (Ninfomaníaca) não convence com uma interpretação robotizada e de expressões forçadas.
Os pontos altos do filme são a belíssima fotografia, um marco de Wim Wenders, que trabalha como ninguém as paisagens e os enquadramentos como ferramentas de narração (Tudo Vai Ficar Bem foi filmado em 3D, recurso que nada acrescenta ao resultado final e passará despercebido à maior parte do público das telas convencionais) e a envolvente trilha sonora que, esta sim, consegue transmitir um pouco da carga dramática que o roteiro desperdiça. Quem conseguir permanecer acordado até a subida dos créditos finais poderá até se confundir pela qualidade técnica destes recursos, mas dificilmente terá algo a comentar de relevante sobre a história.
O desfecho parece coroar essa ode à frustração com uma mensagem graficamente forçada, tentando guiar (ou manipular) as sensações do espectador para as intenções do diretor. Mas o que Wim Wenders vai mesmo conseguir é que seus fãs sintam saudade dos anjos do passado.