As Olimpíadas do Rio de Janeiro estão aproximando-se e os olhos da mídia mundial se voltam para cá. Infelizmente, o mesmo não se pode dizer das Paraolímpiadas, que tem início logo após o término da primeira. É fato que a competição voltada para paratletas não recebe a mesma atenção – essa, por parte de quem a deveria divulgar – que a voltada para atletas sem deficiências físicas. Eis que surge o documentário dirigido por Marcelo Mesquita, que pode tornar-se uma potente arma para a quebra de qualquer preconceito quanto aos jogos, mostrando que essas competições são tão emocionantes quanto as outras. Sim, a menção em relação à quebra de preconceitos serve apenas para os jogos, já que Paratodos funciona apenas em nível esportivo, nunca mostrando as dificuldades dos atletas fora do esporte para conseguirem praticar o mesmo. Sendo assim, a sensação é de uma linda propaganda.
Dividido em quatro segmentos, o documentário acompanha uma delegação de modalidade diferente em cada um. Atletismo, canoagem, futebol e natação foram os esportes escolhidos por Mesquita para o registro, sem deixar claro o porquê da escolha. A opção, porém, mostrou-se um acerto. Todos os atletas, ou membros de delegações, são extremamente carismáticos – com menção mais que especial para cowboy, da paracanoagem – , tornando praticamente impossível a falta de empatia com quem se vê na tela.
A direção de Mesquita funciona de forma muito coesa dentro do proposto. A maneira como o mesmo filma as competições, aliada ao uso de imagens de arquivo, faz com que o espectador sinta vontade de começar a torcer ali mesmo. O segmento do futebol de cinco, por exemplo, é de deixar o coração de qualquer um na mão devido ao altíssimo nível de tensão construído. A cada gol da equipe brasileira, é impossível não sentir-se obrigado a segurar o grito dentro da sala, tudo isso porque sabemos o que aqueles atletas – e a palavra atletas precisa ser exaltada, já que conhecemos apenas o esportista, e nada além disso – passaram durante aquele período.
É claro que a opção do diretor, e do roteirista Peppe Siffredi, de mostrar a superação apenas dentro do esporte é válida. O grande problema aqui é o potencial que acaba desperdiçado, já que ao longo de todo filme parece muito fácil ser paraatleta no Brasil. Aliás, uma denuncia até vem à tona quando a canoagem é o foco, mas ela só serve aparentemente para justificar a queda de rendimento de um dos atletas. A falta de apoio financeiro por parte de entidades privadas e do próprio governo é obvia e seríssima, portanto, é injustificável que um filme importante, que será veículado em grande circuito, abra mão de colocar o dedo nessa ferida.
Tecnicamente, o filme é êxito atrás de êxito. Com uma fotografia belíssima, focos de luz são colocados em cima dos atletas criando uma especie de “aura”, tornando-os praticamente intocáveis dentro de sua prática. A paleta possui tons mais escuros em momentos de dificuldade – mais uma vez, dentro das competições – ressaltando a superação dos mesmos. Isso sem falar das tomadas espetaculares feitas com drones, que dão um tom grandiloquente à obra. Uma montagem à base de cortes ágeis durante as competições, menos rápidos durante momentos de maior sobriedade, consegue dar o ritmo necessário para não tornar a experiência cansativa. A música também funciona de maneira cirúrgica, fundamental para a criação daquela alta tensão já citada.
Paratodos provavelmente comoverá muitas pessoas, já que em termos de manipulação, sua capacidade é enorme devido à sua excelência técnica. A omissão que o filme comete, com toda certeza não anula seus méritos e nem compromete os sentimentos do espectador. Apenas fica escancarada a fundamental importância de mostrar que o paratleta, principalmente no Brasil, tem pelo menos três superações: dentro da modalidade, no dia-a-dia, e -principalmente – para ter acesso ao esporte e poder pratica-lo em alto rendimento, já que multicampeões como Daniel Dias e Fernando Fernandes, não se fazem sozinhos.