Maze Runner: A Cura Mortal resultante de Múltiplas Variáveis
Uma fórmula de ação pela qual seu componente de afeto pela memória, e não necessariamente a nostalgia, permaneceu como o principal elemento de empatia. Levando-nos a uma catarse multifacetada pela sua estética, Maze Runner: A Cura Mortal (Maze Runner: The Death Cure), de Wes Ball, conclui sua franquia inserindo mais camadas dramáticas em seus personagens e reexplorando suas possibilidades temáticas, respeitando seu próprio repertório através de diferentes conceitos visuais dos “já sentidos” pelo público alvo.
A trilogia (confira as críticas do primeiro e do segundo filmes) é uma trajetória que desde o seu início nos mostra as melhores possibilidades das narrativas multigênero, isso a partir de uma temática abrangente – que possibilita, conceitualmente, esse trabalho visual pela direção de arte. Dessa forma, dentro de uma atmosfera audiovisual pós-apocalíptica, a partir de sua própria motivação dramática essencial à história, a direção artística trabalha múltiplos subgêneros de ação durante a trilogia, expandindo sua temática a partir de alguns indícios peculiares do gênero central.
Neste, em específico, temos a a forte exploração visual a partir de três subgêneros: pós-apocalíptico, espionagem e guerra. O primeiro fica pelas referências breves à forma “espetacularizada” da série fílmica Mad Max (1979-2015), de George Miller – com direito a perseguições com carros rústicos em meio a um vasto deserto com alto contraste em sua fotografia. O seguinte já nos traz um dos principais aspectos do segundo ato, substituindo a forma road movie pelo clima intenso dos filmes de espião, a partir do momento em que temos o grupo de heróis reagrupados nas proximidades da cidade-sede da WCKD (CRUEL).
E o último pela forma como a construção narrativa vai caminhando ao confronto político (detalhe interessante) da sociedade elitizada contra a comunidade abandonada por ela – na passagem do segundo ao terceiro ato fílmico –, com fortes indícios na temática de uma guerra civil anárquica, através do conflito social existente entre os grupos – algo também originado pela WCKD, o que mostra que há um complemento entre forma e conteúdo durante a história.
Vale lembrarmos que, durante essas construções audiovisuais, alguns ecos de outros subgêneros já mostrados pela trilogia retornam de maneira não gratuita. Recorrendo à nostalgia como complemento narrativo – recorrente no atual cinema hollywoodiano –, tal valor de lembrança conecta-se com as obras prévias, primeiro, por parte da estética survivor horror (evocando games como The Last of Us). Mas também com breves instantes, quase que pela forma surrealista cinematográfica, que brincam com as motivações visuais já vistas pelo público alvo, isso pela ideia do inconsciente e do essencial instinto de sobrevivência presente na trajetória fílmica.
No entanto, mesmo com essa avalanche de conceitos visuais, tudo se complementa através do roteiro, o que me faz pensar que não seja realmente possível dizer que Maze Runner 3 seja um filme fora de tom. Dentro de uma narrativa dinâmica e dramaticamente numa intensidade crescente, a obra perpassa variados subgêneros de ação de maneira orgânica e inteligente, com a direção de arte sabendo bem aproveitar o melhor de cada estilo, tendo em vista seu próprio repertório dramático.
Velhos compostos e novos aditivos ao experimento
A obra, mostrando-se coerente com as motivações dramáticas desde o primeiro longa, deixa nítido o fator memória pelo ponto de vista de Thomas (Dylan O’Brien, de O Assassino: Primeiro Alvo), o qual mostra-se ciente em tela tanto pela busca por proteção de seus amigos, quanto pela forma como o personagem não nos deixa esquecer o peso da perda de antigos companheiros, sempre relembrando suas histórias pessoais.
Manter viva a memória dos mortos durante sua trajetória particular mostra uma ótima motivação fílmica, causando empatia no espectador e permitindo-o observar a trilogia como um conjunto, de fato uma história subdividida em três capítulos. Mas permanecer na lembrança não é o único ponto interessante na conclusão fílmica. Um dos principais crescimentos ao final da trilogia aparece através de certo amadurecimento narrativo, mesmo que não totalmente.
Sua história está centrada no grupo de heróis refugiados, no entanto os anti-heróis e/ou vilões ganham mais camadas no drama proposto nesse filme. Indo além da visibilidade de Teresa (Kaya Scodelario, do último Piratas do Caribe) – da qual já tínhamos suas motivações esclarecidas no capítulo anterior –, em conjunto com as suas decisões vemos espelhadas as atitudes da Dra. Ava Page (Patricia Clarkson), e a busca pela cura do vírus confronta-se com o claro sofrimento e auto questionamento das duas durante a tarefa.
Por outro lado, aí sim assumindo de maneira indissociável, temos Janson (Aidan Gillen) tomando a frente como principal vilão na trajetória da série Maze Runner, e ainda que compreendamos melhor suas intenções e porquês, enxerga-se aqui um maniqueísmo maior no personagem, perdendo um tanto do seu aspecto manipulador, o que de certa forma torna-o mais fraco, mesmo que essa “pista” já houvesse no final do segundo filme.
E como pano de fundo à conclusão da trilogia, as motivações políticas traduzidas no filme são sua melhor ligação com a realidade fora da tela, pois, ao mesmo tempo em que ajudam a concretizar a história, também recolocam o espectador diante de questões de forte vivacidade sobre riqueza e pobreza. Assim, permite fazê-lo repensar nas consequências e causas de diversos confrontos sociais, dando maior aprofundamento e coerência com a época atual na qual encontra-se a história.
No geral, mesmo que sob inúmeras formas temáticas, e num filme com variados efeitos “espetacularizadores” à narrativa, o principal aspecto intrapessoal abordado é o valor da amizade e os limites que a mesma pode criar ou ultrapassar a partir de acontecimentos movidos pelas escolhas de cada um. E é exatamente isso o que valoriza toda a experiência emotiva proposta pelo produto, sendo esse um texto nas entrelinhas que permite um relacionamento particular a partir da visão pessoal de cada espectador.
O que, no conjunto da obra, mostra-nos que Maze Runner: A Cura Mortal conclui muito bem sua própria trajetória, dando um encerramento ou uma menção honrosa a cada um dos personagens componentes de sua experiência fílmica.