Giovanna Casotto à vontade
Essa discussão já deu as caras por aqui, mais precisamente na resenha de Garras de Anjo, dos grandes Jodorowsky e Moebius. Naquela ocasião, foi dito que referir-se a determinadas obras como “eróticas”, muitas vezes, só serve como um eufemismo, tranquilizando uma parcela receosa do público/crítica. A verdade é que se existe um limite claro entre o erótico e o abertamente pornográfico, a artista italiana Giovanna Casotto prefere não deixar dúvidas sobre qual lado está e, aliás, bem distante desta fronteira. Nascida em 1962, Giovanna traz um olhar feminino a uma espécie de quadrinho onde os primeiros nomes lembrados são de homens, como Manara, Serpieri e Crepax.
(Sobre o quadrinho erótico nacional, não deixe de ler também a resenha de Afrodite)
Compre clicando na imagem abaixo!
Em tempos de discussões sobre damas “belas, recatadas e do lar”, o lançamento de Giovanníssima pela Veneta ganha mais relevância. Não que essa coletânea já não tenha seu valor independente do contexto, mas estamos falando de HQ’s com um viés libertário muito forte, utilizando-se da figura feminina livre de qualquer preconceito e perseguindo a realização de suas fantasias sexuais. De forma absolutamente explícita, é bom salientar, algo que pode incomodar algumas pessoas, ou gerar argumentos negativos sobre exploração sexual, despersonalização da mulher e mil outros pontos, razoáveis ou não. Por outro lado, não há como negar o poder feminino representado nos ambientes altamente sexualizados – e tão idealizados quanto – que a autora criou, invertendo papéis tradicionais.
Em pequenas histórias que vão do mais corriqueiro, como uma dona de casa entediada, ao mais cinematográfico, a matadora de aluguel disposta a jogos de lesbianismo, o lúdico predomina sem o menor compromisso com tramas mais elaboradas. Parece evidente o que ela procura nestas narrativas curtas, atingindo um grau de sofisticação gráfica invejável com uma proposta visual realista. Não apenas em figuras isoladas, que lembram um pouco o trabalho do ilustrador Hajime Sorayama (Vibrant Vixens), mas em termos narrativos gerais, algo potencializado na escolha das cores entre personagens em preto e branco. Não há como negar o quão apelativo esse trabalho é, mas – se ainda for preciso explicar – é o seu refinamento estético que o separa do rasteiro.
É sexo e pronto!
Justiça feita às qualidades indiscutíveis, analisar os pequenos contos pelo lado conceitual pode dar munição aos potenciais detratores de Giovanna, que argumentariam sobre a falta de conteúdo. Claro, não existe nada além de eventos simples que desembocam em uma cena de sexo espetacular, mas ela assume isso sem o menor problema, o que relativiza um pouco a discussão e deixa a avaliação final mais subjetiva. No entanto, a coisa fica mais interessante quando se descobre o quanto a autora se entrega nestas histórias – literalmente, pois ela é sua própria modelo.
Em capa dura e papel couchê de boa gramatura no miolo, a edição de Giovanníssima acompanha o esmero da arte de Giovanna Casotto, contando também com uma galeria de pin ups nas páginas finais. O belo álbum pode incomodar muita gente sensível ao conceito de pornografia, pessoas que devem evitá-la mesmo, e folhear em público pode provocar ruborizações, mas por mais simples e diretas que sejam as intenções dela como artista, falando em termos de conteúdo, tudo isso parece muito espontâneo.
Gostem ou não, ela sabe onde quer chegar…