Uma das fotos mais famosas dos EUA é o registro de um encontro bastante improvável. Na verdade, não tanto pela reunião das duas personalidades, mas pelos motivos que levaram um a procurar o outro, além do que se desenrolou até que o objetivo fosse atingido. Caso você não tenha familiaridade alguma com o caso, por mais bizarro que pareça, a premissa de Elvis & Nixon (idem) se baseia em fatos. O ídolo visitou a Casa Branca em 21 de dezembro de 1970 e conversou com o então presidente, Richard Nixon, solicitando uma insígnia de agente federal do Bureau de narcóticos e drogas perigosas.
Dependente químico já naquela época, porém vivendo em negação por ter um médico particular que fazia as prescrições, além de um empresário que o mantinha fora da vida real e um séquito de puxa sacos sanguessugas, grupo conhecido como a “Máfia de Memphis”, o grau de distanciamento da realidade de Elvis Presley já atingia um nível inimaginável naquele momento e seguiu piorando até sua morte. É uma história de decadência física e psicológica, mesmo neste recorte específico da vida do Rei, mas existe o lado cômico e leve das excentricidades de alguém nestas condições, que o filme explora muito bem sem se perder.
Além da busca pelo encontro com Nixon, que já havia virado um filme para a TV em 1997 (o falso documentário Elvis Meets Nixon), a trama também tem apoio no dilema de um ex-integrante da Máfia de Memphis, Jerry Schilling, tentando se estabelecer em Los Angeles, longe das loucuras e das exigências do amigo acostumado a resolver tudo com dinheiro. Recrutado às pressas depois de uma confusão no aeroporto, graças às armas de fogo que Elvis insistia em carregar, ele não consegue negar o pedido para acompanhá-lo até Washington, mesmo com um compromisso em cima da hora de conhecer os pais de sua noiva em um jantar.
Estabelecida a dinâmica entre Elvis e Jerry, mais um amigo das antigas é chamado. O irresponsável Sonny se sente bem mais à vontade do que o outro, bancando o funcionário oportunista. Enquanto isso, os assessores da Casa Branca descobrem as intenções do cantor na cidade, encontrando aí uma oportunidade de aumentar a popularidade do presidente. O problema é que ele ainda precisa ser convencido, de uma forma ou de outra.
Dirigido pela pouco conhecida Liza Johnson, Elvis & Nixon tem entre seus roteiristas o ator Cary Elwes, estreando no ofício junto com Joey Sagal, que já interpretou Elvis em um episódio da série Nightmares & Dreamscapes. Completa o trio Hanala Sagal, ex-esposa de Joey, a única com alguma experiência em roteiros. Falando francamente, não é uma equipe que anime algum cinéfilo mais informado, mas eles surpreenderam na leveza com que a narrativa se movimenta. O texto não teria como se manter em cima da expectativa do sucesso da missão auto-investida de Elvis, afinal muita gente já sabe como isso termina, então a sacada foi investir no vai-e-vem que antecede o encontro, o que mantém o filme movimentado e interessante, além do olhar divertido sobre as excentricidades do seu protagonista. Ponto para a diretora.
O elenco ajuda bastante. Michael Shannon, o General Zod em O Homem de Aço, tem uma face que parece talhada em madeira, além de um olhar que denota desequilíbrio. Não seria uma escolha provável para Elvis, mas aqui a produção acerta mais uma vez. Em primeiro lugar, felizmente, o personagem não aparece cantando, pois isso poderia muito bem comprometer o conjunto. Convenhamos que o Rei é uma figura muito característica e difícil de encarnar, mas Shannon faz um bom trabalho na expressão corporal e, principalmente, no sotaque sulista. Já que a ideia é focar no lado engraçado de alguém que não percebe os inconvenientes que causa, é muito fácil comprar essa história e a encarnação do personagem. Ainda que estejamos falando de algo que é, essencialmente, uma comédia, a diretora ainda tem a sensibilidade de dosar uma ou outra pincelada dramática nesta composição do protagonista.
Kevin Spacey faz seu Nixon com a competência de sempre, carregando na caricatura republicana. Mesmo maquiado a caráter, um rosto tão familiar quanto o dele, inclusive já associado ao mundo da política na ficção, graças a House of Cards, poderia ser complicado para interpretar alguém da vida real. A verdade é que ele está tão à vontade no papel que esquecemos mesmo do ator e nos entregamos à construção bem humorada e aos diálogos bem sacados.
No elenco de apoio, Jerry Schilling é vivido por Alex Pettyfer, de Magic Mike, e Sonny West por Johnny Knoxville, conhecido como criador do Jackass. O primeiro convence como o cara bem intencionado que só quer ajudar o amigo, independente dos benefícios envolvidos, enquanto a expressão cômica do outro serve muito bem à personalidade de seu personagem. Na verdade, o filme também acerta ao apresentar esses dois sem precisar explicar muito, deixando o relacionamento entre os três bastante claro de uma forma orgânica. No núcleo da Casa Branca, Evan Peters, o Mercúrio dos X-Men, e Colin Hanks, da série de TV Fargo, interpretam os funcionários Dwight Chapin e Bud Krogh, atrapalhados nas manobras para viabilizar e conduzir o encontro, provocando mais risadas sem exagero.
Com menos de uma hora e meia e passando rápido, Elvis & Nixon brinca com um fato conhecido e se sai bem. Não tenta reinventar a roda na linguagem e mantém uma pegada moderada que agrada na cadência. Claro que se permite a liberdades, pois a conversa entre os dois protagonistas é algo que pouquíssimas pessoas tiveram acesso direto, no entanto, mesmo que alguém ache o comportamento de Elvis exagerado, o filme não foge muito de relatos que encontramos facilmente em biografias, apenas aborda essas atitudes por outro viés. No fim das contas, mesmo quem não é fã do Rei consegue se divertir com essa história que parece completamente inventada.