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Lumière! A Aventura Começa – Autores no Cinema de Atrações!

Sob um olhar crítico e acadêmico… Lumière! A Aventura Começa

A invenção do cinema está associada a Thomas Edison (em 1893), com sua patente do quinetoscópio exibindo as primeiras obras do empresário, mas é reconhecido que a partir do cinematógrafo de Auguste e Louis Lumière (em 1895), a arte inicia sua primeira proliferação pelo mundo, caracterizada pelo seu marketing e produção contínua. Reobservando parte do primeiro cinema, no período intitulado como Cinema de Atrações (1894-1907), Lumière! A Aventura Começa (Lumière! L’Aventure Commence), de Thierry Frémaux, propõe análises técnicas dentro de uma trajetória histórica com 114 filmes dos irmãos Lumière (entre 1895-1905). Uma abordagem crítica das primeiras produções francesas, em películas de 35mm na velocidade de 16 frames por segundo.

Dcocumentário Lumiere

Lumière! A Aventura Começa

É conhecido que os Lumière não foram os primeiros a projetarem filmes de forma pública e paga – fato reconhecido aos irmãos Max e Emil Skladanowsky –, e que tampouco seu dispositivo foi o último a ser inventado à função específica, mas Frémaux não deixa de enaltecer o peculiar sucesso dos franceses a partir do cinematógrafo. Observando desde as obras em si até as características reconhecíveis nos processos das produções fílmicas, o narrador instiga-nos a olhar atentamente seus objetos de estudo (filmes), colocando o documentário, de maneira leve e instrutiva, como um artigo científico sobre cinema, pelo qual o pesquisador nos direciona à sua visão particular.

Em dez partes, o documentário trata da contínua transição técnica e local dos Lumière, abordando a diversificada construção artística na obra dos autores. Destacando-se os comentários de Frémaux, temos seu desenvolvimento crítico sobre o cinema lumièrista analisando: as composições nos planos únicos, a fotografia, a reprodução fílmica (remakes), as “atuações” aos personagens (por pessoas aleatórias ou pela própria família Lumière), e as técnicas de pós-produção realizadas pelos autores. Entre as 114 obras, o diretor destaca: o uso da profundidade de campo, a composição de moldura dentro do plano, o uso da iluminação natural, a técnica de colorização de frames e a ideia de mise-en-scène que existia na época – elementos que possibilitam maior interesse dos espectadores a partir do resgate artístico do autor.

Como complemento, há inserção de reflexões acadêmicas na obra – algo que nos aproxima do fato do documentarista também ser diretor do tradicional Festival de Cannes –, mostrando também a importância dessa área nas discussões e análises da trajetória histórica do cinema pelo mundo. Entre elas, temos análises que envolvem: conceitos de funções estéticas pictóricas utilizadas como linguagem em alguns filmes, adaptação midiática através de narrativas que remetem a obras literárias, ou mesmo alguns dos primeiros indícios de correntes cinematográficas (documental ou ficcional), de gêneros (como film noir, comédia e suspense) e de temáticas (política e registros socioculturais).

Entretanto, ainda que elaborada nessa amplitude de fatos e observações críticas, seu formato tradicional se contrapõe, de certa forma, ao texto empregado pelo diretor, enaltecendo outros pontos que nos permitem analisar, de forma pontual, o documentário.

Dcocumentário Lumiere

Texto Presentificado sob Moldes Tradicionais

Lumière! A Aventura Começa possui o formato 3×4 – razão de aspecto 1:33, seguindo as películas originais reprojetadas –, trabalhado numa montagem linear clássica – utilizando apenas obras fílmicas na composição – e com adição da narração cronológica em off. No entanto, o obra de Frémaux remete-se também a aspectos contemporâneos hollywoodianos através de seu texto, o que cria um contraste e deixa sua elaboração técnica mais interessante.

No texto narrativo pelo qual o documentário nos conta a trajetória dos Lumière, é curioso como o autor compreende o momento histórico no qual encontra-se sua obra. É trabalhada, em diversos momentos, a ideia de referência durante a reprojeção das obras lumièristas, tanto aos filmes dos cineastas quanto a partir das mesmas projeções – algo que é copiosamente presente no atual momento cinematográfico.

Conforme brevemente mencionado acima, há conceitos e menções à pintura e à literatura pela visão crítica de Frémaux. Entre essas formas midiáticas, são reconhecidas obras de autores como William Turner (pintor do romantismo) e Júlio Verne (escritor de fantasia e ficção científica) –, devido à utilização de possíveis referências narrativas e/ou estéticas dos mesmos às composições de plano único dos Lumière.

Mas também são observados alguns dos próprios filmes lumièristas como base para diretores e obras do cinema posterior, dos quais são citados: Yasujiro Ozu (pela exploração do tempo na atuação fílmica), Akira Kurosawa (pela temática de samurais numa das obras), Sergei Eisenstein (sobre o uso de um close-up similar ao que seria feito em O Encouraçado Potemkin, de 1925), James Cameron (sobre um grande plano geral que segue o mesmo esquema visual do utilizado em Titanic, de 1997), entre outros exemplos.

Torna-se característico pensar que isso atualiza os fatos históricos ao atual cinema hollywoodiano, permitindo um link de acesso ao espectador, de forma que o aproxime das obras datadas na transição dos séculos XIX e XX, evitando o excesso de estranhamento com o passar das reprojeções. Se os exemplos citados não são suficientes à afirmação, podemos notar o uso de uma última cena inserida depois do letreiro final, ou seja, uma cena pós-crédito.

Dcocumentário Lumiere

Esta cena relaciona-se com os primeiros fotogramas vistos no próprio documentário – em termos de plano, iluminação e motivação documental e narrativa –, isso sem contar com a presença de um diretor, enquanto personagem de cena, que é conhecido também por fazer homenagens à Sétima Arte como um todo. Isso mostra não apenas a intenção de aproximar, pontualmente, o documentário do atual público, mas também de integrar elementos de hoje em sua estrutura narrativa, embora o tema central seja o primeiro cinema. Ou, simplesmente, vemos a intenção do diretor em mostrar-nos que o “novo” de hoje não é tão contemporâneo à nossa época quanto se pensa.

No geral, ainda que seu formato documental seja um tanto cansativo numa extensão de 1h30min. de duração, Lumière! A Aventura Começa é uma obra ideal, e necessária, a qualquer estudante ou amante da sétima arte, devido ao seu conteúdo educativo e didático ao público alvo. E nesse aspecto, mesmo instituindo Auguste e Louis como os principais primeiros autores da arte, o filme nos dá a ótima oportunidade de conhecer peculiarmente a importante obra lumièrista, o que pode ser complementada pelo estudo de outros diversos diretores desse período de atrações no início do cinema.

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