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Despedida Em Grande Estilo – Uma velhice indigna!

 Despedida Em Grande Estilo depende muito dos atores para funcionar

Em 1979, um ainda jovem Martin Brest (que viria a realizar Um Tira da Pesada, Fuga À Meia Noite e Perfume de Mulher nos anos seguintes), em seu segundo longa metragem, dirigia dois comediantes famosos da televisão norte americana (George Burns e Art Carney) e um mestre da atuação (Lee Strasberg) em uma história que abordava de maneira cômica e respeitosa a velhice desses grandes nomes. Nos dias de hoje, se aproveitando de uma onda recente de filmes parecidos (Última Viagem a Vegas e Amigos Inseparáveis), chega aos cinemas um remake da obra em questão, com o mesmo nome, Despedida Em Grande Estilo (Going In Style) e os astros Michael Caine, Morgan Freeman e Alan Arkin nos papéis principais.

Despedida em Grande Estilo depende demais de seu trio de protagonistas.

Despedida em Grande Estilo depende demais de seu trio de protagonistas.

Adaptando a história para o atual momento socioeconômico dos Estados Unidos, o roteiro de Theodore Melfi (que é um dos roteiristas de Estrelas Além Do Tempo) conta uma história relativamente similar: depois de décadas trabalhando para uma empresa de aço, os amigos Joe (Michael Caine, de Interestelar), Willie (Morgan Freeman, que esteve no recente Ben-Hur) e Albert (Alan Arkin) descobrem que ela sairá do país e, em decorrência disso, deixarão de receber as suas pensões de aposentadoria. Enfrentando o perigo de serem despejados e cansados da baixa renda com que vivem, eles decidem roubar de um banco tudo o que este e a empresa para qual trabalhavam lhes devem.

Diferentemente da primeira versão, que contava com um ótimo roteiro de Martin Brest, o atual Despedida Em Grande Estilo é um filme que depende completamente do seu trio de atores principais para funcionar. Se eles não estivessem presentes, nada no filme poderia ser salvo. O talento monumental de cada um deles e a peculiaridade dos seus estilos – Caine é o impaciente, Freeman é o mais relaxado e Arkin, o irritadiço – carregam a narrativa nas costas, dando intensidade aos momentos dramáticos artificialmente criados pelo roteiro e valorizando as piadas pouco inspiradas com timing cômico.

Partindo de uma contextualização genericamente abordada e completamente equivocada (aqueles que puderam acompanhar de perto a crise econômica de 2008 e se aprofundar na questão sabem que o governo federal foi tão culpado quanto os bancos pela bolha imobiliária que assolou os Estados Unidos – aliás, essa mesma ignorância acerca do assunto está presente no recente A Qualquer Custo), o roteiro de Melfi tenta, a todo momento e de uma maneira covarde, usar a situação econômica do país para justificar moralmente o roubo planejado pelos personagens. Aos olhos do roteirista, aparentemente, basta que haja uma crise no sistema financeiro para que as pessoas saiam por aí e tomem para si “o pedaço da torta que lhes pertence” (uma frase empregada no filme).

Além disso, para completar essa falsa moralidade, Melfi cria uma situação no terceiro ato em que o espectador se vê na incômoda posição de ter que torcer para uma garotinha mentir. Confesso que ver Caine, Freeman e Arkin embarcando na cena sem se incomodar com o seu caráter deplorável produziu em mim uma profunda tristeza. E, como se não bastasse, além de dar às costas para a nossa opinião, o roteirista também nos toma por ignorantes, uma vez que nos acha burros a ponto de acreditar que uma jovem de cinco anos de idade teria a capacidade de compreender todas as implicações da situação em que se encontrava.

Despedida em Grande Estilo depende demais de seu trio de protagonistas.

Já do ponto de vista técnico, ele exibe a mesma falta de talento na hora de construir momentos dramáticos que vimos em Estrelas Além do Tempo. Usando um dos recursos mais apelativos que existe, Melfi cria uma doença que, além de não ter a menor necessidade de existir (a relação entre os amigos era suficiente para dar dramaticidade ao filme), tem um final que é previsível desde o momento em que descobrimos a enfermidade de Willie. Essa mesma falta de talento se repete na subtrama envolvendo o pai da neta de Joe, cujo arco é  mal desenvolvido (não sabemos como tudo terminou) e praticamente atirado para dentro da trama (não há tempo suficiente para que nos importemos com eles), e na fatídica cena do roubo ao banco, que é inteiramente anticlimática.

No que diz respeito aos momentos mais cômicos, o roteiro também mostra não ter a menor noção de como usar alguns elementos para fazer o público rir. Um exemplo perfeito dessa falta de destreza na comédia é a cena do carrinho de supermercado motorizado: demasiadamente longo e completamente inverossímil, o momento falha miseravelmente (no seriado Seinfeld, há uma cena parecida que, ao contrário da do filme, funciona brilhantemente). Já os outros instantes são tão pobres quanto o mencionado acima: é difícil enxergar qual é a graça que o roteirista viu no fato de que os personagens veem The Bachelor, ou nos inúmeros momentos em que somos obrigados a rir das dificuldades físicas que eles enfrentam.

A direção desastrosa de Zach Braff

Por sua vez, a direção de Zach Braff (que é conhecido pelo grande público como o protagonista de Scrubs) é um desastre completo. Seja nas cenas cômicas, seja nas mais intensas ou dramáticas, ele mostra mais uma vez não saber o que fazer com uma câmera (Hora de Voltar é seu único esforço como diretor que é bem-sucedido). Vejam, por exemplo, a cena inicial em que vemos três sujeitos roubando um banco.

Despedida em Grande Estilo depende demais de seu trio de protagonistas.

Para dar mais tensão ao momento, ele decupa a cena desleixadamente: há de tudo, desde a reação das pessoas até closes de uma mão segurando um cheque (qual é o propósito disso?), passando por imagens de uma câmera de segurança (e que acaba se revelando inútil, já que os assaltantes saem livremente). Além disso, há um uso excessivo de tela dividida. Se na primeira vez em que é usado, o recurso se mostra correto (na cena em que os personagens estão conversando deitados na cama), nas outras vezes, vira um mero fetiche visual (não há motivo para ele ser empregado no instante que se passa na delegacia).

Moralmente repreensível e tecnicamente problemático, Despedida Em Grande Estilo também tem aquela arrogância do filme que se acha mais divertido do que de fato é. Para uma obra que funciona única e exclusivamente em razão do seu trio de protagonistas, esse tipo de prepotência é imperdoável. E para os fãs de Caine, Freeman e Arkin, fica o lamento de vê-los desperdiçar o talento em obras tão sem personalidade como esta. Já na terceira idade, eles mereciam muito mais.

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